A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho decidiu, no julgamento dos embargos da Panpharma Distribuidora de Medicamentos Ltda., de Vitória (ES), que a homologação de acordo extrajudicial de distrato comercial na Justiça Comum não impede o ajuizamento de ação na Justiça do Trabalho. Para a SDI-1, trata-se de pedidos distintos.
O processo é referente à reclamação de uma vendedora que pedia o reconhecimento do vínculo de emprego com a distribuidora. Ela alegava que tinha sido admitida mediante a constituição de uma representação comercial exigida pela empresa, mas que sempre trabalhou de forma subordinada, com pessoalidade, habitualidade e remuneração.
A Panpharma, em sua defesa, afirmou que a prestação de serviços teria ocorrido de acordo com a Lei 4.886/65, que regula as atividades dos representantes comerciais autônomos, com ampla, geral e irrestrita quitação das obrigações eventualmente existentes entre as partes. Outro ponto sustentado foi a existência de acordo homologado pelo juízo da Vara Cível e Ambiental da Comarca de Goiânia (GO), no qual as partes, sem vício de vontade, reconheceram que não havia relação de emprego.
No entendimento da empresa, a homologação teria produzido coisa julgada que inviabilizaria a pretensão formulada na reclamação trabalhista. Assim, antes de ajuizar a reclamação trabalhista, a vendedora deveria ter pedido a rescisão ou a anulação da decisão homologatória, o que não poderia ser feito na Justiça do Trabalho.
A relação de emprego foi reconhecida pelo juízo de primeiro grau e mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (GO) e pela Oitava Turma do TST. Para a Turma, não há identidade entre as duas ações, pois a reclamação trabalhista se refere ao pedido de reconhecimento do vínculo, e o acordo na Justiça Comum diz respeito ao distrato comercial.
Nos embargos à SDI-1, a distribuidora argumentou que a vendedora também figurara como parte na ação de homologação do acordo e que, ainda que assim não fosse, deveria ser aplicada a teoria da identidade da relação jurídica. Segundo a argumentação, embora possa existir distinção entre alguns dos elementos identificadores, as duas demandas tratam da mesma relação de direito material.
O relator dos embargos, ministro Vieira de Mello Filho, destacou que, no acordo homologado na Justiça Comum, a vendedora não figurou como parte, e sim a empresa por ela constituída. Os pedidos também foram distintos, assim como as causas de pedir: a reclamação trabalhista fundamentou-se na CLT, e o acordo na Lei 4.886/65. “Assim, não há que se falar em coisa julgada”, concluiu, lembrando ainda que a Justiça Comum e a Justiça do Trabalho têm competências distintas.
O recurso ficou assim ementado:
A) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. 1. NULIDADE DO JULGADO POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. 2. NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA. 3. NULIDADE DA SENTENÇA. CONTRADITA DE TESTEMUNHA DA RECLAMADA.
