Primeira Turma assegurou redução de jornada para 20 horas semanais sem exigência de compensação
A Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou o direito de um funcionário público federal, pai de pessoa com deficiência, ao regime de horário especial de trabalho, com redução de jornada de 40 para 20 horas semanais, sem diminuição salarial ou exigências de compensação.
Para o relator do acórdão, desembargador federal Carlos Muta, o artigo 98 da Lei 8.112/1990 prevê horário especial a servidores públicos federais com deficiência. O mesmo direito é aplicável àquele que possua familiar em condição semelhante, sem exigência de compensação de jornada, se comprovada a necessidade por junta médica oficial, de acordo com a Lei 13.370/2016.
“O laudo oficial emitido pelo Subsistema Integrado de Atenção à Saúde do Servidor (SIASS) comprovou que a filha do autor é pessoa com deficiência, acometida de paralisia cerebral (quadriplegia), epilepsia e espectro autista, necessitando de acompanhamento e assistência permanentes”, afirmou o magistrado.
Em primeira instância, a Justiça Federal em Campo Grande/MS havia julgado procedente o pedido do servidor, determinando à União que atendesse ao direito do autor a regime de horário especial de trabalho.
No recurso ao TRF3, o ente federal argumentou que a redução ficava abaixo do limite da jornada mínima de seis horas diárias e 30 semanais fixada no artigo 19 da Lei 8.112/1990.
No entanto, para o relator, a jurisprudência compreende que os parâmetros devem estar contidos nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
“Os autos comprovaram que a filha do servidor tem quadro clínico sensível, com comprometimento global de funções motoras, sensoriais e cognitivas, fazendo uso de cadeira de rodas e necessitando de assistência familiar direta para cuidados de higiene, alimentação, manipulação e transporte. Além disso, participa de consultas médicas regulares, sempre acompanhada do pai, já que a mãe não usufrui de jornada especial de trabalho”, finalizou.
Assim, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação e confirmou o direito do funcionário público federal a regime de horário especial de trabalho de 20 horas semanais, sem diminuição salarial ou exigências de compensação.
O recurso ficou assim ementado:
DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. FILHO. PESSOA COM DEFICIÊNCIA – PCD. LAUDO MÉDICO OFICIAL. REDUÇÃO DE JORNADA. ARTIGO 98, §3º, DA LEI 8.112/1990. 20 HORAS SEMANAIS. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. LEI 13.370/2016. COMPENSAÇÃO. DESNECESSIDADE.
1. Prevê o artigo 98 da Lei 8.112/1990 horário especial para servidores públicos federais portadores de deficiência, direito extensivo ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência, sem exigência de compensação de jornada nos termos da redação dada pela Lei 13.370/2016, desde que comprovada a necessidade por junta médica oficial.
2. Com assinatura, ratificação e promulgação pelo Brasil da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Decreto 6.949/2009), a efetiva proteção de pessoas portadores de deficiência, principalmente crianças (artigo 7º: “Os Estados Partes tomarão todas as medidas necessárias para assegurar às crianças com deficiência o pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, em igualdade de oportunidades com as demais crianças”), ganhou status de direito fundamental, incorporados ao ordenamento jurídico com força de emenda constitucional conforme disciplina do artigo 5º, § 3º, da Lei Maior, na redação dada incluída pela EC 45/2004.
3. A Lei 13.370/2016 veio ao encontro da tutela constitucional às pessoas com deficiência, não mais exigindo a compensação de jornada preconizada no artigo 44, II, da Lei 8.112/1990, seja no tocante ao servidor com deficiência, seja em relação ao servidor que possua cônjuge, filho ou dependente igualmente acometido.
4. No caso, laudo oficial emitido pelo Subsistema Integrado de Atenção a Saúde do Servidor – SIASS comprovou que a filha do autor, servidor da Polícia Federal, é portadora de deficiência, pois acometida de paralisia cerebral (quadriplegia), epilepsia e espectro autista, necessitando de acompanhamento e assistência permanentes do genitor.
5. Em relação à redução abaixo do limite da jornada mínima de seis horas diárias e trinta semanais fixada no artigo 19 da Lei 8.112/1990, as normas aplicáveis à redução de jornada não expressaram inequivocamente o percentual de redução da jornada especial prevista no artigo 98, § 3º do RJU, tendo a jurisprudência firmado compreensão de que deve se ter como vetores, para tal fim, os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
6. Comprovou-se nos autos que a filha do servidor tem quadro clínico sensível, com comprometimento global de funções motoras, sensoriais e cognitivas, fazendo uso de cadeira de rodas e sendo dependente de assistência familiar direta para cuidados de higiene, alimentação, manipulação e transporte. A menor passa por consulta com psicólogo com periodicidade de três vezes por semana, com duração de três horas diárias, com atendimentos na Abordagem Análise do Comportamento Aplicada – ABA; duas vezes por semana faz terapia ocupacional com abordagem neurofuncional- Conceito Bobath associado com a terapia da Integração Sensorial; quatro vezes por semana recebe tratamento de fisioterapia (sessões de 45 minutos); e quatro vezes por semana realiza tratamento fonoterápico. Também participa de consultas regulares com neurologista, endocrinologista e ortopedista pediátricos, sempre acompanhado do pai, considerando que a mãe, Promotora de Justiça do Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, não usufrui de jornada especial de trabalho.
7. Fixada verba honorária pelo trabalho adicional em grau recursal, em observância ao comando e critérios do artigo 85, §§ 2º a 6º, e 11, do Código de Processo Civil.
8. Apelação desprovida.
Apelação Cível 0005144-79.2017.4.03.6000