Cada estabelecimento industrial da mesma pessoa jurídica é considerado um contribuinte e sujeito passivo autônomo, o que impede a transferência de créditos do Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI). Com esse entendimento, a Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou provimento à apelação de uma empresa fabricante de automóveis que buscava transferir a outros estabelecimentos que lhe pertencem os créditos acumulados ou que viriam a se acumular, para posterior aproveitamento.
A impetrante questionou a impossibilidade de aproveitamento de créditos do IPI relativos à determinada parcela da matéria-prima adquirida e que é remetida para a montagem de veículos em seu estabelecimento industrial na Argentina. Na operação denominada “operação integrada”, os produtos utilizados como insumos, que saem da filial para o abrigo, são imunes à incidência do IPI destinados ao exterior. Logo, como não ocorre débito de IPI na exportação de matéria-prima, o valor do tributo pago na aquisição que a apelante considera passível de creditamento em sua escrituração somente poderia ser compensado como operações de saídas tributadas.
O relator, juiz federal convocado Henrique Gouveia da Cunha, destacou que, segundo o art. 49 do Código Tributário Nacional (CTN), “o imposto é não cumulativo, dispondo a lei de forma que o montante devido resulte da diferença a maior, em determinado período, entre o imposto referente aos produtos saídos do estabelecimento e o pago relativamente aos produtos nele entrados”.
Destacou ainda o magistrado que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), ao avaliar o tema do direito ao creditamento do IPI pago na aquisição de insumos ou matérias primas tributados e utilizados na industrialização de produtos, cuja saída do estabelecimento industrial é isenta ou sujeita à alíquota zero, é no sentido de que o regime constitucional do IPI determina a compensação do que for devido em cada operação com o montante cobrado nas operações anteriores, este, o princípio da não cumulatividade, não aperfeiçoada quando não houver produto onerado na saída, pois o ciclo não se completa.
Em relação ao saldo credor de IPI acumulado, a legislação de regência do imposto não prevê, e, portanto não permite o direito à utilização dos créditos pelo estabelecimento filial. Somente o saldo credor acumulado, em cada trimestre, decorrente de aquisição de matéria prima, poderá ser utilizado e ser objeto de ressarcimento ou compensação.
Segundo o magistrado, o estabelecimento da apelante, situado na Argentina, não realiza operação que resulte em produto tributado pelo IPI no Brasil, e, nem está sujeito ao pagamento do tributo, logo a remessa dos bens de produção a ele destinados não permite equiparação opcional.
O recurso ficou assim ementado:
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. IPI. REMESSA PELA FILIAL DA IMPETRANTE DE MATÉRIA-PRIMA AO ABRIGO DE IMUNIDADE PARA O ESTABELECIMENTO DA EMPRESA LOCALIZADO NO EXTERIOR (ARGENTINA). SALDO CREDOR. APROVEITAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. BENEFÍCIO FISCAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 11 DA LEI 9.779/99, E DOS ARTS. 11, I, E 256 DO RIPI.
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O inconformismo da impetrante reside na impossibilidade de aproveitamento de créditos de IPI, relativos a determinada parcela da matéria-prima por ela adquirida e que é remetida para a montagem de veículos em seu estabelecimento industrial localizado na Argentina, no âmbito da denominada operação integrada com a linha de produção situada no referido país.
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No âmbito dessas operações específicas, os produtos utilizados como insumos saem da filial (equiparada a estabelecimento industrial por opção) ao abrigo da imunidade tributária prevista no art. 153, §3º, inciso III, da CF/1988. O art. 18, inciso II, do RIPI reproduz a hipótese de imunidade prevista no art. 153, §3º, III, da CF/1988, ao dispor que são imunes à incidência do imposto os produtos industrializados destinados ao exterior.
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Portanto, não ocorrendo débito de IPI na exportação da matéria-prima remetida ao exterior no âmbito da aludida operação integrada, o valor do tributo pago na aquisição – que a Apelante considera passível de creditamento em sua escrituração, por força da opção de equiparação a estabelecimento industrial – somente poderia ser compensado, na sistemática de apuração do imposto, com os valores dos débitos referentes às operações de saídas tributadas.
