Financiamento: antes de 2014, é possível purgar a mora pagando prestação em atraso sem quitar todas as prestações a vencer

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça tomou decisão relativa à vigência da Lei 13.043 de 2014, que alterou pontos do arrendamento mercantil, modalidade de financiamento também conhecida como leasing, no que diz respeito à purgação da mora, que é uma obrigação que se toma para sanar o atraso de uma obrigação contratual.

Os ministros entenderam que quem possui contrato de arrendamento anterior à entrada em vigor da lei não é obrigado a quitar todas as prestações do financiamento que ainda vencerão para reaver bem tomado pela financeira em razão de atraso nas prestações.

A decisão foi tomada no julgamento de um caso de automóvel financiado em 60 prestações. Na 24ª parcela, o comprador deixou de pagar, e, em setembro de 2011 (antes da lei), o Santander Leasing entrou na Justiça com uma ação de reintegração de posse para recuperar de volta o carro.

Em um primeiro momento, a Justiça do Paraná, por meio de decisão liminar, determinou que a financeira obtivesse a reintegração do veículo, mas mudou a decisão depois que o devedor comprovou o pagamento, com juros e multa, da parcela em atraso, além do pagamento das custas da ação no Tribunal e dos honorários advocatícios (o que se paga a um advogado em uma ação na Justiça).

A financeira entrou com recurso no STJ alegando que a quitação da dívida só poderia ser reconhecida se todo o financiamento fosse pago. O Satander Leasing usou como base da alegação o artigo 3º, parágrafo 2º, do Decreto- Lei 911/69, que foi alterado pela Lei 10.931/04.

A relatora, ministra Isabel Gallotti, negou o recurso. Segundo ela, o decreto-lei se aplicava apenas aos contratos de alienação fiduciária – outro tipo de financiamento –,  e não a contratos de arrendamento mercantil.

“Entendo que a proibição de purgação da mora introduzida Lei 10.931/2004 na regência dos contratos de alienação fiduciária em garantia é regra de direito excepcional e, portanto, não pode ser aplicada por analogia a outras modalidades de contrato, como o arrendamento mercantil, por maiores que sejam as semelhanças entre os institutos”, disse a ministra.

A Lei 13.043 determina que, no caso de a financeira pegar de volta um bem por falta de pagamento, esse bem só poderá ser devolvido à pessoa que fez o financiamento se ela pagar não apenas as prestações em atraso, mas também as que vencerão.

A ministra lembrou que outra lei, a Lei n. 6.099, que trata de operações de arredamento mercantil, é omissa quando o assunto é a chamada purgação de mora e que a situação só foi regulamentada quando a Lei n. 13.043 entrou em vigor, em 2014. Como o caso julgado aconteceu três anos antes, o pagamento apenas da prestação em atraso teve o efeito de purgar a mora, permitindo a devolução do veículo ao comprador
O recurso ficou assim ementado:
CIVIL. CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL DE VEÍCULO AUTOMOTOR. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. PURGAÇÃO DA MORA ANTERIOR À LEI 13.043⁄2014. ART. 401, I, CÓDIGO CIVIL. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. Jurisprudência consolidada no sentido da possibilidade de purgação da mora do devedor em contrato de arrendamento mercantil, a despeito da ausência de previsão na Lei n. 6.099⁄74, haja vista a regra geral do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor.
2. Impossibilidade de purgação da mora mediante o oferecimento apenas das prestações vencidas, nos contratos de alienação fiduciária em garantia, após a alteração efetuada no art. 3º do Decreto-lei 911⁄69 pela Lei 10.931⁄2004 (REsp. 1418593⁄MS, Recurso Repetitivo, Relator Ministro LUÍS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, DJe 27⁄5⁄2014).
3. A restrição introduzida no art. 3º do Decreto-lei 911⁄69 pela Lei 10.931⁄2004, pertinente ao contrato de financiamento com garantia de alienação fiduciária, é regra de direito excepcional, insusceptível a aplicação analógica a outros tipos de contrato.
4. Reconhecimento de que até a inclusão do § 15º no art. 3º do Decreto-lei n. 911⁄69, em 14.11.2014 (Lei n. 13.043⁄2014), a norma que disciplinava a purgação da mora no contrato de arrendamento mercantil de veículo automotor era a do art. 401, I, do Código Civil. A partir dessa data, contudo, não é mais permitida a purgação da mora também neste tipo de contrato, conforme norma específica.
5. Recurso especial conhecido e não provido.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1381832

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