Morte presumida de ex-militar gera direito somente à pensão com exclusão de outros benefícios

A esposa e os filhos de ex-militar da Marinha excluído do serviço ativo não têm direito de permanecer vinculados ao Fundo de Saúde da Marinha (Fusma), assim decidiu a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).

A decisão deu provimento ao recurso de apelação da União, que sustentou a legalidade do ato administrativo que excluiu a pensionista e os filhos do Fusma porque o militar, instituidor da pensão, perdeu o vínculo com a Marinha do Brasil ao ser excluído.

O relator, desembargador federal Morais da Rocha, explicou que se trata da figura conhecida como “morte ficta” – ou presumida, quando o militar excluído ou expulso é considerado falecido. De acordo com a legislação, a família faz jus ao recebimento de pensionamento como se o militar estivesse morto.

Destacou o magistrado que com a expulsão o vínculo existente entre o militar e as Forças Armadas é desfeito. O objetivo da lei é amparar os herdeiros daquele que foi expulso. Porém, no caso de “morte ficta” outros benefícios vinculados às Forças Armadas são cortados, permanecendo apenas o direito ao pensionamento.

O desembargador afirmou que a viúva foi habilitada a perceber pensão militar e que não deveria ter sido incluída como dependente do Fusma em razão da legislação em vigor que dispunha sobre proventos e outras vantagens militares.

Não há direito adquirido – No caso, um dos filhos, menor de idade na época, era paciente de leucemia linfoblástica, e o Manual do Usuário do Sistema de Saúde da Marinha previa a possibilidade de continuidade do tratamento médico para dependentes portadores de doenças crônicas, até mesmo em razão do princípio da dignidade humana. Todavia, verificou o magistrado, consta dos autos atestado que ele se encontrava em remissão completa da doença e não há notícia de recidiva, razão pela qual não se aplica a exceção prevista no manual.

“Assim, a parte autora usufruiu por 10 anos os serviços de assistência médica militar à margem da lei em vigor. Entretanto, ressalte-se que cabe à Administração rever, a qualquer tempo, seus atos, quando eivados de vícios e ilegalidades, conforme o disposto na Súmula 473/STF, o que afasta a ilegalidade do ato administrativo que excluiu a parte autora do Fusma”, não havendo, no caso, direito adquirido, concluiu o relator.

O recurso ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. MILITAR. ESPOSA PENSIONISTA. MORTE FICTA/MORS OMNIA SOLVIT.  ART. 20 DA LEI N. 3.765/60. ASSISTÊNCIA MÉDICO HOSPITALAR. REINCLUSÃO. DESCABIMENTO. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PERSISTÊNCIA DA DOENÇA CRÔNICA DO DEPENDENTE. EXCLUSÃO DO FUSMA.

1. A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC. Remessa necessária não conhecida.

2. Pleiteia a parte autora a anulação do ato de exclusão do Fundo de Saúde da Marinha (FUSMA), mantendo a sua condição de beneficiária titular com todos os direitos a ela inerentes.

3. O instituidor da pensão militar foi expulso a bem da disciplina das fileiras da Marinha do Brasil, em 2004 e a autora, cônjuge do ex militar, passou a perceber pensão militar de acordo com o art. 20, parágrafo único, da Lei nº 3.765/60.

4. A exegese conferida à Lei nº 3.765/1960 resultou em constituição de direitos, impondo-se a prevalência da presunção de que o pagamento de pensão a militar expulso da corporação, a bem da disciplina, esteja incorporado ao patrimônio jurídico dos respectivos beneficiados. A morte ficta ou “mors omnia solvit” – equiparação do militar excluído ou expulso, ambos considerados falecidos – era a retribuição do Estado pela rígida hierarquia, disciplina e risco a que se achavam submetidos “propter officium”.

5. A dependência prevista no Estatuto dos Militares e o benefício da pensão militar, previsto na Lei nº 3.765/60, são institutos diversos com regras próprias. Com a expulsão do militar, a bem da disciplina, rompe-se o vínculo existente entre ele e as Forças Armadas, já que passou a condição de ex militar. A lei 3.765/60 visava amparar os herdeiros daquele que foi expulso, concedendo, apenas e tão somente, pensão militar, por simples força da lei, muito embora o ex militar esteja vivo e possa, ainda, prover meios de sustento à família. Outros benefícios advindos do vínculo com as Forças Armadas, tais como acesso ao fundo de saúde, são cessados à míngua de previsão legal, nos casos de “morte ficta” ou “mors omnia solvit”.

6. Uma vez que a parte autora foi habilitada a perceber pensão militar, nos termos da Lei n. 3.765/60, não deveria ter sido incluída como dependente do FUSMA. A parte autora gozou por 10 anos, os serviços de assistência médica militar, à margem da lei em vigor. Entretanto, cabe à Administração rever, a qualquer tempo, seus atos, quando eivados de vícios e ilegalidades, à teor do que dispõe a SÚMULA 473/STF, o que afasta a ilegalidade do ato administrativo que excluiu a parte autora do FUSMA. Verificando-se a irregularidade no benefício fruído pela autora e, ante a inexistência de direito adquirido, a Administração, no exercício do poder de autotutela, deixou de promover o desconto referente ao FUSMA, a partir de 2014.

7. A legislação de regência afasta a pretensão da autora, SIMONE REIS OLIVEIRA e dos dependentes WILLIAN REIS OLIVEIRA e THIAGO REIS OLIVEIRA, tanto mais, porque, estes últimos, já superaram o limite etário de 24 anos, e não seriam caracterizados como dependentes em nenhuma circunstância, ainda que o caso dos autos se tratasse de hipótese de aplicação da Lei n. 6.880/80,

8. Em razão do princípio da dignidade humana, ainda que se considerasse a hipótese de aplicação da Lei n. 6.880/80, tem-se que, quanto ao autor HENRIQUE REIS OLIVEIRA, menor à época dos fatos e, também à época, portador leucemia linfoblástica, o laudo de fl. 40, emitido em 10.06.2013, atestou que ele se encontrava em remissão completa da doença. Após transcorridos 10 anos, não há notícias, nos autos, de recidiva da doença, razão pela qual, não restam elementos probatórios de que o referido autor se inclua dentre as excepcionalidades previstas pela Marinha do Brasil, para continuidade de tratamento, devendo assim, ser reformada in totum a sentença a quo.

9. Parte autora condenada ao pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (artigo 85, §§2º e 3º, do CPC), suspensa em razão da gratuidade da justiça deferida à fl. 53.

10. Apelação da União provida. Sentença reformada.

Por unanimidade, o Colegiado deu provimento à apelação da União.

 

Processo: 0014051-63.2014.4.01.3200

Deixe uma resposta

Iniciar conversa
Precisa de ajuda?
Olá, como posso ajudar