Sem acordo para jornada 12×36, empregador terá de pagar horas extras a cuidadoras

Nesse tipo de jornada, a lei exige o documento escrito

A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu o direito de duas cuidadoras de Ceará-Mirim (RN) a horas extras no período que extrapolar os limites diário e semanal da jornada do empregado doméstico. O entendimento de que cabia a elas comprovar a jornada a mais foi afastado pela Turma, que declarou que a obrigação de controle de jornada deve ser do empregador.

12 x 36

O artigo 12 da Lei Complementar 150/2015, que dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico, exige que o empregador mantenha algum tipo de controle da jornada praticada pelo empregado. No caso do regime especial de jornada 12×36, o artigo 10 exige a celebração de acordo escrito.

Cuidadoras

Na reclamação trabalhista, as empregadas relataram que haviam sido contratadas para cuidar da mãe do empregador, revezando entre si em turnos de 24h e 48h.

O empregador, em sua defesa, alegou que as trabalhadoras recebiam diárias e, portanto, não tinham direito a horas extras.

“Aventura”

O juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (RN) julgaram improcedente o pedido de horas extras. Segundo a sentença, as cuidadoras não permaneciam trabalhando por 24 horas consecutivas e dormiam no local de trabalho. O regime presumido foi o de 12×36, em que elas trabalhariam 12 horas e permaneceriam o restante do tempo “exercendo atividades individuais ou repousando” e, depois, “tinham um dia inteiro de folga”.

O TRT, por sua vez, entendeu que cabia às cuidadoras comprovar suas alegações sobre as horas extras, mas elas não apresentaram testemunhas. “Ficaram inertes. Preferiram aventurar-se na demanda trabalhista sem nada provar”, registrou a decisão.

Prova diabólica

Para o relator do recurso de revista das cuidadoras, desembargador convocado José Pedro de Camargo, impor a elas a obrigação de provar a jornada extraordinária constitui verdadeira “prova diabólica”. “O trabalho doméstico, na maior parte das vezes, é realizado sem a presença de outros empregados ou terceiros, que não os membros da família”, ressaltou. Ele explicou que, quando se constata impossibilidade ou excessiva dificuldade de cumprir o encargo, a CLT permite a distribuição dinâmica do ônus da prova.

Acordo escrito

O relator observou que, no caso do empregado doméstico, a própria lei atribui ao empregador o ônus de firmar acordo escrito que comprove a adoção do regime 12×36 de manter registros de controle de jornada, o que não foi comprovado. Segundo ele, o TRT foi categórico ao reconhecer que as cuidadoras exerciam jornada de 12×36,  ficavam à disposição do empregador e pernoitavam no local de trabalho. Por outro lado, não faz menção a nenhum documento apresentado pelo empregador para comprovar a adoção desse regime ou do controle da jornada.

O recurso ficou assim ementado:

I – AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMPREGADO DOMÉSTICO. REGIME 12X36. EXIGÊNCIA DE CONTRATO ESCRITO. CONTROLE DE JORNADA PELO EMPREGADOR DOMÉSTICO. ART. 12 DA LC 150/15.

Na hipótese, o recurso de revista se viabiliza pela tese de violação direta dos arts. 7º, XIII, da Constituição Federal, 2º e 12 da Lei Complementar n° 150/2015. Considerando que a decisão impugnada diverge da jurisprudência do TST, reconheço a transcendência política da questão.

Agravo de instrumento provido.

II – RECURSO DE REVISTA. EMPREGADO DOMÉSTICO. REGIME 12X36. EXIGÊNCIA DE CONTRATO ESCRITO. CONTROLE DE JORNADA PELO EMPREGADOR DOMÉSTICO. ART. 12 DA LC 150/15.

O Tribunal Regional é categórico ao reconhecer que as reclamantes exerciam jornada no regime de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso, nos termos do art. 10 da LC 150/15. Também fez constar que as reclamantes ficavam à disposição do empregador e pernoitavam no local de trabalho. Por outro lado, não faz menção a qualquer documento apresentado pelo empregador, a fim de comprovar a adoção do referido regime ou do controle da jornada. Nota-se que o Regional imputou às reclamantes o ônus de comprovar a jornada alegada na inicial, o que contraria a jurisprudência majoritária desta Corte, como demonstra a Súmula nº 338, I, do TST, que dispõe acerca da presunção de veracidade conferida às alegações do reclamante, quando não apresentados os controles de jornada. No caso concreto, impor às empregadas a prova da jornada extraordinária constitui verdadeira prova diabólica, visto que o trabalho doméstico, na maior parte das vezes, é realizado sem a presença de outros empregados ou terceiros, que não os membros da família. Nesses casos, o art. 818, §1º, da CLT permite a distribuição dinâmica do ônus probatório, quando se constata impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo. Não se pode olvidar que, no caso do empregado doméstico, a própria lei atribui ao empregador o ônus de firmar acordo escrito que comprove a adoção do regime 12×36, bem como manter registros de controle de jornada, conforme arts. 10 e 12 da LC 150/15, o que não foi comprovado. Dessa forma, os recorridos não se desincumbiram do ônus que lhes cabia, presumindo-se verdadeira a jornada alegada pelas reclamantes na inicial, sendo devido o pagamento das horas que extrapolaram o limite diário e semanal, com acréscimo de 50%, bem como respectivos reflexos legais, nos termos da inicial.

Recurso de revista conhecido e provido.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-389-45.2018.5.21.0001

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