Por unanimidade, um menor atropelado por veículo de propriedade militar teve sua apelação contra a sentença, do Juízo Federal da 2ª Vara do Pará, parcialmente provida. A Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a condenação que obriga a União a pagar por danos morais, incluindo honorários advocatícios com atenuado percentual, e indeferiu o pedido de danos materiais da vítima.
De acordo com as testemunhas ouvidas no processo, “o condutor do veículo vinha dirigindo com cautela, com baixa velocidade, até mesmo porque estava chovendo muito, bem como teriam ouvido um estalo e em seguida o carro girou, desgovernando-se até atingir, com a parte traseira, o autor, e que tão logo o veículo parou na calçada e deram conta do atropelamento, foi providenciado o pronto atendimento, que foi prestado por ambulância do Corpo de Bombeiros”.
Consta dos autos que a vítima apresentava “traumatismo craniano encefálico, rebaixamento de nível de consciência e otorragia à esquerda sem sinais focais de lesões parequimatosas” ao chegar ao hospital. Ainda durante a internação o paciente estava em estado semicomatoso, com estado geral regular e escoriações nos membros inferiores e sem sinais de fratura. Após o tratamento hospitalar, o menor não apresentou sequelas físicas ou psicológicas decorrentes do acidente.
O relator, desembargador federal João Batista Moreira, ao analisar o caso, argumentou que “ante a inexistência de sequelas físicas ou psicológicas decorrentes do acidente ora em discussão, nem mesmo prejuízo escolar, visto que o acidente se deu no período das férias escolares, não resta dúvida de que são incabíveis os pedidos de pensão, bem assim como o de lucros cessantes” e entendeu que houve danos morais limitados aos traumas físicos e psicológicos e à internação e tratamento hospitalar durante quinze dias das férias escolares da criança.
Ainda segundo o magistrado, “deve-se considerar que a ação foi proposta cinco dias depois do acidente, com o objetivo, inclusive, de transferir a criança do Pronto Socorro Municipal para o Hospital da Aeronáutica. No dia do ajuizamento, ainda não era possível avaliar, com segurança, o estado físico da vítima. Explicável, pois, até certo ponto, o pedido de indenização por danos materiais, o qual, apesar de quantitativamente formulado acima do razoável, foi feito sob a condição de se confirmarem os danos nesse campo. Justifica-se, assim, a condenação da União em honorários de advogado, com atenuado percentual”.
O recurso foi assim ementado:
RESPONSABILIDADE CIVIL. ATROPELAMENTO. VEÍCULO DA UNIÃO (MINISTÉRIO DA AERONÁUTICA). DEFEITO DA MÁQUINA (PERDA DA BARRA DE DIREÇÃO). DANOS MORAIS, APENAS. QUANTO INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE DA QUANTIA FIXADA NA SENTENÇA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. INDEFERIMENTO. PEDIDO, TODAVIA, JUSTIFICÁVEL NA OCASIÃO EM QUE FORMULADO. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. DEFERIMENTO. ATENUAÇÃO DO RESPECTIVO PERCENTUAL.
1. Trata-se de apelações contra sentença proferida em ação ajuizada por Werlley do Rosário Santos, menor representado pela mãe, a qual: a) confirmou “a antecipação de tutela”, deferida em parte “para determinar à União Federal que providencie, de imediato e por sua conta, a transferência do autor do Pronto Socorro Municipal de Belém para o Hospital da Aeronáutica de Belém, fornecendo (…) gratuitamente todo o tratamento (…) de suas lesões, aí incluindo-se toda a medicação, exames, uso de equipamentos, tratamento e terapias que se fizerem necessários”; b) julgou “parcialmente procedente a ação, condenando a União ao pagamento (…) de indenização por dano moral”, arbitrada em “R$40.000,00 (quarenta mil reais), valor que deverá ser corrigido monetariamente a partir da sentença, até a data do efetivo pagamento, conforme fixado na Lei 11.960/2009, que alterou a Lei 9.494/1997”; c) afirmou “sucumbência recíproca”, devendo “cada parte arcar com o ônus do seu patrocínio” e “custas pro rata”.
2. Houve, felizmente, apenas danos morais e limitados estes ao trauma físico e psicológico da criança e à internação e tratamento hospitalar durante quinze dias das férias escolares. A causa foi “defeito da máquina”, perda da barra de direção por um veículo (Kombi) de saudosa memória, mas conhecido por instabilidade. Ainda que se considere caso fortuito, tratando-se do chamado “fortuito interno”, não é excludente de responsabilidade.
3. Para concluir pela responsabilidade da União não há necessidade de recorrer ao critério constitucional da responsabilidade predominantemente objetiva das pessoas jurídicas de direito público e de direito privado prestadoras de serviço público. Basta o art. 927, parágrafo único, do Código Civil: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”. É o caso da utilização de veículos automotores, que, por si mesma, implica risco para pedestres.
4. O quanto indenizatório está de acordo com o que tem decidido, em ações da espécie, esta Corte (AC 0009351-93.2005.4.01.3900/PA, Rel. Juiz Federal Roberto Carlos de Oliveira (Conv.), 6T, e-DJF1 20/02/2019; AC 0007124-30.2009.4.01.3500/GO, Rel. Juíza Federal Hind Ghassan Kayath (Conv.), 6T, e-DJF1 31/03/2017; 0001480-59.1998.4.01.3802/MG, Rel. Desembargador Federal João Batista Moreira, 5T, e-DJF1 10/08/2015; entre outros), bem assim o Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AREsp 1.402.706/MG, Rel. Min. Raul Araújo, T$, DJe 12/04/2019; REsp 1.715.434/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, T2, DJe 26/11/2018; entre outros).
5. “…na ação de indenização por dano moral, a sucumbência está ligada ao reconhecimento ou não do pedido. Ela não diz respeito ao quantum arbitrado pelo juízo, conforme se infere do enunciado da Súmula n. 326/STJ” (STJ, AgRg no REsp 1.522.761/PR, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, DJe de 18/09/2015). Assim, “se, no grau recursal, o Tribunal não julgar o recurso de modo a alterar a sucumbência, não lhe é dado reexaminar os honorários advocatícios (…)” (AgInt nos EDcl no REsp 1.357.561/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, DJe de 19/04/2017).
6. O autor pediu, também, indenização por danos materiais, a qual foi indeferida. Todavia, deve-se considerar que a ação foi proposta cinco dias depois do acidente, com o objetivo, inclusive, de transferir a criança do Pronto Socorro Municipal para o Hospital da Aeronáutica. No dia do ajuizamento, ainda não era possível avaliar, com segurança, o estado físico da vítima. Justificava-se, pois, o pedido de indenização por danos materiais, o qual, apesar de quantitativamente formulado acima do razoável, foi feito sob condição de se confirmarem os danos nesse campo.
7. Negado provimento à remessa oficial e à apelação da União. Parcial provimento à apelação do autor para condenar a União em honorários de advogado de 5% sobre o valor da condenação.
O Colegiado, acompanhando o voto do relator, deu parcial provimento à apelação.
Nº do processo:
2007.39.00.006266-8
0006000-44.2007.4.01.3900