4. NULIDADE DA SENTENÇA. CONTRADITA DE TESTEMUNHA DA RECLAMANTE. 5. INOVAÇÃO RECURSAL. 6. RITO PROCESSUAL. 7. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. 8. PRINCÍPIO DA IMEDIATIDADE. 9. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. 10. MULTA DO ARTIGO 477 DA CLT. RECONHECIMENTO DO VÍNCULO DE EMPREGO EM JUÍZO. DENEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO DE REVISTA COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 896, § 1º-A, I, DA CLT. INDICAÇÃO DO TRECHO DA DECISÃO RECORRIDA QUE CONSUBSTANCIA O PREQUESTIONAMENTO DA CONTROVÉRSIA OBJETO DO RECURSO DE REVISTA. Nega-se provimento a agravo de instrumento que não consegue infirmar os fundamentos da decisão que denegou seguimento ao recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e não provido. B) RECURSO DE REVISTA. 1. DECISÃO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO DE REVISTA. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. OMISSÃO QUANTO A TEMAS CONSTANTES DA REVISTA. Nos termos da nova sistemática processual estabelecida por esta Corte Superior, considerando o cancelamento da Súmula nº 285 do TST e a edição da Instrução Normativa nº 40 do TST, na hipótese de omissão pelo juízo de admissibilidade do recurso de revista quanto a um ou mais temas, era ônus das reclamadas impugná-lo, mediante a oposição de embargos de declaração, a fim de o órgão prolator da decisão suprir a omissão, sob pena de preclusão. Por conseguinte, não tendo sido opostos embargos de declaração pelas reclamadas em relação ao tema não apreciado pela Presidência do Regional (incidente de uniformização de jurisprudência), resta inviabilizada a sua análise, tendo em vista a configuração do instituto da preclusão. 2. INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO ORDINÁRIO. INTERPOSIÇÃO ANTERIOR À PUBLICAÇÃO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA PARTE CONTRÁRIA. Nos termos do atual entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Federal, que ensejou o cancelamento da Súmula nº 434 do TST, não se verifica a extemporaneidade do recurso em razão da sua interposição anterior ao termo inicial. Ademais, antes mesmo do cancelamento da referida súmula, a jurisprudência desta Corte entendia que a oposição de embargos de declaração pela parte adversa não tornava extemporâneo o recurso interposto dentro do prazo recursal. Recurso de revista não conhecido. 3. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE. INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. A jurisprudência deste Tribunal Superior entende que a reiteração dos argumentos iniciais no recurso ordinário, por si só, não deflagra ofensa ao princípio da dialeticidade recursal quando tais fundamentos se mostram suficientes para combater a decisão recorrida. Assim, foi editado o item III da Súmula nº 422 desta Corte. Nessa linha, resta ileso o artigo 514, II e III, do CPC/73 (artigo 1.010, II, III e IV, do CPC/15), tendo em vista que o Regional registrou que a reclamante apresentou em seu recurso fundamentos pelos quais não se conforma com a decisão proferida pelo Juízo de 1º grau, rebatendo as razões nela expostas, bem como a ausência de qualquer dificuldade para a contraposição das reclamadas . Recurso de revista não conhecido. 4. COISA JULGADA. TRANSAÇÃO. FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL . A jurisprudência desta Corte tem se posicionado no sentido de que a transação extrajudicial homologada na Justiça comum não implica em coisa julgada na justiça especializada, notadamente porque é da Justiça do trabalho a competência para examinar a controvérsia acerca da existência ou não do vínculo empregatício. Precedentes. Recurso de revista não conhecido. 5 . PRELIMINAR DE NULIDADE POR SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. Ao contrário do que defendem as reclamadas, a decisão recorrida não implicou em ofensa ao artigo 515, § 3º, do CPC/73 (artigo 1.013, § 3º, do CPC/15) , que consagrou a teoria da causa madura, segundo a qual “resta possibilitada o julgamento do mérito pelo Colegiado ad quem sempre que a questão seja somente de direito ou, sendo de direito e de fato, a causa estiver preparada para esse fim”. Recurso de revista não conhecido. 6. COMPENSAÇÃO. VERBAS RECEBIDAS NA RESCISÃO DO CONTRATO DA REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. POSSIBILIDADE. O recebimento da indenização e aviso prévio citados na decisão recorrida, valores anteriormente recebidos pela reclamante relacionados ao Instrumento Particular de Rescisão e Transação de Contrato de Representação Comercial, concomitantemente com as verbas deferidas na presente reclamação em razão do reconhecimento do vínculo empregatício configuraria verdadeiro bis in idem e enriquecimento sem causa da obreira, consequência repudiada pelo ordenamento jurídico, conforme se depreende da norma inscrita no art. 884 do Código Civil. Recurso de revista conhecido e provido.
Por unanimidade, a SDI-1 negou provimento ao recurso. Após a publicação do acórdão, foram opostos embargos de declaração, ainda não julgados.
Processo: Ag-ED-E-ED-ARR-3020-79.2014.5.17.0011