Overbooking: Empresa de ônibus terá de indenizar casal que viajou em local destinado ao descanso de motoristas

Em decisão da 3a. Turma Recursal dos Juizados Especiais do DF, a Buser Brasil Tecnologia foi condenada a indenizar  um casal que comprou passagens de ônibus por meio da plataforma e foi vítima de overbooking. Com isso, a viagem de Brasília ao Rio de Janeiro foi realizada no compartimento destinado ao descanso do motorista. O colegiado acatou as razões dos passageiros e majorou o valor da indenização, tendo em vista os transtornos e a exposição sofridos.

Os autores contam que a falha na prestação do serviço já começou no embarque, com atraso de mais de três horas, no trecho de ida, bem como alteração dos assentos de leito para semileito. Narram que, em seguida, passou-se à marcação dos assentos, a qual era realizada no momento do embarque, por ordem de chegada. Nessa ocasião, o motorista verificou que o nome da autora não constava na lista da empresa, razão pela qual consideram caracterizado o overbooking, isto é, a quantidade de passageiros era maior que a capacidade do ônibus.

Munida dos comprovantes de compra das passagens, a consumidora se recusou a deixar o veículo e, por isso, foi vítima de exposição perante os demais passageiros. A alternativa oferecida pela ré foi a de que o casal ocupasse o compartimento de descanso dos motoristas, local pequeno, impossível de se manter de pé e sem ventilação, em plena pandemia. Os autores destacam que um dos motoristas, ao seu lado, teria fumado grande parte da viagem, o que prejudicou ainda mais a respiração de ambos. Por fim, relatam que, no retorno à Brasília, houve novo atraso no embarque.

Ao analisar o recurso, o relator ressaltou que o valor da compensação dos danos morais deve guardar correspondência com o gravame sofrido. Dessa forma, diante das circunstâncias do caso, “forçoso reconhecer que a estimativa originária se mostra insuficiente a fazer frente aos abalos psicológicos”, uma vez que a consumidora foi vítima de exposição externa por parte do motorista, afirmou o juiz.

Além disso, os magistrados consideraram que, em decorrência da venda de bilhetes de passagens além da capacidade do ônibusoverbooking, os passageiros foram impedidos de viajar nos assentos originariamente contratados e se viram “obrigados” a prosseguir viagem em compartimento inadequado.

“Consoante provas colacionadas (fotos e vídeos), o local não dispunha de itens básicos de segurança (cinto de segurança), ventilação adequada e mínimo de conforto para o transporte dos passageiros; ressalta-se que a viagem foi realizada em período de pandemia e que o trajeto entre a origem e o destino final dura mais de 15 horas, fatos que reforçam a inadequação do transporte dos passageiros no referido local”, concluíram os julgadores.

Assim, os danos morais fixados em 1a. instância foram majorados de R$ 1.500 para R$ 2.500, para cada recorrente, estimativa que, na visão da Turma, é suficiente para compensar os dissabores vivenciados, sem proporcionar enriquecimento indevido.

O recurso ficou assim ementado:

CIVIL. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE TERRESTRE. ALTERAÇÃO UNILATERAL DOS BILHETES. “OVERBOOKING”. ACOMODAÇÃO DOS PASSAGEIROS NO COMPARTIMENTO DE DESCANSO DOS MOTORISTAS. DANOS MORAIS: ESTIMATIVA ORIGINÁRIA INSUFICIENTE A FAZER FRENTE AOS ABALOS PSICOLÓGICOS. IMPOSITIVA A MAJORAÇÃO DO “QUANTUM” INDENIZATÓRIO. RECURSO PROVIDO.

 

  1. A matéria devolvida à Turma Recursal pelas partes consumidoras versa tão somente acerca da majoração da estimativa à reparação dos danos morais.
  2. Os recorrentes sustentam, em síntese que: (a) adquiriram passagens de ônibus (trecho BSB/RJ/BSB) com previsão de embarque em 12.02.2021, às 20h00; (b) teria ocorrido atraso superior a três horas no trecho de ida, bem como alteração dos assentos de leito para semileito; (c) a marcação de assentos era realizada no momento do embarque, por ordem de chegada; (d) no momento do embarque o motorista passou a verificar os nomes dos passageiros contidos na lista da empresa e para a surpresa da primeira requerente seu nome não constava na lista; (e) teriam sido vítimas de overbooking, vez que a quantidade de passageiros seria maior que a capacidade do ônibus; (f) em razão de estar munida de todos os comprovantes de aquisição das passagens, a consumidora teria se negado a se retirar do ônibus, motivo pelo qual teria iniciado uma confusão generalizada e exposição da passageira perante os demais viajantes; (g) teria sido oferecida como única alternativa para que os requerentes pudessem seguir viagem que ocupassem o compartimento de descanso dos motoristas; (h) a viagem foi realizada no referido compartimento, local pequeno, impossível de se manter de pé, sem ventilação em plena pandemia e com um dos motoristas fumando o que teria prejudicado ainda mais a respiração; (i) teria ocorrido novo atraso na viagem de retorno.

III. O valor da compensação dos danos morais deve guardar correspondência com o gravame sofrido (CC, art. 944), além de sopesar as circunstâncias do fato, a capacidade econômica das partes, a extensão e a gravidade do dano, bem como o caráter pedagógico da medida.

  1. Assim, diante das circunstâncias do caso concreto, forçoso reconhecer que a estimativa originária se mostra insuficiente a fazer frente aos abalos psicológicos, porque: (a) ainda que a consumidora estivesse munida dos comprovantes de aquisição das passagens, o motorista teria afirmado que o “ônibus só partiria após sua saída” e que os passageiros ao verem todo a situação também passaram a exigir que a requerente se retirasse do ônibus, pois queriam prosseguir com a viagem (exposição externa); (b) em decorrência da venda de bilhetes de passagens além da capacidade do ônibus (“overbooking”), os passageiros foram impedidos de se utilizarem dos assentos originariamente contratados e se viram “obrigados” a prosseguir viagem em compartimento próprio para descanso de motoristas; (c) consoante provas colacionadas (fotos e vídeos – ID. 31172770/31172774), o local não dispunha de itens básicos de segurança (cinto de segurança), ventilação adequada e mínimo de conforto para o transporte dos passageiros; (d) ressalta-se que a viagem foi realizada em período de pandemia (“COVID-19”) e que o trajeto entre a origem e o destino final dura mais de 15 horas, fatos que reforçam a inadequação do transporte dos passageiros no referido local.

  2. Desse modo, urge a majoração do quantum compensatório pelos danos extrapatrimoniais (de R$ 1.500,00 para R$ 2.500,00 para cada recorrente), estimativa suficiente a compensar os dissabores vivenciados, e sem proporcionar enriquecimento indevido. Não se adota a estimativa da inicial (R$ 20.000,00), à míngua de demonstração de que os fatos tenham trazido consequências mais gravosas e duradouras aos requerentes. Precedente, TJDFT: 3ª Turma Recursal, acórdão DJE: 30/11/2018.

  3. Recurso conhecido e provido. Majorada a compensação por danos morais para R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) para cada recorrente. No mais, sentença confirmada por seus próprios fundamentos. Sem condenação em custas processuais nem honorários advocatícios, ante ausência de recorrente integralmente vencido (Lei 9.099/95, art. 55).

A decisão foi unânime.

Acesse o PJe2 e confira o processo: 0721830-29.2021.8.07.0016

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