STF mantém lei que permite criação de federações partidárias

Entendimento da Corte foi no mesmo sentido de manifestação do Ministério Público Federal

O Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou as alegações de inconstitucionalidade – formal ou material – na legislação que criou as federações partidárias (Lei 14.208/2021). A decisão do Plenário da Corte foi no julgamento do referendo de medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.021, durante sessão plenária desta quarta-feira (9). O entendimento do STF foi no mesmo sentido do posicionamento externado pelo Ministério Público Federal (MPF), em sustentação oral do vice-procurador-geral, Humberto Jacques de Medeiros, na última quinta-feira (3), quando foi iniciado o julgamento.

A Corte Suprema entendeu que o mecanismo das federações funciona de forma diferente das coligações, ao contrário do que defendeu o autor da ADI, o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Para o relator, ministro Roberto Barroso, as coligações permitiam que partidos sem qualquer afinidade e até programas opostos se unissem somente para lançar candidatos. Quanto às federações, a lei obriga que as agremiações criem programa de abrangência nacional, que deve ser aprovado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Além disso, a nova legislação define que os partidos políticos devem permanecer na federação por, no mínimo, quatro anos. “Ao que tudo indica, o que se pretendeu não foi aprovar o retorno disfarçado das coligações proporcionais. Buscou-se, ao contrário, assegurar a possibilidade de formação de alianças persistentes entre partidos”, destacou Barroso.

Esse entendimento foi o defendido pelo vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, no início do julgamento, quando afirmou ser constitucional a Lei 14.208/2021. O vice-PGR observou que a norma questionada é partidária e não eleitoral e defendeu que a criação das federações foi um caminho acertado pelo legislador, com vista a diminuir a quantidade de partidos políticos. “Houve, na verdade, um caminho mais leve e mais suave para o processo de redução do número de partidos políticos com a inteligência de se fomentar a democracia interna nas instituições partidárias”, pontuou Humberto Jacques na oportunidade.

Cautelar referendada – Os ministros do STF também formaram maioria para conceder a medida liminar na ADI, nos termos do voto do relator quanto ao prazo de registro das federações no TSE. Anteriormente, Barroso havia decidido suspender trecho da legislação que permitia às federações se constituírem até a data final do período de convenções partidárias, cerca de dois meses antes das eleições. Para ele, o Supremo deveria fixar o prazo de seis meses – o mesmo definido por lei para o registro de partidos –, que finalizaria em março. No entanto, nesta quarta-feira, após argumentações de legendas partidárias, Barroso alterou o voto para garantir que “excepcionalmente nas eleições de 2022 o prazo deve ser estendido até 31 de maio”.

O recurso ficou assim ementado:

