Mantida decisão que condenou jornalista a indenizar ministro do STF

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) que condenou o jornalista Paulo Henrique Amorim a indenizar em R$ 50 mil o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes por publicação ofensiva veiculada em seu blog Conversa Afiada.

Na ação de reparação por danos morais movida contra o jornalista, Gilmar Mendes sustentou ter sofrido, em julho de 2008, críticas capazes de induzir o leitor a crer que ele seria corrupto e criminoso. Paulo Henrique Amorim publicou em seu blog uma paródia da campanha publicitária de uma empresa de cartão de crédito, na qual qualificou o então presidente do STF como “comparsa” de famoso banqueiro acusado de práticas criminosas.

O TJDF reconheceu a existência de dano moral e o consequente dever de indenizar, tendo em vista que o jornalista extrapolou os limites do exercício do direito de informação ao se referir ao magistrado com o intuito de depreciar sua imagem.

No recurso ao STJ, Paulo Henrique Amorim alegou que não houve dano moral indenizável e que o valor da indenização implicaria enriquecimento sem causa da outra parte. Segundo a defesa, o jornalista exerceu o direito de expressão sem intuito de ofender.

Liberdade não é absoluta

Em seu voto, o relator do recurso, ministro Marco Buzzi, ressaltou que a liberdade de informação e de comunicação não é absoluta e deve ser apoiada em fatos verdadeiros objetivamente apurados. Disse que seu exercício deve observar os parâmetros estabelecidos na Constituição Federal.

Segundo o relator, o interesse social inerente ao direito de informação não exime o jornalista de pautar-se pela verdade. Para ele, esse dever foi violado quando o jornalista veiculou em seu blog texto capaz, por si só, de induzir o leitor a acreditar que o então presidente do STF seria “comparsa” de um banqueiro acusado de condutas criminosas, sem elementos fidedignos aptos a justificar tal acusação.

Citando doutrina e precedentes, o relator entendeu que a publicação extrapolou os limites meramente informativos e opinativos do ofício jornalístico, acarretando ofensa à honra e à imagem da vítima e “passando a ideia de que o ‘jeitinho brasileiro’ e a corrupção alcançam indistintamente todos os órgãos e poderes, servidores públicos e profissionais de carreira de estado, incluído aí o guardião da Constituição ora litigante”.

Em relação à indenização, Marco Buzzi considerou que o valor foi fixado com moderação, razoabilidade e bom senso, atendendo às peculiaridades do caso.

“Para modificar as conclusões consignadas no acórdão impugnado e reputar exagerado o quantum arbitrado, como quer a parte agravante, seria necessário o reexame de provas, o que é vedado pela Súmula 7 do STJ”, concluiu o ministro. A decisão foi unânime.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS – MATÉRIA PUBLICADA EM BLOG NO QUAL O JORNALISTA, FAZENDO USO DE PARÓDIA DE CAMPANHA PUBLICITÁRIA DE UMA CONHECIDA OPERADORA DE CARTÕES DE CRÉDITO, INDUZ O LEITOR A CRER SER O AUTOR AGENTE DE PRÁTICAS CRIMINOSAS EM RAZÃO DE PROXIMIDADE COM BANQUEIRO FLAGRADO NA OPERAÇÃO SATIAGRAHA – JUIZ DE PRIMEIRO GRAU E TRIBUNAL A QUO QUE, COM BASE NOS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO DOS AUTOS E FAZENDO USO DA TÉCNICA DE PONDERAÇÃO DE INTERESSES, AFIRMAM A OCORRÊNCIA DO DANO MORAL E O CONSEQUENTE DEVER DE INDENIZAR – INSURGÊNCIA DO RÉU – RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.
1. Inviável a análise por esta Corte Superior de suposta violação de dispositivos constitucionais, ainda que para fins de prequestionamento, sob pena de usurpação da competência reservada ao Supremo Tribunal Federal, ex vi art. 102, III, da Carta Magna.
2. A liberdade de informação⁄comunicação não é absoluta visto que deve estar calcada na verdade (dados⁄fatos objetivamente apurados),  e o seu exercício há de se dar com a observância do disposto no artigo 5º, incisos  IV, V, X, XIII e XIV da Constituição Federal que estabelece parâmetros ao exercício da liberdade de imprensa.
3. O interesse social inerente ao direito de informação não exime o jornalista de pautar-se pela verdade, dever que restou violado quando, de forma sensacionaIista, fazendo uso de paródia de uma conhecida campanha publicitária de cartão de crédito, veiculou publicação em blog na rede mundial de computadores com palavras e em formato capaz, por si só, de induzir o leitor a acreditar ser o então Presidente do Supremo Tribunal Federal “comparsa” de acusado de condutas criminosas flagrado na Operação Satiagraha conduzida pela Polícia Federal, embora inexistissem elementos fidedignos aptos a justificarem tal acusação.
4. Para o acolhimento do apelo extremo, no sentido de que o post teria sido veiculado a partir de notícias amplamente divulgadas à época e fatos considerados verídicos, seria imprescindível promover o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, o que encontra óbice no enunciado nº 7 da Súmula do STJ.
5. Constitui matéria unicamente de direito examinar a alegação de conter a publicação mera crítica fundada acerca da atuação profissional do autor, sem qualquer intuito de injuriar, pois exige apenas a ponderação⁄valoração jurídica acerca da potencialidade ofensiva da publicação e não o reexame do acervo fático-probatório dos autos.
Publicação que extrapola os limites meramente informativos e opinativos do ofício jornalístico, acarretando ofensa à honra e imagem do autor, pois, em que pese a peculiaridade do instrumento utilizado (blog), considerado pelo réu como “meio de comunicação ágil, moderno, livre, informal e despretensioso” e de se constituir em mídia na qual a informação se dá com “humorismo, comicidade, sarcasmo e frases espirituosas”, a notícia, além de se apresentar como paródia de uma conhecida campanha publicitária de cartão de crédito – inegavelmente utilizada para atrair a atenção do público -, foi veiculada na rede mundial de computadores com palavras e em formato capaz, por si só, de induzir o leitor a acreditar ser o então Presidente do Supremo Tribunal Federal “comparsa” (companheiro, cúmplice, parceiro, co-participante) de atividades criminosas envolvendo banqueiro flagrado na Operação Satiagraha conduzida pela Polícia Federal.
Veiculação que ultrapassa as circunstâncias efetivamente conhecidas acerca dos acontecimentos envolvendo os fatos da referida operação (Satiagraha), passando a ideia de que o “jeitinho brasileiro e a corrupção” alcançam indistintamente a todos os órgãos e poderes, servidores públicos e profissionais de carreira de Estado, incluído aí o guardião da Constituição ora litigante.
6. No que tange ao quantum indenizatório, aplicável o óbice da súmula 7⁄STJ, mormente quando evidenciado que o arbitramento do valor da compensação por danos morais foi realizado com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível sócio-econômico das partes, com razoabilidade, bom senso e com atendimento às peculiaridades do caso.
7. Recurso Especial conhecido em parte e na parte conhecida desprovido.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1500676

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