Após ser aprovado para curso técnico no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais (IFNMG) em vaga destinada à cota da rede pública, um estudante teve sua matrícula negada sob a justificativa de não ter ele cursado integralmente o ensino médio em escola pública. Diante dessa circunstância, o aluno acionou a Justiça Federal.
Conforme os autos, o estudante cursou um ano do ensino médio em escola particular na condição de bolsista. Nesses termos, a 6ª Turma do TRF1 entendeu que o estudante faz jus ao direito de matrícula, pois o fato de frequentar instituição de ensino particular por período curto, sendo beneficiário de bolsa de ensino, não é suficiente para excluir o discente do sistema de cotas.
Para o Colegiado, não se pode concluir que a rápida passagem de aluno economicamente carente por escola particular seja suficiente para elevar a qualidade do ensino recebido, tendo em vista que a vida estudantil do autor ocorreu predominantemente em escola pública.
O recurso ficou assim ementado:
ENSINO SUPERIOR. SISTEMAS DE COTAS. UMA SÉRIE CURSADA EM INSTITUIÇÃO DE ENSINO PRIVADA NA CONDIÇÃO DE BOLSISTA. MATRÍCULA. SENTENÇA EM QUE DEFERIDA. JURISPRUDÊNCIA CONTRÁRIA DO TRF1. FATO, TODAVIA, CONSUMADO. MANUTENÇÃO.
1. Já se decidiu que “a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça enuncia que as normas reguladoras do sistema de reserva de vagas, as quais determinam a realização do ensino fundamental e médio exclusivamente em escola pública, não podem ser interpretadas extensivamente para abarcar instituições de ensino particulares. Precedentes: REsp 1.206.619/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 13/12/2011; AgRg no REsp 1.314.005/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 28/5/2013; AgRg no REsp 1443440/PB, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 20/6/2014” (AgInt no REsp 1.589.435/SC, Ministro Herman Benjamin, 2T, DJe 11/10/2016). No mesmo sentido: REsp 1.132.476/PR, REsp 1.328.192/RS, AgRg no REsp 1.443.440/PB, REsp 1.670.577/RS, AgRg no REsp 1.521.053/PB, REsp 1.453.356/PB e AgRg no REsp 1.348.726/SE.
2. Nesse mesmo sentido, conforme entendimento deste Tribunal, “a razão da existência do Sistema de Cotas é possibilitar o nivelamento de oportunidade de acesso ao ensino superior contribuindo para a entrada dos candidatos menos favorecidos, não apenas sob o aspecto econômico-financeiro, mas do ponto de vista didático, às Universidades Federais. Logo, se a apelada teve acesso a uma melhor qualidade de ensino no período correspondente ao ensino médio, ainda que ministrada sob o amparo de bolsa de estudos, não estava legitimada a concorrer pelo sistema de cotas, como o fez” (TRF1, AC 0006635-44.2015.4.01.3803/MG, Rel. Desembargador Federal Daniel Paes Ribeiro, 6T, e-DJF1 20/02/2019). “Ainda que tenha cursado apenas parte do ensino médio em escola particular na condição de bolsista, verifica-se que a autora teve acesso a melhores condições de ensino, podendo concorrer em igualdade de condições às vagas destinadas à ampla concorrência”. (TRF1, AC 0009736-89.2015.4.01.3900, Rel. Desembargador Federal Carlos Augusto Pires Brandão, 5T, e-DJF1 29/11/2019).
3. A liminar foi deferida em 27/04/2018, confirmada pela sentença. Há que se considerar o prejuízo que a reforma da sentença causaria ao estudante e, ao revés, a ausência de prejuízo para a IES.
4. O Superior Tribunal de Justiça admite a preservação do fato consumado nos casos em que a restauração da estrita legalidade implicaria mais danos sociais do que a manutenção da situação consolidada pelo decurso do tempo. Confiram-se: AgInt no REsp 1.402.122/PB, Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 1T, DJe 11/10/2016; AgRg no REsp 1.498.315/PB, Ministra Assusete Magalhães, 2T, DJe 03/09/2015. A jurisprudência deste Tribunal está alinhada com a do STJ: AC 1000426-64.2018.4.01.3600, Desembargador Federal João Batista Moreira, 6T, PJe 22/04/2020; AC 0007905-31.2013.4.01.3300, Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, 5T, e-DJF1 23/01/2019; AC 0005851-38.2013.4.01.3900, Desembargador Federal Daniel Paes Ribeiro, 6T, e-DJF1 04/12/2018.
5. Negado provimento à apelação e ao reexame necessário.
A decisão foi unânime.
Processo: 1003785-04.2018.4.01.3800