A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) homologou parcialmente uma sentença estrangeira arbitral no valor de U$ 2 milhões contra o empresário Carlos Alberto Resende Sobral, por quebra de contrato com a empresa PRNUSA, que revendia joias nos Estados Unidos.
Segundo o processo, Carlos Alberto Sobral produziria joias e bijuterias que seriam comercializadas pela PRNUSA, autora da ação. Após a quebra de contrato, a PRNUSA entrou com pedido de indenização, alegando que ficou sem produtos para revender nos Estados Unidos.
A divisão de recursos da Suprema Corte de Nova York ratificou em 2015 uma sentença arbitral que condenou Carlos Alberto Sobral ao pagamento de U$ 2 milhões pela quebra do contrato firmado com a PRNUSA, sem motivação. A homologação pelo STJ é necessária para que a decisão proferida por órgãos judiciais estrangeiros tenha efeitos em território nacional.
A relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi, afirmou que a sentença estrangeira preencheu os requisitos necessários à homologação, tais como a apresentação da cópia da decisão, da tradução oficial e dos demais documentos exigidos. A ministra destacou ter sido comprovado que a sentença estrangeira foi proferida por autoridade competente e que houve trânsito em julgado.
“Infere-se, igualmente, que a sentença homologanda não representa violação à soberania nacional, à dignidade da pessoa humana ou à ordem pública, o que satisfaz a exigência do artigo 216-F do Regimento Interno do STJ, sobretudo porque o procedimento arbitral versou sobre questões concernentes à relação comercial havida entre as partes em litígio, circunscritas, portanto, à esfera de seus direitos patrimoniais disponíveis”, disse Nancy Andrighi ao analisar os requisitos da homologação.
Questões de mérito
O pedido de homologação da sentença foi contestado por Carlos Alberto Sobral, que, entre outros pontos, alegou não ter havido quebra do acordo operacional ou recusa de remessa de mercadorias que justificassem a condenação.
Quanto aos questionamentos de mérito, a relatora afirmou que tais alegações não são possíveis no âmbito da homologação de sentença estrangeira, já que “não é dado ao STJ, por meio da presente via procedimental, imiscuir-se nessas questões, na medida em que extrapolam os limites estreitos de cognoscibilidade” previstos no Regimento Interno do tribunal.
O pedido de homologação foi extinto sem resolução de mérito em relação à Illusion Acessórios de Modas, já que esta empresa, no entendimento da relatora, não figurou como ré no processo originário perante o juízo de Nova York.
O recurso ficou assim ementado:
HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. SENTENÇA ARBITRAL. LIMITES SUBJETIVOS. EFETIVO EXERCÍCIO DO CONTRADITÓRIO. VERIFICAÇÃO. TEXTO FORMAL DA SENTENÇA. FORMALIDADES. ATENDIMENTO. APOSTILAMENTO. CONVENÇÃO DE HAIA DE 1969. DECRETO 8.660 DE 29/01/2016. DOCUMENTO PÚBLICO. CONCEITO AMPLO. ASSINATURA, SELO E OU CARIMBO. AUTENTICIDADE. COMPROVAÇÃO. JUÍZO DE DELIBAÇÃO. COMPETÊNCIA. STJ. EXAME DE MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE. VALOR DA CAUSA. CONDENAÇÃO IMPOSTA NO ESTRANGEIRO. HONORÁRIOS. DIREITO INTERTEMPORAL. MARCO DEFINIDOR. PROLAÇÃO DA SENTENÇA.
1. O propósito deste julgamento é apreciar pedido de homologação de sentença arbitral estrangeira proferida por Tribunal constituído no Estado de Nova Iorque (Estados Unidos da América), ratificada pela Divisão de Recursos da Suprema Corte de Nova Iorque, por meio da qual os requeridos teriam sido condenados ao pagamento de US$ 2.003.290,33 (dois milhões três mil duzentos e noventa dólares americanos e trinta e três centavos), em virtude da quebra do contrato social entabulado entre as partes.
2. A comprovação do efetivo exercício da defesa pelos requeridos – ou de sua dispensa na forma legal – no processo julgado no exterior é que define dos limites subjetivos da sentença homologanda.
3. Como o juízo do STJ é de mera delibação, a verificação dos limites subjetivos da sentença arbitral estrangeira deve ter em consideração a matéria incorporada ao texto da decisão homologanda, sobretudo quanto às partes e o respetivo exercício do contraditório, a partir do que será verificada a extensão da obrigação apta a se tornar eficaz e exequível no território nacional.
