A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve decisão que considerou inválido auto de infração lavrado pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em desfavor de uma usina de açúcar pelo descumprimento da lei que determina a contratação de pessoas com deficiência. A decisão leva em conta que a usina assinou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho visando ao preenchimento das vagas.
A Usina Cansanção de Sinimbu S/A foi autuada por descumprir o artigo 93 da Lei 8.213/91, que determina às empresas com 100 ou mais empregados a reserva de parte dos postos de trabalho para pessoas com deficiência ou reabilitadas. Em ação anulatória, afirmou ter firmado o TAC e disse que a cota não teria sido preenchida porque não houve procura suficiente, mesmo após o envio de ofícios para associações de deficientes e publicações e divulgações em jornais e rádios.
O MPT, por sua vez, informou que o termo de conduta abrangia várias outras usinas e a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Alagoas e tinha como propósito flexibilizar a base de cálculo prevista na Lei 8.231/91 para as empresas do setor sucroalcooleiro do estado, diante das dificuldades existentes para o cumprimento da cota. Pelo acordo, o cálculo deveria em conta as vagas das atividades industriais e a média das entressafras.
O Tribunal Regional do Trabalho da 19ª Região (AL) decidiu pela impossibilidade de aplicação da multa por observância ao princípio da segurança jurídica. No seu entendimento, a usina, ao firmar o TAC justamente com órgão que tem como atribuição a proteção do interesse público, coletivo e social e da ordem jurídica, “passa a ter a legítima presunção de que está cumprindo com seu dever legal, não podendo, posteriormente, ser penalizada”, ou seja, ser autuada pela mesma conduta.
A União tentou trazer a discussão ao TST sustentando, em agravo de instrumento, que a celebração de TAC não impede a atuação do Ministério do Trabalho na fiscalização e cumprimento da lei.
O relator do agravo, ministro Cláudio Brandão, assinalou em seu voto que as empresas que descumprem a lei de cotas para pessoas com deficiência estão sujeitas à imposição de multa pelos órgãos administrativos de fiscalização. Contudo, no caso, o Tribunal Regional destacou que a usina não se eximiu de tentar cumprir a determinação legal, tanto que firmou o TAC nesse sentido.
Para o relator, embora não haja regra expressa que proíba, em tais casos, a autuação e a aplicação de multa pelo auditor fiscal do trabalho, a intervenção do órgão fiscalizador enfraqueceria a intervenção do Ministério Público para a reversão da situação irregular, “além de desacreditar o termo de ajustamento de conduta”. O TAC, segundo o ministro, tem eficácia de título executivo extrajudicial, e compete à Justiça do Trabalho executar as obrigações nele estipuladas. “Uma vez descumpridas as cláusulas, é permitida sua execução direta, consoante dispõe o artigo 876 CLT”, assinalou.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO. CUMPRIMENTO DO DISPOSTO NO ARTIGO 93 DA LEI Nº 8.213/91. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA FIRMADO COM O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. O debate refere-se à validade do auto de infração pelo descumprimento da lei que determina a contratação de pessoas com deficiência, aplicado à empresa que havia firmado termo de ajustamento de conduta com o Ministério Público do Trabalho, que, diante das dificuldades existentes para o cumprimento da referida cota social, flexibilizou a base de cálculo prevista no artigo 93 da lei nº 8.231/91 para as empresas do setor sucroalcooleiro do Estado de Alagoas. De acordo com o artigo 5º, § 6º, da Lei nº 7.347/85, o Ministério Público do Trabalho pode firmar com os interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial, competindo à Justiça do Trabalho a execução pelo descumprimento do avençado. Se a empresa assumiu espontaneamente o encargo de contratar pessoas com deficiência , nos termos do TAC firmado com o MPT, cuja finalidade era justamente dar cumprimento à norma inserta no artigo 93 da Lei nº 8 . 213/91, consideradas as dificuldades fáticas do caso, não poderia ser autuada pela mesma conduta. Até porque, uma vez descumpridas as cláusulas do TAC, é permitida sua execução direta, consoante dispõe o artigo 876 CLT, que estabelece que o auditor fiscal do trabalho pode instaurar procedimento especial objetivando a orientação quanto ao cumprimento da lei. Impende destacar, também, que, embora inexista regra expressa que proíba, em tais casos, a atuação e aplicação da multa pelo auditor fiscal do trabalho, a impossibilidade na hipótese decorre, na verdade, da lógica do regime administrativo que é permeado pelo princípio da cooperação entre os órgãos públicos – responsável pela coesão de suas ações-, que, por sua vez, impede que seja esvaziada ou enfraquecida a competência garantida a outrem por lei, no caso específico, aquela prevista no artigo 5º, § 6º, da Lei nº 7.347/85. Reitera-se, por prudência, não se estar, com a conclusão ora externada, interditando a atribuição conferida aos auditores-fiscais de, diante da ocorrência de infrações, promover as respectivas autuações, mas, ao contrário, preservando o cumprimento da obrigação na forma pactuada no título executivo extrajudicial e em relação ao qual não se identificou a ocorrência de fatos novos que revelassem inadimplemento. Justamente o contrário. Com efeito, constou do quadro fático dos autos que a empresa efetivamente empreendeu esforços para o cumprimento da lei e do TAC em questão, “tendo, inclusive, dobrado o número de empregados portadores de deficiência” . Ainda, resultou consignado que a “empresa tentou selecionar empregados portadores de deficiência, encaminhando ofícios e promovendo ações para a vagas destinadas às pessoas com deficiência”. Saliente-se, ainda, que a impossibilidade de aplicação de multa no presente caso decorre, também, da observância ao Princípio da Segurança Jurídica, pois a empresa, ao firmar Termo de Ajustamento de Conduta justamente com o órgão que tem por atribuição a proteção do interesse público, coletivo e social e da ordem jurídica justrabalhista, com o objetivo de dar o melhor atendimento possível à norma prevista no artigo 93 da Lei nº 8.213/91, em face das dificuldades materiais de sua execução, passa a ter a legítima presunção de que está cumprindo com seu dever legal , não podendo, posteriormente, ser penalizada no que foi objeto de avença, salvo, como já salientado, se descumprido o acordo, o que não é o caso dos autos. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo.
Processo: AIRR-377-77.2012.5.19.0007