A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF1) deu parcial provimento à apelação da Caixa Econômica Federal (CEF) contra a sentença, do Juízo da 3ª Vara Federal da Seção Judiciária de Goiás, que julgou improcedente o pedido de nulidade do processo administrativo instaurado pelo Instituto de Defesa do Consumidor de Goiás (Procon), e de redução de multa aplicada pelo instituto à CEF por dificultar aos consumidores os pagamentos de boletos no caixa convencional da agência. A instituição direcionava os correntistas para outros canais de atendimento, como terminais eletrônicos, débito automático, Internet Banking e casas lotéricas. A decisão também confirmou a legitimidade dos Procons para fiscalizar e multar instituições financeiras públicas federais.
De acordo com o processo, após receber denúncias pelo canal de atendimento 151, o Procon de Goiás realizou fiscalização em uma agência da CEF no estado e constatou que o banco estava oferecendo resistência para pagamentos nos caixas da agência aos correntistas, informando que os clientes deveriam usar outros canais, como os meios eletrônicos. Com isso, o órgão identificou que a Caixa contrariou o artigo 39, inciso IX do Código de Defesa do Consumidor (CDC), Lei nº 8.078/90, que proíbe práticas abusivas para fornecedor de produtos ou serviços, como recusar a venda de bens ou a prestação de serviços diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais. A conduta da Caixa também violou a Resolução nº 3694, de 26/03/2009 do Banco Central do Brasil, a qual estabelece, em seu art. 3º, que é vedado às instituições financeiras recusar ou dificultar, aos clientes e usuários de seus produtos e serviços, o acesso aos canais de atendimento convencionais, inclusive guichês de caixa, mesmo na hipótese de oferecer atendimento alternativo ou eletrônico.
Após a confirmação das irregularidades, o Procon-GO, por meio de auto de infração, aplicou multa à Caixa Econômica Federal no valor de R$31.764,71. A instituição bancária ingressou com ação na Justiça pleiteando anulação da multa ou redução do valor estipulado. No pedido, a CEF alegou incompetência do Procon para fiscalizar as atividades desenvolvidas pelo banco, ação que caberia privativamente ao Banco Central do Brasil (Bacen). Além disso, argumentou que somente a Justiça Federal teria legitimidade, de acordo com a Constituição Federal, para processar e julgar as demandas contra a CEF.
No primeiro grau o pedido foi negado, e a Caixa apelou ao TRF 1ª Região. O caso foi julgado pela Quinta Turma sob a relatoria da desembargadora federal Daniele Maranhão. Em seu voto, a magistrada citou entendimentos do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do próprio TRF1, no sentido de que o fato de a CEF ser empresa pública federal não é impeditivo de sua submissão à fiscalização do Procon na condição de órgão de proteção do consumidor, e que o artigo 173 da Constituição Federal sujeita as empresas públicas ao mesmo regime das empresas privadas em relação às suas obrigações civis, o que viabiliza o poder de fiscalização do Procon sobre a CEF. “ Se diferente fosse, a Caixa ficaria impune aos eventuais abusos e falhas cometidos em suas relações consumeristas”, afirmou a desembargadora.
A relatora entendeu não existir vício na aplicação do auto de infração, visto que a punição administrativa revelou-se cabível e necessária. Contudo, a magistrada destacou que é possível a redução do valor da multa por entender que foi desproporcional em relação à infração cometida, e que a quantia em questão deve ter efeito pedagógico essencial para desestimular a reincidência da conduta, sem ser excessiva.
Por unanimidade, o Colegiado fixou a multa em 15 mil reais levando em conta, também, que não houve notícia de reiteração infracional por parte da apelante. Também que a ilicitude revelou comportamento negligente da Caixa, mas que a instituição não teve a finalidade de obtenção de vantagem indevida.
O Recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO. PROCON. MULTA. FISCALIZAÇÃO DE INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. POSSIBILIDADE. FALHA NO SERVIÇO BANCÁRIO. APLICAÇÃO DE MULTA. CABIMENTO. REDUÇÃO DO VALOR. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. O PROCON possui competência para fiscalizar as instituições bancárias em relação aos serviços prestados aos seus consumidores, inexistindo usurpação de atribuições do Banco Central do Brasil, cuja competência permanece preservada em quanto à regulação das atividades financeiras e bancárias. Precedentes.
2. A Resolução do Banco Central do Brasil nº 3694, de 26/03/2009, em seu art. 3º, dispõe que é vedado às instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil recusar ou dificultar, aos clientes e usuários de seus produtos e serviços, o acesso aos canais de atendimento convencionais, inclusive guichês de caixa, mesmo na hipótese de oferecer atendimento alternativo ou eletrônico.
3. Hipótese em que a CEF foi flagrada pela fiscalização do PROCON/GO oferecendo resistência em permitir que os clientes efetuassem pagamentos de boletos bancários diretamente nos caixas convencionais, tentando direcioná-los para outros canais de atendimento, como terminais eletrônicos, débito automático, Internet Banking, Mobile Bank e casas lotéricas.
4. Consideradas as circunstâncias do caso concreto, a redução da multa de R$ R$ 31.764,71 para R$ 15.000.00 é necessária, em atenção ao princípio da razoabilidade, e se mostra suficiente para que seja alcançado o efeito pedagógico essencial para desestimular a reincidência da conduta, sem ser excessiva.
5. Apelação parcialmente provida.
Processo: 1003531-92.2017.4.01.3500