Direito constitucional e eleitoral. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Referendo de Medida Cautelar. Federação de Partidos Políticos. Lei nº 14.208/2021. Cautelar parcialmente deferida, quanto ao prazo de registro, para preservação da isonomia. 1. A lei questionada – Lei nº 14.208/2021 – alterou a redação da Lei nº 9.096/1995, criando o instituto da federação partidária. Essa nova figura permite a união entre partidos políticos, inclusive para concorrerem em eleições proporcionais (para deputado federal, estadual e vereador). Alegação de vícios de inconstitucionalidade formal e de inconstitucionalidade material. I. Inexistência de inconstitucionalidade formal 2. O projeto de lei foi iniciado e aprovado no Senado Federal, sob a antiga redação do art. 17, § 1º, da Constituição, que admitia coligação eleitoral inclusive no sistema proporcional. Na sequência, foi remetido à Câmara dos Deputados e aprovado, sob a vigência da nova redação do referido dispositivo, que passou a vedar coligações em eleições proporcionais (EC 97/2017). Daí a alegação de que deveria ter retornado à Casa em que iniciada a tramitação. O argumento, porém, não procede. 3. Nada na Constituição sugere que a superveniência da emenda constitucional referida exigiria o retorno ao Senado Federal do projeto já aprovado pelas duas Casas. O reexame pela Casa iniciadora somente se dá no caso em que o projeto tenha seu conteúdo alterado na Casa revisora (CF, art. 65, parágrafo único), o que não ocorreu. Na Câmara dos Deputados, houve apenas emendas de redação. Cabe observar ainda que: (i) federação partidária e coligação constituem institutos diversos; e (ii) o Congresso Nacional, em sessão conjunta, reunindo o Senado e a Câmara, por maioria absoluta, rejeitou o veto que havia sido aposto pela Presidente da República ao projeto aprovado. Portanto, há inequívoca manifestação de vontade de ambas as Casas Legislativas em relação à matéria. II. Inexistência de inconstitucionalidade material 4. A federação partidária possui importantes pontos de distinção em relação às coligações, que em boa hora foram proibidas. As coligações consistiam na reunião puramente circunstancial de partidos, para fins eleitorais, sem qualquer compromisso de alinhamento programático. Tal fato permitia, por exemplo, que o voto do eleitor, dado a um partido que defendia a estatização de empresas, ajudasse a eleger o candidato de um partido ultraliberal. Ou vice-versa. A fraude à vontade do eleitor era evidente. 5. Já a federação partidária, embora assegure a identidade e a autonomia dos partidos que a integram (art. 11-A, § 2º), promove entre eles: (i) uma união estável, ainda que transitória, com durabilidade de no mínimo 4 (quatro) anos (art. 11-A, § 3º, II); (ii) requer afinidade programática, que permita a formulação de estatuto e de um programa comuns à federação (art. 11-A, § 6º, II), e (iii) vincula o funcionamento parlamentar posterior às eleições (art. 11-A, § 1º). Em tais condições, as federações não implicam transferência ilegítima de voto entre partidos com visões ideológicas diversas e, portanto, não geram os impactos negativos sobre o sistema representativo que resultavam das antigas coligações proporcionais. 6. É possível questionar a conveniência e oportunidade da inovação, que pode retardar a necessária redução do número de partidos políticos no país. Mas essa avaliação, de natureza política, não cabe ao Poder Judiciário. Em juízo cautelar e em exame abstrato da matéria, não se vislumbra inconstitucionalidade. Naturalmente, se no mundo real se detectarem distorções violadoras da Constituição, tal avaliação preliminar poderá ser revisitada. Para isso, no entanto, é imperativo aguardar o processo eleitoral e seus desdobramentos. Por ora, portanto, não é o caso de impedir a experimentação da fórmula deliberada pelo Congresso Nacional. III. Quebra da isonomia entre a federação e os demais partidos 7. Existe, porém, um problema de quebra de isonomia no tratamento diferenciado dado à federação partidária, no que diz respeito ao seu registro perante o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Partidos políticos têm de fazê-lo até 6 (seis) meses antes das eleições (Lei nº 9.504/1997, art. 4º), sendo que, em relação à federação, a lei ora impugnada estende esse prazo até a data final do período de realização das convenções partidárias. Trata-se de uma desequiparação que não se justifica e que pode dar à federação indevida vantagem competitiva. IV. Dispositivo 8. Voto pelo referendo da cautelar, parcialmente deferida, apenas quanto ao prazo para constituição e registro da federação partidária perante o TSE, tendo como consequência: (i) suspender o inciso III do § 3º do art. 11-A da Lei nº 9.096/1995 e o parágrafo único do art. 6º-A da Lei nº 9.504/1997, com a redação dada pela Lei nº 14.208/2021; (ii) conferir interpretação conforme à Constituição ao caput do art. 11-A da Lei nº 9.096/1995, de modo a exigir que, para participar das eleições, as federações estejam constituídas como pessoa jurídica e obtenham o registro de seu estatuto perante o Tribunal Superior Eleitoral no mesmo prazo aplicável aos partidos políticos. 9. Tese: “É constitucional a Lei nº 14.208/2021, que institui as federações partidárias, salvo quanto ao prazo para seu registro, que deverá ser o mesmo aplicável aos partidos políticos. Excepcionalmente, nas eleições de 2022, o prazo para constituição de federações partidárias fica estendido até 31 de maio do mesmo ano”.

Leia mais:

Criação de federações partidárias para eleições proporcionais é constitucional, defende MPF no Supremo

Processo relacionado: ADI 7021

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