A ação não trata da relação estatutária dos policiais com o DF.
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho declarou a competência da Justiça do Trabalho para julgar ação civil pública em que se questiona o descumprimento de normas relativas à segurança, à higiene e à saúde na Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF). A competência vinha sendo contestada por envolver o poder público e um policial militar estatutário que havia denunciado ao Ministério Público do Trabalho (MPT) as más condições de trabalho na corporação. Mas, segundo o colegiado, o caso não discute a natureza do vínculo empregatício, mas o cumprimento de normas relativas ao meio ambiente de trabalho.
Denúncia
Segundo a denúncia que motivou a ação civil, policiais do Centro de Suprimento e Manutenção (CSM) eram obrigados a manusear produtos químicos nocivos à saúde na lavagem das viaturas da PMDF, como amianto, querosene, óleo diesel e thinner, sem a utilização de equipamentos de proteção individual (EPIs). O MPT instaurou inquérito civil e confirmou o quadro de irregularidades nas condições de trabalho. Por entender que as condições violavam as normas de higiene e saúde do trabalho, requereu na ação o cumprimento de medidas pelo GDF.
Justiça Comum
O juízo da 9ª Vara do Trabalho de Brasília e o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO) levaram em conta julgamentos do Supremo Tribunal Federal que afastaram a competência da Justiça do Trabalho para o julgamento de causas envolvendo pessoa jurídica de direito público e servidores estatutários. Na decisão, o Tribunal Regional afirma que, embora a apuração de irregularidades envolvendo as condições de trabalho de servidores públicos seja atribuição do MPT, essa atribuição não atrai a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar as controvérsias decorrentes de regime jurídico estatutário.
Competência
No entender do relator do recurso de revista do MPT, ministro Maurício Godinho Delgado, o caso não diz respeito ao tipo de regime, mas às condições do meio ambiente do trabalho. Nesse caso, disse, aplica-se a Súmula 736 do STF, que reconhece a competência a Justiça do Trabalho para julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, à higiene e à saúde dos trabalhadores.
O ministro observou que, no mesmo ambiente de trabalho dos órgãos públicos, convivam pessoas ligadas à administração pública por diferentes vínculos: servidores estatutários, empregados públicos regidos pela CLT, servidores contratados por tempo determinado, prestadores de serviços terceirizados e estagiários. “As condições de trabalho afetam a todos os trabalhadores, indistintamente”, afirmou. “Nesse contexto, seria inviável definir a competência para apreciar ações como esta de acordo com a condição jurídica individual de cada um dentro da administração pública”.
O processo ficou assim ementado:
RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI Nº 13.467/2017. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EM FACE DO DISTRITO FEDERAL. TUTELA DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO. ABRANGÊNCIA DE TODOS OS TRABALHADORES, INCLUSIVE DOS SERVIDORES ESTATUTÁRIOS. MATÉRIA EMINENTEMENTE TRABALHISTA. SÚMULA 736 DO STF. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Nesta fase processual, encontra-se em discussão qual seria o Órgão jurisdicional competente para julgar ação civil pública tendo como objeto a tutela do meio ambiente do trabalho, por meio da qual se busca dar efetividade ao comando do art. 225 da Constituição Federal. A presente ação tem por objeto exigir o cumprimento, pelo Distrito Federal, das normas relativas à higiene, saúde e segurança do trabalho – o que configura direito constitucionalmente assegurado tanto aos trabalhadores regidos pela CLT quanto àqueles submetidos ao regime estatutário, conforme o disposto nos arts. 7º, XXII, e 39, § 3º, da CF. Frise-se que a natureza do vínculo empregatício firmado entre o ente público e o trabalhador, no caso concreto, não tem relevância para alterar a competência para julgar esta lide, haja vista que a tutela do meio ambiente do trabalho deve se dar de forma efetiva e adequada quer se trate de servidor público estatutário, quer envolva empregados celetistas – de modo que o bem jurídico que se busca proteger se encontra diretamente relacionado à competência da Justiça do Trabalho, subsumindo-se às hipóteses previstas no art. 114, I, da Constituição Federal. Ressalte-se ser comum que, no mesmo ambiente laboral dos Órgãos públicos, convivam pessoas ligadas à Administração Pública por diferentes vínculos: servidores públicos estatutários, empregados públicos regidos pela CLT, servidores contratados por tempo determinado (Lei 8.745/93), trabalhadores prestadores de serviços terceirizados e estagiários. Nesse contexto, como as condições de segurança, saúde e higiene de trabalho afetam a todos os trabalhadores indistintamente, seria inviável definir a competência para apreciar ações como esta, tendo como fundamento determinante a condição jurídica individual de cada trabalhador dentro da Administração Pública. Cuida-se, dessarte, de situação distinta da examinada pelo STF na ADI 3.395-6, para a qual a definição da competência jurisdicional decorreu da natureza do regime jurídico: se celetista ou estatutário. Destaque-se, inclusive, que o entendimento jurisprudencial do STF acerca da matéria em discussão demonstra que a limitação de competência imposta à Justiça do Trabalho pela decisão daquela Corte na ADI 3395-6 não alcança as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores. Nessa linha de raciocínio, tem aplicação à hipótese dos autos a Súmula 736 do STF, segundo a qual “Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores“. Portanto, insere-se no âmbito da competência material da Justiça do Trabalho a apreciação e julgamento de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, mediante a qual se formulam pedidos relativos à adequação do meio ambiente de trabalho, em face de ente público, para todos os trabalhadores, independente do vínculo jurídico laboral, inclusive para os servidores estatutários. Julgados desta Corte Superior. Recurso de revista conhecido e provido.
O processo deverá retornar à primeira instância para o exame dos pedidos feitos na ação civil púbica e novo julgamento. A decisão foi unânime.
Processo: RR-2330-22.2012.5.10.0009