Órgão Especial do TJSC garante proteção da bacia do rio Cubatão na Grande Florianópolis

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça, em sessão nesta semana, julgou improcedente ação direta de inconstitucionalidade (Adin) proposta pela Associação de Mineradores da Areia da Bacia do Cubatão em face da Lei Municipal 2.273/2013, de Santo Amaro da Imperatriz, que proibiu o uso de desagregadores (maracas) em sua área territorial.

Utilizadas na exploração mineral, as maracas são coroas rotativas localizadas nas extremidades de pontos de sucção, responsáveis por cortar e desagregar fundos de rios e lagoas que estão sedimentados ou compactados e que já não respondem mais aos tratamentos com sistemas convencionais de bombas de injeção.

Os mineradores, na ação, alegam que a proibição praticamente impede o trabalho por eles desenvolvido, com sérios reflexos sobre a cadeia de produtividade, a atividade empresarial e a livre iniciativa. Sustentam que há inconstitucionalidade formal e material na Lei 2.273, pois não caberia ao município legislar sobre recursos minerais, competência exclusiva da União.

Os argumentos não convenceram o desembargador Júlio César Ferreira de Melo, relator da Adin. Segundo seu entendimento, acompanhado de forma unânime pelos demais integrantes do Órgão Especial, a lei em questão trata da proteção ao meio ambiente no interesse predominantemente local de preservação do rio Cubatão Sul, fonte de recursos hídricos que corta a cidade de Santo Amaro da Imperatriz e abastece boa parte dos municípios da Grande Florianópolis.

Além disso, acrescenta, está em harmonia com as normas dos demais entes federados, sem qualquer choque com a legislação estadual ou federal. O desembargador Júlio César, por fim, comentou o embate entre o capital e o meio ambiente presente na questão de fundo da matéria.

“Eventual comprometimento dos interesses empresariais (…) se mostra diminuto quando comparado aos significativos prejuízos ambientais causados pelo uso dos desagregadores na extração de areias do rio Cubatão. (…) A ordem econômica (…) deve observar, entre outros princípios, a defesa do meio ambiente”, anotou na ementa.

O recurso ficou assim ementado:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, AJUIZADA PELA ASSOCIAÇÃO DE MINERADORES DA AREIA DA BACIA DO CUBATÃO (AMABC), EM FACE DA LEI MUNICIPAL N. 2.273/2013, QUE PROÍBE A UTILIZAÇÃO DE DESAGREGADORES (MARACAS) NA BASE TERRITORIAL DE SANTO AMARO DA IMPERATRIZ.

ALEGADA INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL. TESE NO SENTIDO DE QUE A NORMA NÃO TRATA DE ASSUNTO LOCAL, TAMPOUCO SUPLEMENTA AS LEGISLAÇÕES ESTADUAL E FEDERAL, SENDO COMPETÊNCIA DA UNIÃO LEGISLAR SOBRE RECURSOS MINERAIS. ALEGADA OFENSA, ADEMAIS, AO PRINCÍPIO DA LIVRE INICIATIVA, AO ARGUMENTO DE QUE A PROIBIÇÃO TORNA INVIÁVEL A ATIVIDADE NA REGIÃO.

NÃO ACOLHIMENTO. LEI MUNICIPAL QUE: (A) TRATA DA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE [ESPECIFICAMENTE DO RIO CUBATÃO SUL]; (B) NO INTERESSE PREDOMINANTEMENTE LOCAL [RIO QUE CORTA A CIDADE, SENDO IMPORTANTE FONTE DE RECURSOS HÍDRICOS, BEM COMO RELEVANTE AO TURISMO LOCAL] E (C) ESTÁ EM HARMONIA COM AS NORMAS DOS DEMAIS ENTES FEDERADOS [NÃO DEMONSTRADAS CONTRARIEDADES COM LEIS FEDERAIS OU ESTADUAIS] – MATÉRIA QUE, CONFORME ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STF NO JULGAMENTO DO RE N° 586224, COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA (TEMA 145), INSERE-SE NA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA MUNICIPAL.

ADEMAIS, EVENTUAL COMPROMETIMENTO DOS INTERESSES EMPRESARIAIS QUE SE MOSTRA DIMINUTO QUANDO COMPARADO AOS SIGNIFICATIVOS PREJUÍZOS AMBIENTAIS CAUSADOS PELO USO DE DESAGREGADORES NA EXTRAÇÃO DE AREIA DO RIO CUBATÃO SUL. DANOS QUE TRANSCENDEM O MUNICÍPIO, REPERCUTINDO NO ABASTECIMENTO DE ÁGUA DE TODA A GRANDE FLORIANÓPOLIS, CONFORME LAUDOS PERICIAIS ACOSTADOS AOS AUTOS. ORDEM ECONÔMICA QUE DEVE OBSERVAR, ENTRE OUTROS PRINCÍPIOS, A DEFESA DO MEIO AMBIENTE, INCLUSIVE MEDIANTE TRATAMENTO DIFERENCIADO CONFORME O IMPACTO DOS PROCESSOS EMPREGADOS. ALÉM DISSO: DIREITO DE TODOS AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO E DEVER DO PODER PÚBLICO DE PROTEGER A FAUNA E A FLORA, VEDADAS, NA FORMA DA LEI, PRÁTICAS QUE COLOQUEM EM RISCO SUA FUNÇÃO ECOLÓGICA – CONSOANTE REDAÇÃO DO ART. 170, V, E ART. 225, § 1º, VII, DA CF, SIMETRICAMENTE DISPOSTOS NOS ARTS. 134, 181 E 182, III, DA CESC. EM MESMO SENTIDO, SEGUE A JURISPRUDÊNCIA DO STF (ADI 3540, DJE 03-02-2006).

INCONSTITUCIONALIDADES ALEGADAS NÃO VERIFICADAS. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

  1. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DOS MUNICÍPIOS EM MATÉRIA AMBIENTAL. O Supremo Tribunal Federal, em 2015, fixou a tese n° 145, com repercussão geral reconhecida, no sentido de que: “O município é competente para legislar sobre o meio ambiente com a União e o Estado, no limite do seu interesse local e desde que tal regramento seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI, c/c 30, I e II, da Constituição Federal)”. Ademais, valendo-se do conceito de Hely Lopes Meireles, definiu que o assunto de interesse local: “se caracteriza pela predominância e não pela exclusividade do interesse para o município, em relação ao do Estado e da União. Isso porque não há assunto municipal que não seja reflexamente de interesse estadual e nacional. A diferença é apenas de grau, e não de substância” (RE 586224, Relator:  Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, Dje 08-05-2015).

2. PROTEÇÃO AMBIENTAL E LIVRE INICIATIVA. Além disso, consoante decidido pelo Supremo Tribunal Federal: “A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a “defesa do meio ambiente” (CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral. Doutrina. Os instrumentos jurídicos de caráter legal e de natureza constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente, para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são inerentes, o que provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança, cultura, trabalho e bem-estar da população, além de causar graves danos ecológicos ao patrimônio ambiental, considerado este em seu aspecto físico ou natural (CF, art. 225, § 1º, III)” (ADI 3540 MC, Relator:  Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJe 03-02-2006).

Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 9172760-02.2013.8.24.0000

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