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Em relação ao saldo credor de IPI acumulado – que a impetrante sustenta o direito ao aproveitamento, valendo-se da equiparação a estabelecimento industrial por opção -, a legislação de regência do imposto não prevê – e, portanto, não permite – o direito à utilização dos créditos de IPI pelo estabelecimento filial (equiparado a industrial por opção), conforme dispõe o art. 256 do RIPI.
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Não há autorização na legislação tributária para que os créditos de IPI escriturados pela filial da impetrante, no âmbito da denominada operação integrada, sejam transferidos a outro estabelecimento da mesma pessoa jurídica, nem objeto de ressarcimento ou compensação, uma vez que, no âmbito da referida operação – caracterizada pela remessa de matéria prima ao exterior, sem industrialização no Brasil – a filial não se equipara a estabelecimento industrial, nem se enquadra como contribuinte do IPI, nos termos da legislação do imposto.
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Embora a legislação do IPI permita que empresas comerciais se equiparem, opcionalmente, a estabelecimento industrial, quando realizarem a saída de bens de produção adquiridos de terceiros para outros estabelecimentos industriais, a operação realizada pela filial da impetrante, consistente na destinação das matérias-primas (insumos) ao exterior, não se ajusta à hipótese prevista no art. 11, inciso I do RIPI, uma vez que a empresa estrangeira destinatária dos insumos não pode ser considerada estabelecimento industrial, para fins da mesma legislação, considerando-se como tal aquele que “…executa qualquer das operações referidas no art. 4º, de que resulte produto tributado, ainda que de alíquota zero ou isento”, nos termos do art. 8º do citado RIPI.
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De igual forma, não ampara a pretensão inicial o fato de o art. 11, inciso I, do RIPI, conferir o direito à equiparação a estabelecimento industrial, por opção, em favor daquele que der saída a bens de produção também para estabelecimentos revendedores, haja vista que o estabelecimento destinatário, localizado no exterior (Argentina), não realiza a mera revenda das matérias-primas ou insumos, operando no âmbito da linha de montagem e fabricação dos produtos (veículos), conforme reconhece a própria impetrante.
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A equiparação opcional do estabelecimento da filial da impetrante a estabelecimento industrial, para a finalidade por ela pretendida, não encontra, sob qualquer ângulo, permissivo na regra do art. 11, inciso I, do RIPI, porquanto a empresa estrangeira destinatária dos insumos não pode ser considerada estabelecimento industrial – por não executar qualquer das operações referidas no art. 4º, de que resulte produto tributado, ainda que de alíquota zero ou isento, nos termos do art. 8º do citado RIPI -, tampouco pode ser considerada como mero revendedor, para fins da legislação do IPI.
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A Lei 9.779/1999 (art. 11) e os arts. 11, I, e 256, §2º, do RIPI, não contemplam a possibilidade de aproveitamento de crédito na hipótese em que a filial da impetrante remete matéria-prima (insumos) para industrialização no exterior, razão pela qual, em cumprimento aos termos do art. 150, § 6º, da CF/1988, ao princípio da legalidade tributária, considerando o fato de que o crédito assume, neste caso, contornos de nítido benefício fiscal, o direito pleiteado pela impetrante não pode ser reconhecido.
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Para fins tributários, cada estabelecimento industrial (ou, ainda, o estabelecimento comercial equiparado a industrial) da mesma pessoa jurídica é considerado um contribuinte autônomo e, de igual modo, sujeito passivo autônomo, nos termos do art. 51, parágrafo único, do CTN, e art. 9º do Decreto nº 2.637/1998, circunstância que impede a transferência de créditos pretendida. Precedentes.
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Apelação a que se nega provimento.
A decisão foi unânime.
Processo nº: 0000112-30.2012.4.01.3800