Recuperação em consolidação processual não impede posterior análise do pedido de cada litisconsorte

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o deferimento do pedido de recuperação judicial em consolidação processual não impede a posterior análise do preenchimento dos requisitos para o seu processamento em relação a cada um dos litisconsortes. Segundo o colegiado, cada litisconsorte deve atender individualmente esses requisitos, e seus ativos e passivos serão tratados em separado.

No caso dos autos, uma construtora pediu recuperação, tendo sido deferido o seu processamento pelo juízo da 2ª Vara da Comarca de Itapecerica da Serra (SP). Outras cinco sociedades que integravam o mesmo grupo empresarial ingressaram no feito requerendo a extensão da recuperação judicial, o que provocou a redistribuição do processo e sua remessa à 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Foro Central de São Paulo.

Por entender que não seria possível o processamento conjunto da recuperação, esse novo juízo determinou a extinção do processo em relação a algumas sociedades.

TJSP deixou a critério dos credores a possibilidade de consolidação substancial

Ao julgar recurso contra essa decisão, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) admitiu a consolidação processual, deixando aos credores o exame da possibilidade de haver consolidação substancial. Devolvidos os autos ao primeiro grau, houve deliberação no sentido de que a recuperação não poderia seguir em consolidação substancial sem o prévio exame da questão pelos credores.

Na assembleia geral de credores, foi aprovado o plano de recuperação das sociedades pertencentes ao grupo, com exceção de uma empresa de energia renovável, em relação à qual a assembleia foi suspensa. Assim, o juízo de primeiro grau extinguiu o processo em relação a essa empresa, sob o fundamento de que havia somente dois credores para deliberar a respeito do seu plano – decisão mantida pelo TJSP.

No recurso ao STJ, a empresa de energia renovável alegou que o tribunal de segundo grau, ao permitir a extinção do processo em relação a ela, decidiu matéria que estaria preclusa, uma vez que a possibilidade de consolidação processual de todas as empresas do grupo já havia sido reconhecida em julgamento anterior.

Acórdão recorrido não tratou de matéria preclusa

O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, observou que a consolidação processual se refere apenas à possibilidade de apresentação do pedido de recuperação em litisconsórcio ativo, devendo cada litisconsorte preencher individualmente os requisitos legais.

O ministro afirmou que, segundo a doutrina, em se tratando de litisconsorte ativo facultativo, a consolidação processual exige que todos os requisitos da Lei de Recuperação de Empresas e Falências sejam preenchidos por cada um dos autores, os quais deverão ainda apresentar a documentação relacionada no artigo 51 da norma para que os respectivos credores possam analisar individualmente a crise e os meios de soerguimento.

“Nesse contexto, o acórdão recorrido não trata de matéria preclusa quando analisa se a recorrente individualmente preenche os requisitos para pleitear a recuperação judicial. De fato, o que foi decidido é que as requerentes compunham um grupo econômico, o que autorizava o pedido de recuperação judicial em litisconsórcio ativo, sem que tenha sido examinado se cada uma das recuperandas preenchia isoladamente os requisitos exigidos em lei”, concluiu.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. DECISÃO SURPRESA. NÃO OCORRÊNCIA. CONSOLIDAÇÃO PROCESSUAL. PRECLUSÃO. ABUSO DE DIREITO. NÃO CARACTERIZAÇÃO.
1. A questão controvertida resume-se a definir se (i) houve negativa de prestação jurisdicional, (ii) o julgamento poderia ter se realizado virtualmente, (iii) o anterior deferimento do processamento da recuperação judicial das empresas do Grupo Gomes Lourenço em consolidação processual impedia a extinção do processo em relação a uma das litisconsortes em decorrência da preclusão, (iv) ocorreu decisão surpresa e, (v) a assembleia geral de credores deveria ser retomada.
2. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte.
3. A extinção da lide em relação a litisconsorte que não preenche os requisitos para pleitear a recuperação judicial está inserta no âmbito de desdobramento causal, possível e natural da controvérsia, obtido a partir de um juízo de ponderação do magistrado à luz do ordenamento jurídico vigente, o que não caracteriza decisão surpresa.
4. A expressão consolidação processual se refere apenas à possibilidade de apresentar o pedido de recuperação judicial em litisconsórcio ativo.
5. Cada um dos litisconsortes deve preencher os requisitos para o pedido de recuperação judicial individualmente e seus ativos e passivos serão tratados em separado.
5. O fato de ter sido deferido o processamento da recuperação judicial em consolidação processual não impede a posterior análise do preenchimento dos requisitos para o pedido de recuperação em relação a cada um dos litisconsortes.
6. As demais sociedades do grupo, negociando com seus credores, obtiveram a recuperação judicial, de modo que não houve impedimento para a aprovação do plano, com o que não resta caracterizado o abuso de direito de voto.
7. Recurso especial conhecido e não provido.

Leia o acórdão no REsp 2.068.263.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 2068263

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