4. Deduz-se dos autos que os requerentes atuaram em nome próprio e na condição de representantes da empresa PRNUSA. LLC., e que somente o réu no processo arbitral – Sr. CARLOS SOBRAL – exerceu amplamente sua defesa e foi condenado ao pagamento da quantia mencionada na sentença homologanda. O processo deve, portanto, ser extinto sem resolução do mérito em relação à requerida ILLUSION ACESSÓRIOS DE MODAS LTDA, por sua manifesta ilegitimidade passiva.
5. Em relação ao requerido CARLOS SOBRAL, foram atendidas as formalidades necessárias à homologação da sentença arbitral estrangeira, pois foi acostada aos autos cópia da decisão homologanda, de conteúdo condenatório, oficialmente traduzida e apostilada, bem como toda documentação essencial para exame do pedido. Verifica-se, igualmente, que a sentença foi proferida por autoridade competente, a referida parte ré foi citada validamente e houve o trânsito em julgado de decisão que não representa violação à soberania nacional, à dignidade da pessoa humana ou à ordem pública.
6. O conceito de documentos públicos, constante no art. 2º da Convenção de Haia de Eliminação da Exigência de Legalização de Documentos Públicos Estrangeiros de 1961 (Decreto 8.660 de 29 de janeiro de 2016), deve ser interpretado de forma ampla e abrangente, para garantir que o maior número possível de documentos se beneficie do processo de autenticação simplificada da Convenção.
7. Na hipótese dos autos, a autenticidade da assinatura, selo ou carimbo oficiais do Estado de origem apostos no documento legal estrangeiro objeto foi comprovada pelo apostilamento, estando, pois, evidenciada a autenticidade e legitimidade da sentença arbitral objeto do pedido de homologação.
8. O valor da causa, em homologação de sentença estrangeira condenatória, é o da condenação por esta imposta. Precedentes.
9. O marco temporal para a aplicação das regras fixadas pelo CPC/2015 em relação aos honorários advocatícios é a data da prolação da sentença. Precedentes.
10. Sentença arbitral estrangeira homologada parcialmente. Processo extinto sem resolução de mérito em relação à requerida ILLUSION ACESSÓRIOS DE MODAS LTDA.
No Agravo Regimental o mesmo ficou assim ementado:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 93, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SUFICIÊNCIA DA FUNDAMENTAÇÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFORMIDADE COM O ENTENDIMENTO DA SUPREMA CORTE EM REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 339/STF. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO, DA AMPLA DEFESA, DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DOS LIMITES DA COISA JULGADA. INEXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 660/STF. INAFASTABILIDADE DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ÓBICE PROCESSUAL INTRANSPONÍVEL. MATÉRIA DE NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL. INEXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 895/STF. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DO MANDADO DE SEGURANÇA. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 318/STF. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Segundo a jurisprudência consolidada do Pretório Excelso, reafirmada no julgamento, sob o regime de repercussão geral, do AI-RG-QO 791.292/PE, a teor do disposto no artigo 93, IX, da Constituição Federal, as decisões judiciais devem ser motivadas, ainda que de forma sucinta, não se exigindo o exame pormenorizado de cada alegação ou prova trazida pelas partes, tampouco que sejam corretos os seus fundamentos (Tema 339/STF).
2. É uníssona a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a questão da suposta afronta aos princípios do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal e dos limites à coisa julgada, se dependente de prévia violação de normas infraconstitucionais, configura ofensa meramente reflexa ao texto constitucional, não tendo repercussão geral (ARE 748.371 RG/MT – Tema 660/STF).
3. Nos termos do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 956.302 RG/GO, a questão da ofensa ao princípio da inafastabilidade de jurisdição, quando há óbice processual intransponível ao exame de mérito, ofensa indireta à Constituição ou análise de matéria fática, tem natureza infraconstitucional, e a ela se atribuem os efeitos da ausência de repercussão geral (Tema 895/STF).
4. Consoante entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do AI 800.074 RG/SP, a matéria relativa aos requisitos de admissibilidade do mandado de segurança não tem repercussão geral, pois “se relaciona com a Constituição Federal apenas de forma mediata, porque as normas processuais atinentes ao seu cabimento são disciplinadas pela Lei n. 12.016/2009” (Tema 318/STF).
5. Agravo regimental não provido.
Leia o acórdão.