Administração deve comprovar fiscalização das obrigações trabalhistas das empresas terceirizadas, opina PGR

Segundo Aras, para prevenir fraudes trabalhistas e corrupção, o órgão público é obrigado a acompanhar atuação da empresa terceirizada

O procurador-geral da República, Augusto Aras, opinou pelo desprovimento de recurso extraordinário apresentado contra acórdão do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que manteve a responsabilidade subsidiária da Administração Pública paulista por débitos trabalhistas de empresa terceirizada. De acordo com o parecer do PGR, enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quinta-feira (20), a empresa pública responsabilizada não demonstrou que fiscalizava adequadamente o cumprimento de obrigações trabalhistas por parte de empresa contratada, o que acarretou a responsabilização subsidiária do ente público pelos direitos não pagos a trabalhadores. A questão em análise no RE 1.298.647/SP teve repercussão geral reconhecida pela Suprema Corte (Tema 1.118).

De acordo com o PGR, a nova Lei de Licitações (14.133/21) prevê expressamente que, nas contratações de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, a Administração Pública responderá solidariamente pelos encargos previdenciários, e subsidiariamente, pelos encargos trabalhistas, desde que comprovada falha na fiscalização do cumprimento das obrigações do contratado. Além disso, aponta que a gestão dos riscos decorrentes da opção pela terceirização – que inclui a ocorrência de fraude e corrupção – deve ser considerada, prevista e evitada pela Administração em suas atividades, com mecanismos capazes de identificar, analisar e tratar incidentes com potenciais lesivos ao Poder Público, impedindo ou minimizando seus impactos.

Augusto Aras acrescenta que é do Poder Público, enquanto tomador dos serviços, o ônus de comprovar a efetiva fiscalização do cumprimento das obrigações decorrentes dos contratos de trabalho firmados entre a empresa prestadora dos serviços e seus empregados, com base na aplicação do princípio da aptidão da prova e na obrigação da Administração Pública de fiscalizar a execução do contrato. “A atribuição do ônus da prova ao trabalhador demandante, quanto à omissão eletiva ou fiscalizatória estatal, imputando-lhe prova de alta dificuldade ou mesmo impossível, vai de encontro aos deveres de cooperação e ao princípio da igualdade, retirando a eficácia prática da obrigação de monitoramento inerente à opção pela terceirização do serviço”, afirma o PGR.

Diante do exposto, o PGR manifesta-se pelo desprovimento do recurso extraordinário e pela fixação das seguintes teses: “Na caracterização da responsabilidade subsidiária da Administração Pública pelos encargos trabalhistas de empresa terceirizada:
I – É ônus do trabalhador que alega o descumprimento de obrigações trabalhistas pela terceirizada demonstrar o vínculo com a empresa contratada pela Administração Pública.
II – É ônus do ente público demonstrar que cumpriu os deveres de boa escolha e fiscalização contratual adequada, periódica, documentada e publicizada, voltados a impedir o inadimplemento trabalhista da empresa contratada, englobando, no mínimo: a existência de regulamentação prevendo o modo e a frequência da fiscalização por seus agentes do cumprimento das obrigações trabalhistas; a efetiva realização das fiscalizações em relação à empresa”.

Suspensão dos processos – Em fevereiro deste ano, o PGR já havia se manifestado no RE 1.298.647/SP contra pedido de entes federados de paralisação nacional de todos os processos que tratam da possível responsabilidade subsidiária da Administração Pública nos casos em que as empresas terceirizadas prestadoras de serviço deixaram de recolher encargos trabalhistas devidos aos funcionários. A petição foi formulada pelos estados, que manifestaram interesse em ser admitidos como parte no recurso. À época, o PGR concordou com a inclusão dos entes federativos, mas defendeu que os processos não fossem paralisados em todo o país de forma automática, para não penalizar os trabalhadores. O documento enviado ao STF também foi assinado pelo procurador-geral do Trabalho, Alberto Balazeiro.

O PGR avaliou que a suspensão seria medida temerária, considerando a natureza do bem jurídico tutelado nas ações trabalhistas e a vulnerabilidade dos titulares do direito (no caso, os trabalhadores), além do risco de grave tumulto à atuação da Justiça do Trabalho. “A Justiça trabalhista há de ser necessariamente célere, de modo a proteger a vulnerabilidade dos destinatários da prestação jurisdicional (trabalhadores, sobretudo), de forma a favorecer a busca pelo Judiciário e a rápida solução da demanda. A suspensão dos processos revela-se excessivamente gravosa aos trabalhadores e prejudicial à administração da Justiça e à entrega da prestação jurisdicional”, defendeu o PGR naquela ocasião.

Acúmulo de demandas – Segundo levantamento realizado pelo TST, em 2020 foram instaurados naquela Corte 33.910 novos processos com temáticas relativas à responsabilização subsidiária de entes públicos em contratos de terceirização, que se somaram aos 40.690 casos já em tramitação. Quadro similar se repete nos Tribunais Regionais do Trabalho. Para o PGR, a suspensão nacional dos feitos poderia acarretar acúmulo e paralisação de milhares de demandas, violando o direito dos trabalhadores à duração razoável do processo. “Tais demandas podem, sem prejuízo reverso, prosseguir até a definição adequada dos parâmetros e condutas mínimas de fiscalização para fins de avaliação do ônus da prova”, afirmou.

Íntegra da manifestação no RE 1.298.647/SP

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