O crime de organização criminosa não é admitido como antecedente da lavagem de dinheiro nos fatos ocorridos antes da Lei 12.850/13, já que até então não havia tipificação para aquele delito.
Com base nesse entendimento, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) absolveu, por atipicidade da conduta, um homem acusado de lavagem de dinheiro, já que a prática foi descrita como consequência das ações de organização criminosa, em fatos consumados antes da Lei 12.850/13, que estabeleceu o conceito de organização criminosa.
O relator do caso, ministro Ribeiro Dantas, explicou que a lei vigente à época dos fatos trazia rol exaustivo de quais práticas eram consideradas crimes antecedentes à lavagem de dinheiro. O ministro destacou que a lei sobre os crimes de lavagem foi modificada para ampliar o conceito somente em 2012, após a ocorrência dos fatos.
“Conquanto o advento da Lei 12.683/12 tenha afastado o rol exaustivo dos crimes-base previsto na redação original da Lei 9.613/98, tendo passado a admitir que bens, valores ou direitos oriundos de qualquer crime ou contravenção penal possam ser objeto de lavagem de dinheiro, não se revela possível aplicar tal entendimento, por ser ele mais gravoso ao réu, a atos de branqueamento perpetrados antes da sua entrada em vigor”, declarou o ministro.
Ribeiro Dantas disse que, por se tratar de crime acessório, derivado ou parasitário, o crime de lavagem de dinheiro pressupõe a existência de infração anterior, que constitui uma circunstância elementar da lavagem.
Absolvição
A atipicidade da conduta impõe a absolvição referente à lavagem de dinheiro, segundo o ministro.
“A teor da jurisprudência desta corte, dada a ausência de definição jurídica à época dos fatos, a qual somente foi inserida no ordenamento jurídico pela Lei 12.850/13, o crime praticado por organização criminosa não era admitido como antecedente da lavagem de dinheiro”, disse Ribeiro Dantas.
O relator explicou que, mesmo que se considere que os membros da organização criminosa foram condenados com base no artigo 288 do Código Penal, é preciso reconhecer que tal delito não estava elencado entre os crimes antecedentes previstos na redação anterior da Lei 9.613/98.
Segundo o ministro, o ato de lavagem de dinheiro atribuído ao réu – auxílio na ocultação da compra de aeronave por meio de contrato de leasing envolvendo o líder da associação criminosa – foi perpetrado antes da entrada em vigor da lei definidora do crime de organização criminosa, “restando demonstrada a atipicidade da conduta”.
O recurso ficou assim ementado:
PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO. LAVAGEM DE DINHEIRO. ATIPICIDADE. ROL EXAUSTIVO ANTERIOR À ENTRADA EM VIGOR DA LEI 12.683/2012. INEXISTÊNCIA DE DEFINIÇÃO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA À ÉPOCA DOS FATOS. FLAGRANTE ILEGALIDADE. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado.
2. Caso reste evidenciada, de plano, a atipicidade da conduta, sendo despiciendo revalorar as provas produzidas no curso da persecução penal, admite-se a absolvição do réu, mesmo em sede de habeas corpus. Precedentes.
3. Nos dizeres José Paulo Baltazar Júnior, “a lavagem de dinheiro pode ser conceituada como atividade de desvinculação ou afastamento do dinheiro da sua origem ilícita para que possa ser aproveitado” (BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Crimes Federais. 10ª ed., rev., atual.
e ampl. , São Paulo: Saraiva, 2015, p. 1088).
4. Por se tratar de crime acessório, derivado ou parasitário, o crime de lavagem de dinheiro pressupõe a existência infração anterior, que constitui uma circunstância elementar do tipo de lavagem.
5. Conquanto o advento da Lei n. 12.683/2012 tenha afastado o rol exaustivo dos crimes-base previsto na redação original da Lei n. 9.613/1998, tendo passado a admitir que bens, valores ou direitos oriundos de qualquer crime ou contravenção penal possam ser objeto de lavagem de dinheiro, não se revela possível aplicar tal entendimento, por ser ele mais gravoso ao réu, a atos de branqueamento perpetrados antes da sua entrada em vigor.
6. A teor da jurisprudência desta Corte, dada a ausência de definição jurídica à época dos fatos, a qual somente foi inserida no ordenamento jurídico pela Lei n. 12.850/2013, o crime praticado por organização criminosa não era admitido como antecedente da lavagem de dinheiro, restando evidenciada, por consectário, a atipicidade da conduta descrita na denúncia.
7. Mesmo que se reconheça que os membros da organização criminosa foram condenados por incursos nas sanções do art. 288 do CP, forçoso reconhecer que tal delito não estava elencado entre os crimes antecedentes previstos na redação anterior do art. 1º da Lei n. 9.613/1998, considerando que o ato de lavagem de dinheiro, qual seja, o auxílio prestado pelo réu na ocultação da compra de aeronave através de contrato de leasing envolvendo o líder da associação criminosa, foi perpetrado antes da entrada em vigor da Lei n. 12.694/2012.
8. Writ não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para absolver o paciente quanto à prática do crime de lavagem de dinheiro, com fulcro no art. 386, III, do CPP.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): HC 378449