Relator vota pela constitucionalidade do exame da OAB

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello, relator do Recurso Extraordinário (RE) 603583, considerou constitucional o artigo 8º, IV, da Lei 8.906/1994, que dispõe sobre a obrigatoriedade de aprovação prévia em exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para que bacharéis em Direito possam exercer a advocacia. O ministro negou provimento ao recurso, por considerar que a exigência do exame está de acordo com os princípios constitucionais, baseado no interesse público de proteger a sociedade do exercício de profissões capazes de gerar algum tipo de dano à coletividade.

Segundo ele, o dispositivo da referida lei não afronta a liberdade de ofício prevista no inciso XIII, artigo 5º, da Constituição Federal, conforme argumentava o bacharel em direito autor do recurso. Para o ministro, embora o referido comando constitucional impeça o Estado de opor qualquer tipo de embaraço ao direito dos cidadãos de obter habilitação para a prática profissional, quando o exercício de determinada profissão transcende os interesses individuais e implica riscos para a coletividade, “cabe limitar o acesso à profissão em função do interesse coletivo”. “O constituinte limitou as restrições de liberdade de ofício às exigências de qualificação profissional”, afirmou o ministro Marco Aurélio, ao citar o próprio inciso XIII, artigo 5º, da Carta Magna, que prevê para o livre exercício profissional o respeito às qualificações estabelecidas em lei.

Para o relator, qualificar-se para o exercício de determinada profissão não implica apenas submeter-se a sessões de teorias e técnicas. Segundo ele, se validado o argumento do requerente de que a prova aplicada pela OAB não atesta a qualificação do bacharel de direito, da mesma forma teriam que ser contestadas as provas aplicadas pelas faculdades de direito. “O exame serve ao propósito de avaliar se estão presentes as condições mínimas para o exercício da advocacia e para oferecer à coletividade profissionais qualificados”, reforçou.

No caso da advocacia, conforme ressaltou  o relator, o exercício da atividade por profissionais não qualificados pode causar prejuízos não só ao cliente como à coletividade, no sentido de limitar o acesso à Justiça e atrapalhar o andamento da atividade judiciária. Para ele, o advogado ocupa papel central na manutenção do estado democrático de direito e na aplicação da ordem jurídica. Portanto, declarar a inconstitucionalidade do exame teria efeito oposto ao de fortalecer a advocacia, quesito fundamental à manutenção do estado democrático de direito.

Reserva de mercado

Em relação à alegação da defesa de que os baixos índices de aprovação do exame configuram reserva de mercado, o ministro Marco Aurélio defendeu não ser válido o argumento, visto que a realização da prova não impõe limitação de vagas, tampouco risco de jubilação, pois o candidato pode repetir o certame quantas vezes julgar necessário. Segundo o relator, a prova é impessoal e objetiva, respeita os princípios constitucionais referentes ao concurso público e segue conteúdo ministrado pelas faculdades de direito. Além disso, está submetida ao controle judicial, uma vez que eventuais ilegalidades cometidas pela banca examinadora podem ser contestadas pelos candidatos na Justiça.

O ministro sustentou, ainda, que não existe vedação constitucional à exigência de outra obrigatoriedade ao exercício do ofício, além da obtenção do grau acadêmico. O próprio inciso XIII do artigo 5º admite textualmente a restrição à liberdade de ofício com base na qualificação profissional, “desde que veiculada por lei em sentido formal e textual”. “Não raro a formação acadêmica é insuficiente à realização correta de determinado trabalho”, completou.

Segundo o relator, não se pode confundir a função das instituições de ensino, responsáveis por ministrar o conteúdo e conferir o grau acadêmico, com o papel complementar desempenhado pelas associações de classe, que possuem poder de polícia, sendo responsáveis “por limitar e controlar, com fundamento na lei, o exercício de certo ofício, considerando o interesse público”. “A Ordem exerce função pública e vale-se dos poderes próprios de Estado, inclusive o de tributar e punir”.

Princípio da legalidade

Quanto ao argumento do requerente de que o dispositivo constante no artigo 8º, parágrafo 1º, da Lei 8.906/94 – o qual autoriza o Conselho Federal da OAB a regulamentar o exame de Ordem – afronta o princípio da legalidade e usurpa a competência privativa do presidente da República para regulamentar leis, o ministro Marco Aurélio afirmou que não cabe interpretar a referida norma de forma solitária, dissociada do restante da legislação. Para ele é “natural” conferir à OAB a prerrogativa de editar as normas para a realização do teste, de forma a dar concretude ao que está previsto na Lei 8.906/94, não havendo no parágrafo 1º do artigo 8º da referida legislação “genuína delegação de poderes legislativos à autarquia administrativa”.

Além disso, o dispositivo legal impugnado pelo recurso, conforme argumenta o ministro, não usurpa competência privativa do presidente da República, visto que “a Constituição não impede que a lei confira a entidades da administração pública ou privada prerrogativas de concretizar aspectos práticos que lhe concernem”.

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