A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região confirmou, nesta semana, a condenação da União ao pagamento de indenização por danos morais e materiais à família de soldado morto em serviço por choque de alta tensão. O acidente ocorreu em um acampamento do Exército no município de São Gabriel (RS).
O soldado prestava serviço militar obrigatório no 6º Batalhão de Engenharia de Combate. No dia 19 de agosto de 1999, durante uma operação especial, ele faleceu após a antena do rádio que carregava ter tocado acidentalmente em um fio de alta tensão. Na ocasião, constatou-se que a rede elétrica estava mais de um metro abaixo do nível técnico regulamentar.
O pai, a mãe e o irmão menor do falecido ajuizaram ação com pedido de indenização na Justiça Federal. Após decisão favorável à família em primeira instância, a União apelou ao tribunal alegando que o militar não havia pago as 24 parcelas de contribuições para o ganho de pensão, conforme exige a legislação, e que o ocorrido teria sido um acidente.
Após analisar o recurso, o relator do processo, desembargador federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, entendeu que a União tem responsabilidade sobre o ocorrido. “Ao prever a obrigatoriedade do serviço militar, surge para o Estado o dever de guardar e assegurar a vida e a incolumidade física e psíquica dos soldados” ressaltou Lenz.
Em seu voto, o magistrado citou trecho da sentença nesse sentido: “conquanto o militar tenha consciência dos riscos a que está sujeito, não parece minimamente razoável deixar para a sua memória o peso da morte, tal como se fosse um mero ônus do serviço. Até mesmo no âmbito privado, que, não há submissão do operário a extremos semelhantes àqueles do serviço militar, o empregador responde objetivamente pelos danos causados”.
Conforme Lenz, a União dever arcar com os riscos do serviço militar obrigatório. O magistrado entende que cabe ao Exército compor seus quadros com oficiais militares preparados para preverem os riscos e evitarem a concretização dos danos. “O serviço militar é, por sua própria natureza, causador de riscos”, conclui ele, confirmando a obrigação de indenizar a família.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. MORTE. ELETROCUSSÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. QUANTUM. PENSIONAMENTO. PRESSUPOSTOS CONFIGURADOS. ÔNUS SUCUMBENCIAIS.
1. Caracterizado o nexo causal, como também presentes os demais pressupostos da responsabilidade civil, prospera o pedido de reparação por danos morais e materiais formulados com a exordial.
2. A indenização por dano moral não é preço matemático, mas compensação parcial, aproximativa, pela dor injustamente provocada. In casu, é mecanismo que visa a minorar o sofrimento da família, diante do drama psicológico da perda afetiva e humilhação social à qual foi submetida, na dupla condição de parente e cidadão. Objetiva também dissuadir condutas assemelhadas, seja pelos responsáveis diretos, seja por terceiros que estejam em condição de praticá-las futuramente. O montante indenizatório dos danos morais fixado pelas instâncias ordinárias está sujeito a excepcional controle pelo Superior Tribunal de Justiça, quando se revelar exorbitante ou irrisório (REsp 617131). A atual jurisprudência deste Tribunal aponta que o valor da indenização por dano moral, em caso de morte de familiar, deve ser arbitrado em, no mínimo, R$ 100.000,00 (cem mil reais), montante que revela-se melhor adequado ao caso em liça, devendo, ainda, ser corrigido monetariamente, a contar da fixação definitiva do quantum devido, pois o arbitramento considera o valor certo e atual da compensação (Súmula 362 do STJ), considerando os critérios das ações condenatórias em geral constantes do Manual de Cálculos desta Justiça Federal, e acrescido de juros de mora de 6% ao ano, cujo termo inicial é a data do evento danoso, não se aplicando ao caso (verba indenizatória), o artigo 1º-F da Lei n. 9.494/1997, com a redação da Medida Provisória n. 2.180-35/2001 ou pela Lei nº 11.960/2009.
3. As reparações cabíveis no caso em comento devem ser regidas pela legislação aplicável ao militar na data do seu óbito, ou seja, a Lei n° 3.765/60, e não o Código Civil, pois a relação é regulada pelo Direito Administrativo militar e não Direito Civil. E segundo a legislação administrativa militar aplicável ao caso o irmão do militar falecido não faz jus a percepção da pensão militar. Ainda que se considerasse que o mesmo era dependente do militar falecido, ele não teria direito à percepção da pensão, uma vez que os genitores estão inseridos na segunda ordem de prioridade e o irmão apenas poderia ser incluído na terceira ordem, ficando desse modo excluído em virtude da percepção de pensão pelos pais.
4. Com efeito, a Lei nº 3.756/60 assegura a percepção da pensão por morte também aos beneficiários de militar não contribuinte, se este, ao falecer, encontrava-se na ativa, com menos de 2 (dois) anos de efetivo exercício, desde que o falecimento tenha sido decorrente de acidente em serviço, de moléstia nele adquirida, de ferimento recebido, de acidente ocorrido, ou moléstia adquirida em operações de guerra. Esse o caso dos autos, pelo que, ainda que não comprovada a arrecadação das contribuições, tal não exclui seus dependentes do direito ao benefício.
5. Os genitores do soldado recebiam benefício previdenciário de valor mínimo, o que representava aproximadamente ¼ do importe auferido pelo filho, de modo que fica evidente a hipossuficiência e a dependência econômica dos pais em relação ao filho, que morava com eles e que contribuía para custear os gastos familiares com alimentação, saúde e manutenção da casa. Além disso, há precedentes jurisprudenciais no sentido de que a dependência dos pais em relação ao filho falecido não precisa ser absoluta, bastando a comprovação da participação no orçamento doméstico. No mais, a jurisprudência indica, ainda, que o critério que informa o pagamento da pensão é o da necessidade e que as previsões legais podem sofrer temperamentos diante do caso concreto, permitindo ao julgador adequar a rigidez da norma legal à realidade social.
6. Relativamente à verba honorária deve ser mantido o percentual fixado, conquanto consentâneo com a jurisprudência desta Corte para causas da espécie. De igual modo, quanto à sua base de incidência, considerando que majorado o valor da indenização por dano moral, com determinação para que a mesma seja acrescida de correção monetária e juros de mora, entendo deva a mesma ser mantida.
O desembargador estipulou o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 100 mil corrigidos monetariamente e pagamento de pensão aos pais do falecido, que dependiam economicamente deste.
AC 5000259-70.2011.404.7114