A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o prazo prescricional para ajuizar pedido de indenização contra o tabelião, em razão dos danos materiais decorrentes de procuração nula lavrada por ele, começa a contar a partir do trânsito em julgado da sentença que reconheceu a nulidade.
De acordo com os autos, a empresa autora da ação indenizatória negociou a compra de um imóvel com uma pessoa que possuía procuração supostamente passada pela proprietária. Após a concretização do negócio, a antiga dona do imóvel ajuizou ação declaratória de nulidade e cancelamento de registro e uma ação de reintegração de posse. A primeira, julgada procedente, transitou em julgado em 2017.
Diante disso, em 2019, a empresa compradora do imóvel acionou judicialmente o tabelião, pedindo indenização pelos prejuízos sofridos em decorrência da lavratura de procuração pública com base em identidade falsa, e obteve êxito nas instâncias ordinárias, que reconheceram a legitimidade passiva do tabelião e afastaram a prescrição.
No recurso especial dirigido ao STJ, o tabelião sustentou que o prazo de prescrição da reparação civil, de três anos nesse caso, deveria ser contado da data da lavratura da procuração, conforme o artigo 22, parágrafo único, da Lei 8.938/1994.
Configuração do efetivo prejuízo depende do trânsito em julgado
A relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou que o ato notarial e de registro tem presunção legal de veracidade e, por isso, no caso em julgamento, o efetivo prejuízo só se configurou com o trânsito em julgado da sentença que reconheceu a nulidade documental e resultou na reintegração da antiga proprietária na posse do imóvel.
“A pretensão indenizatória da autora contra o tabelião nasceu somente quando infirmada, definitivamente, a autenticidade do ato notarial e de registro lavrado no cartório de que ele é titular”, acrescentou.
A ministra apontou uma decisão semelhante, também da Terceira Turma, no AREsp 2.023.744, que aplicou a teoria da actio nata por entender que “a pretensão indenizatória da parte recorrida dependia do reconhecimento judicial do vício no registro”.
“Não merece reparo o acórdão exarado pelo tribunal de origem, ao manter a decisão que afastou a alegada prescrição, fundado na teoria da actio nata“, concluiu a relatora.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA AJUIZADA CONTRA TABELIÃO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL POR PROCURAÇÃO. SENTENÇA DECLARATÓRIA DE NULIDADE DA PROCURAÇÃO COM CANCELAMENTO DO REGISTRO DO IMÓVEL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DANOS MATERIAIS SUPORTADOS PELO ADQUIRENTE. TERMO INICIAL DA PRETENSÃO INDENIZATÓRIA. TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA PROFERIDA NA AÇÃO ANULATÓRIA.1. Ação indenizatória ajuizada em 11⁄12⁄2019, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 30⁄05⁄2022 e concluso ao gabinete em 04⁄10⁄2022.2. O propósito recursal é decidir sobre o termo inicial do prazo prescricional para exercício da pretensão, contra o tabelião, de indenização por danos materiais decorrentes do cancelamento do registro de compra e venda de imóvel, porque realizada com base em procuração declarada nula.3. A Lei 8.935⁄2004 estabelece, em seu art. 1º, que os serviços notariais e de registro são “destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos” – como prevê também o art. 1º da Lei 6.015⁄1993 – e, em seu art. 3º, que o “notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são profissionais do direito, dotados de fé pública”.4. Hipótese em que, por força da presunção legal de veracidade inerente ao ato notarial e de registro, a efetiva lesão ao bem jurídico tutelado só se configurou com a sentença transitada em julgado, em que declarada a nulidade da procuração, da escritura pública de compra e venda do imóvel e de seu respectivo registro, e, por conseguinte, determinou a reintegração da posse, em favor de terceiro, do bem adquirido pela recorrida, causando a esta o prejuízo.5. Recurso especial conhecido e desprovido.
Leia o acórdão no REsp 2.043.325.