A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por decisão unânime, definiu que o direito de requerer a adjudicação de um bem penhorado, previsto no artigo 876 do Código de Processo Civil (CPC), não se sujeita à preclusão enquanto ele não tiver sido alienado. Segundo o colegiado, nas execuções judiciais, a adjudicação não tem prazo para ser realizada, contanto que ainda não tenha havido outra forma de expropriação do bem, como o leilão.
O entendimento foi adotado no curso da execução de garantias hipotecárias proposta por uma fabricante de bebidas contra duas outras pessoas jurídicas. Quando já iniciados os trâmites para o leilão judicial, a exequente – que não manifestara esse interesse antes – requereu a adjudicação de dois imóveis das devedoras, pedido que foi acolhido pelo juízo de primeira instância em decisão mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).
Em recurso especial ao STJ, as partes executadas sustentaram que o direito à adjudicação estaria precluso, pois já havia sido iniciada a fase do leilão. Argumentaram também que as locatárias dos imóveis, sociedades em recuperação judicial, não foram intimadas para poderem exercer o seu direito de preferência.
Prioridade à adjudicação justifica ausência de limite temporal
De acordo com a relatora, ministra Nancy Andrighi, a adjudicação é uma técnica de execução preferencial, que viabiliza de forma mais rápida o direito do exequente. Por isso, não está sujeita a um prazo preclusivo, podendo ser requerida a qualquer momento até a alienação do bem.
Para a ministra, mesmo que o artigo 878 do CPC diga que a oportunidade para pedir a adjudicação será “reaberta” se as tentativas de alienação forem frustradas, “isso não significa que essa alternativa colocada à disposição do credor se fecha se não exercida imediatamente após realizada a avaliação do bem penhorado”.
No entendimento da relatora, esse é a interpretação mais condizente com a prioridade que a lei dá à adjudicação e com a ideia de que a execução se processa no interesse do credor.
Direito exercido tardiamente pode implicar pagamento de despesas
Nancy Andrighi apontou, porém, que a manifestação tardia do interesse pela adjudicação, quando já tiverem sido iniciados os atos preparatórios para a alienação, pode fazer com que o adjudicante tenha de suportar eventuais despesas realizadas até esse momento – como decidido pela Quarta Turma (REsp 1.505.399) em julgamento sobre o mesmo tema.
Quanto à situação das locatárias do imóvel adjudicado, a ministra comentou que a preferência para aquisição prevista na Lei do Inquilinato não se estende aos casos de perda da propriedade ou de venda judicial, e que o fato de estarem em recuperação tampouco impede a adjudicação, não havendo necessidade de sua intimação.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE GARANTIAS HIPOTECÁRIAS. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 47 DA LEI Nº 11.101/02. SÚMULA 284/STF. ADJUDICAÇÃO. TERMO FINAL. INEXISTÊNCIA DE PRAZO PRECLUSIVO. INTIMAÇÃO DOS TERCEIROS DEVEDORES E DO LOCATÁRIO DOS BENS. DESNECESSIDADE.
1. Execução de garantias hipotecárias, da qual foi extraído o presente recurso especial interposto em 01/08/2022 e concluso ao gabinete em 15/12/2022.
2. O propósito recursal consiste em dizer sobre a) a ocorrência de negativa de prestação jurisdicional; b) o termo final para a formulação do pedido de adjudicação de bem penhorado; c) a necessidade de intimação do terceiro devedor, que não compõe o polo passivo da execução, e do locatário do bem, acerca do requerimento de adjudicação.
3. Na hipótese em exame deve ser afastada a existência de omissão no acórdão recorrido, pois as matérias impugnadas foram enfrentadas de forma objetiva e fundamentada no julgamento do agravo de instrumento, naquilo que o Tribunal a quo entendeu pertinente.
4. A adjudicação consiste na transferência do bem penhorado (móvel ou imóvel) ao exequente ou a outro legitimado (art. 876, caput e §§ 5º e 7º, do CPC/2015), que passará a ser o seu proprietário. Essa técnica de expropriação goza de preferência em relação aos demais mecanismos expropriatórios (arts. 876 e 880, caput, do CPC/2015).
5. Uma vez realizadas a penhora e a avaliação do bem, abre-se a possibilidade para o requerimento de adjudicação (art. 875 do CPC/2015). Além de o mecanismo expropriatório ser preferencial, a adjudicação propicia uma maior economia de recursos e viabiliza a satisfação do direito do exequente de forma mais célere. Assim, o requerimento de adjudicação não se sujeita a um prazo preclusivo, podendo ser formulado a qualquer tempo, desde que ainda não realizada a alienação do bem. Se tal faculdade for exercida após já iniciados os atos preparatórios à alienação, deverão ser atribuídas ao adjudicante as despesas a eles concernentes.
6. Formulado requerimento de adjudicação, deve-se proceder à intimação do executado, na forma prevista no art. 876, § 1º, do CPC/2015. Também devem ser intimados os colegitimados à adjudicação elencados no art. 876, § 5º, do CPC/2016, para, querendo, exercerem o direito de preferência a que têm direito. Não há necessidade de intimação de outros devedores do débito que não ocupam o polo passivo da execução, tampouco do locatário do imóvel penhorado, se houver, ante a inexistência de previsão legal nesse sentido e da ausência de direito de preferência do locatário na hipótese de adjudicação (art. 32 da Lei nº 8.245/91).
7. Na espécie, a recorrida (exequente) postulou a adjudicação dos bens penhorados depois de nomeado o leiloeiro, mas antes de efetivada a alienação dos imóveis. Ademais, todas as intimações determinadas pela lei foram efetivadas. Sendo assim, não há óbice à adjudicação.
8. Recurso especial não provido.
Leia o acórdão no REsp 2.041.861.