A 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu, por unanimidade, manter a sentença determinando a realização da matrícula de um aluno do Curso de Medicina da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), campus de São Luís. Ele foi aprovado em processo seletivo para vaga remanescente na modalidade voluntária.
A UFMA sustentou que o estudante não cumpriu o disposto em edital no ponto que impõe a conclusão de pelo menos dez disciplinas do curso de origem.
Já o aluno alegou que após passar na primeira fase do certame a inscrição foi indeferida por não preencher o requisito em questão, mas afirmou ter sido aprovado em 11 matérias, sendo cinco na Universidade Ceuma e seis na Universidade Novafapi.
Razoabilidade – O relator, desembargador federal Daniel Paes Ribeiro, esclareceu que a exigência feita pela instituição extrapolou os limites legais, criando requisito não previsto na Lei nº 9.394/1996. O normativo estabelece as regras para transferência, obrigando, conforme artigo 49, que “instituições de educação superior aceitarão a transferência de alunos regulares, para cursos afins, na hipótese de existência de vagas e mediante processo seletivo”.
Complementou o magistrado que a exigência fere o princípio da razoabilidade por não existir argumento plausível que a justifique e ressaltou que o estudante demonstrou ter capacidade intelectual para dar continuidade aos seus estudos junto à instituição, já que foi classificado na primeira fase do certame que teve como base os resultados obtidos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) do ano anterior.
Assim, o desembargador votou por negar o pedido, entendendo que a participação no processo seletivo e a consequente realização da matrícula para o preenchimento de vagas ociosas deve ser assegurada independentemente do requisito disposto em edital.
O recurso ficou assim ementado:
CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO (UFMA). PREENCHIMENTO DE VAGAS OCIOSAS. EXIGÊNCIA DE TER CONCLUÍDO NO MÍNIMO 10 DISCIPLINAS DO CURSO ANTERIOR. FALTA DE JUSTIFICATIVA. PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. LIMINAR DEFERIDA. SITUAÇÃO DE FATO CONSOLIDADA. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL DESPROVIDAS. 1. Hipótese em que o pedido de inscrição do impetrante, para fins de transferência voluntária do curso de Medicina, foi indeferida, sob o argumento de que não preenchia o requisito previsto no item 7.1.3 do edital, que impõe ao pretendente a conclusão de, no mínimo, 10 (dez) disciplinas dos componentes curriculares do curso de origem. 2. Em hipótese similar, assim decidiu este Tribunal: Nos casos de transferência facultativa, prevista no art. 49, da Lei nº 9.394/96, em homenagem à autonomia didático-científica conferida constitucionalmente às universidades, na forma do art. 207, da CF/88, não obstante se reconheça a legitimidade da adoção, pela instituição de ensino, de critérios para seleção de candidatos, bem como para o aproveitamento de disciplinas que compõem o curso, cursadas na instituição de ensino de origem do candidato, tais regras não são absolutas, devendo ser observados os princípios constitucionais que norteiam os atos administrativos, dentre os quais, o da legalidade e da razoabilidade. Hipótese em que se assegura à estudante, segunda colocada na prova seletiva para transferência facultativa, onde existem duas vagas, o que mostra a sua capacidade intelectual, o direito à matrícula na instituição de ensino, uma vez que a sua desclassificação, após a análise curricular, quanto à compatibilidade de carga horária e conteúdo programático das disciplinas já cursadas na instituição de ensino de origem, além de não se mostrar razoável, privilegiando-se formalismos inibidores e desestimuladores do potencial científico da estudante em detrimento ao exercício do direito constitucional à educação (CF, art. 205), restou fundada em critérios meramente subjetivos, e ainda que não haja plena coincidência entre as disciplinas cursadas e as previstas na grade curricular da universidade, tais divergências poderão ser dirimidas no decorrer da sua vida acadêmica (TRF1, AC 0009500-63.2011.4.01.3000, Rel. Desembargador Federal Souza Prudente, 5T, e-DJF1 26/03/2015 PAG 1124). Nesse mesmo sentido: TRF1, REOMS 0074322-56.2015.4.01.3700, Rel. Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, 6T, e-DJF1 08/02/2018; TRF1, AMS 0050526-70.2014.4.01.3700, Rel. Desembargador Federal Daniel Paes Ribeiro, 6T, e-DJF1 28/05/2018 (REOMS 1000697-53.2016.4.01.3500, Relator Desembargador Federal João Batista Moreira, Sexta Turma, PJe 08.06.2021). 3. No caso, o impetrante comprova que concluiu, pelo menos, 11 (onze) disciplinas nas duas Universidades de origem, mormente quando o impetrante logrou êxito, ao demonstrar capacidade intelectual para dar continuidade aos seus estudos junto à impetrada, já que foi classificado na primeira fase do certame que teve como base os resultados obtidos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) do ano anterior. 4. Embora as instituições de ensino superior gozem de autonomia didático-científica e administrativa, conforme art. 207 da Constituição Federal, a conduta administrativa, nesse caso, implicou em ofensa aos princípios insculpidos na Lei 9.394/1996, bem como aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 5. Ademais, assegurada ao impetrante, por força de decisão liminar, proferida em 02.10.2019, conformada na sentença concessiva da segurança, a participação nas demais fases do certame e a consequente realização da matrícula no curso desejado, cuja determinação judicial foi cumprida pela autoridade coatora, impõe-se a aplicação da teoria do fato consumado, haja vista que o decurso do tempo consolidou uma situação fática amparada por decisão judicial, cuja desconstituição não se recomenda. 6. Sentença concessiva da segurança, confirmada. 7. Apelação e remessa oficial não providas.
O voto do relator foi acompanhado pelos demais integrantes do Colegiado.
Processo: 1010752-40.2019.4.01.3700