Exército não pode preterir militar temporário em direito a habitação

Segunda Turma do TRF3 determinou o pagamento de R$ 16 mil por danos morais a militar discriminado

A Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) reformou em parte sentença e determinou ao Exército Brasileiro o pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 16 mil, para um oficial temporário que foi preterido na ocupação de unidade habitacional por um oficial de carreira.
O militar contou que prestou serviços ao Exército Brasileiro como oficial temporário e, pela legislação vigente, fazia jus à habitação em Próprio Nacional Residencial (PNR), conforme a disponibilidade existente, observando-se a data de apresentação ao serviço e o número de dependentes. Porém, alegou que sofreu preterição por oficiais de carreira, havendo discriminação aos oficiais temporários, motivo pelo qual solicitou a reparação por danos materiais e danos morais.
A sentença da 2ª Vara Federal de Taubaté concluiu que o autor foi preterido no direito de ocupar moradia, pois ficou comprovado que um militar de carreira, ingresso e casado após o autor, ocupou unidade em PNRexistindo no próprio boletim interno diferenciação entre oficiais de carreira e oficiais temporários. A decisão fixou em R$ 16 mil o pagamento de indenização por danos materiais, e em mais R$ 16 mil, por danos morais.
Tanto o militar quanto o Exército apelaram da decisão. O militar requereu o aumento do valor da indenização para R$ 60 milJá o Exército defendeu que inexistiu discriminação entre militares de carreira e temporários.
Ao analisar o caso no TRF3, o desembargador federal Carlos Francisco considerou que “se o próprio Exército Brasileiro permite o ingresso de militares temporários, cujos direitos e deveres são os mesmos, enquanto prestado o serviço, evidentemente que as rotulações ‘militar de carreira e ‘militar temporário’ têm a nítida intenção de distinguir aquele militar que temporariamente está a servir ao País, na função a que foi contratado e admitido pelo próprio Estado, daquele que elegeu a vida castrense como ocupação definitiva”.
Para o desembargador, o tratamento dispensado violou o princípio da igualdade previsto na Constituição Federalpois, em lista direcionada à ocupação de um PNR, os primeiros tenentes de carreira figuravam à frente dos primeiros tenentes temporários, em expressa separação entre os combatentes da mesma categoria.
Segundo o magistrado, o demonstrado processo de distinção entre militares de carreira e militares temporários ultrapassou as raias de mero dissabor, irritação ou de fatos do cotidiano: “o atingimento da honra autoral está robustamente comprovado, cuja reparação arbitrada pela sentença não comporta alteração”, afirmou.
Sobre os prejuízos de ordem material, o desembargador salientou que o militar não trouxe nenhuma prova de gastos envolvendo aluguéis ou despesas. “Logo, nenhuma reparação material a ser devida, por ausências de provas a respeito”, concluiu.
Por fim, a Segunda Turma do TRF3, por maioria, reformou a sentença para excluir os danos materiais e determinou ao Exército Brasileiro o pagamento de indenização de R$ 16 mil por danos moraisao militar.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. MILITAR. PRÓPRIO NACIONAL RESIDENCIAL (PNR). PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E DE PRESCRIÇÃO AFASTADAS. VEDAÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO ENTRE MILITARES TEMPORÁRIOS E DE CARREIRA. DIREITO A HABITAÇÃO. DANOS MATERIAIS. NÃO COMPROVAÇÃO. DANOS MORAIS. OFENSA VERIFICADA. INDENIZAÇÃO DE ACORDO COM OS DITAMES DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. JUROS DE MORA. APELO DA PARTE AUTORA DESPROVIDO. APELAÇÃO DA UNIÃO PROVIDA EM PARTE.
1. De início, não procede a suscitação de inépcia da inicial, porque presente ampla descrição de fatos, fundamentos do direito vindicado e pedidos claros, extraindo-se pertinência lógica à narrativa lançada, nenhum vício sendo flagrado.
2. A respeito da prescrição, ingressou o polo autor nas fileiras do Exército em 30/01/1994 e lá permaneceu até 28/02/2000, tendo contraído núpcias em 1995. Neste passo, durante quase todo o período em que pertenceu aos quadros militares, desde seu casamento, poderia o autor usufruir de PNR, tendo ajuizado a ação em 25/02/2003. Preliminar também afastada.

3. De fato, é sabido que os Militares são regidos pelos preceitos da hierarquia e disciplina, art. 142, CF, portanto admitida a diferenciação, em escala vertical, por exemplo, entre Oficiais Generais, Oficiais Superiores (Coronel, Tenente-Coronel e Major), Oficiais Intermediários (Capitão) e Oficiais Subalternos (1º Tenente, 2º Tenente e Aspirante). Por outro lado, se o próprio Exército Brasileiro, na forma da lei, permite o ingresso de Militares Temporários, cujos direitos e deveres são os mesmos, enquanto prestado o serviço, evidentemente que as rotulações “Militar de Carreira” e “Militar Temporário” têm a nítida intenção de distinguir aquele Militar que temporariamente está a servir ao País, na função a que foi contratado e admitido pelo próprio Estado, daquele que elegeu a vida castrense como ocupação definitiva.

  4. O tratamento dispensado violou o princípio da igualdade previsto no caput do art. 5º, Lei Maior, pois os 1ºs Tenentes de Carreira figuravam à frente dos 1ºs Tenentes Temporários, em expressa separação entre os combatentes da mesma categoria, listagem aquela direcionada à ocupação de um PNR.

 5. Ausência, nos autos, de efetiva comprovação dos danos materiais sofridos, ônus processual este da parte autora (art. 333, I, CPC/73). Logo, nenhuma reparação material a ser devida, por ausências de provas a respeito.

  6. Por sua vez, o demonstrado processo de distinção entre Militares de Carreira e Militares Temporários, evidentemente ultrapassou as raias de mero dissabor, irritação ou de fatos do cotidiano. Realmente, é sabido que a carreira castrense segue rígido padrão de abordagem, fazendo com que os subordinados, por estes motivos, sejam desencorajados a realizar questionamentos a seus superiores, sob pena de o fato ser recebido como insubordinação, resultando em punição daquele que expõe a sua opinião ou pretende fazer valer um direito.

  7. Aliás, de conhecimento público, também, que a sociedade em geral nutre preconceitos dos mais diversos gêneros (cor, raça, opção sexual, religiosa etc), assim não se afigurando irrazoável que os Militares de Carreira se sentissem “superiores” aos Militares Temporários, fechando verdadeiro círculo entre os “pares da mesma casta”, protegendo-se dentro desta escala.

 8. Assim, o atingimento da honra autoral está robustamente comprovado, cuja reparação arbitrada pela r. sentença não comporta alteração, porque fixada em quantia adequada e obediente à razoabilidade, afigurando-se excessiva a pretensão recursal para majoração, porque não espelha a valoração colimada qualquer relação com o dano experimentado. Por estes motivos, adequada a importância fixada pelo E. Juízo a quo.

 9. Os juros são devidos pelo indexador firmado no retratado art. 1º-F, a partir da citação, e a correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), desde a r. sentença.

  10. Recurso de apelação da União parcialmente provido. Apelo da parte autora conhecido, porém desprovido. Sentença reformada em parte.

Apelação Cível Nº 0001142-82.2003.4.03.6121

Deixe uma resposta

Iniciar conversa
Precisa de ajuda?
Olá, como posso ajudar