Engenheiro cedido terá de retornar a Rondônia após 20 anos no Rio de Janeiro

Ele não foi transferido definitivamente, mas apenas cedido de forma provisória, embora reiterada

Por unanimidade, a Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso de um engenheiro que pedia para permanecer no Rio de Janeiro (RJ) após ter sido cedido por 20 anos pela Companhia Energética de Rondônia (Ceron) às Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras). Segundo o colegiado, não ficou caracterizada a mudança definitiva, e o empregador pode encerrar a cessão a qualquer tempo por ato unilateral.

Adicional

Na ação, o engenheiro disse que havia sido admitido na Ceron, empresa do sistema Eletrobras, em 1983 e, em 1996, foi transferido para o Rio de Janeiro para a líder do grupo econômico, onde recebia as mesmas vantagens de seus empregados e chegou a receber uma medalha por 20 anos de serviço. Em julho de 2017, porém, foi informado de que teria de voltar a Rondônia.

Seu argumento era o de que sua transferência fora definitiva, apesar do recebimento de um adicional mensal e da renovação anual da cessão. Segundo ele, sua família está radicada no Rio de Janeiro, a mulher é concursada em cargo público, a filha está na universidade e a mãe, de 85 anos, depende dele financeira e emocionalmente. Além do reconhecimento de vínculo com a Eletrobras e sua permanência no Rio, ele pretendia a incorporação do adicional ao salário.

Empresa

A Eletrobras afirmou, em sua defesa, que a cessão não fora definitiva e que o adicional apenas é devido enquanto perdurasse essa situação, não podendo ser incorporado ao salário nem mantido na hipótese de retorno para Rondônia. A companhia ressaltou que a cessão, como toda e qualquer cessão, era renovada periodicamente, sempre no interesse das partes envolvidas, e que o empregado estava ciente disso desde a transferência originária.

Cedido

O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região considerou válido o término da cessão, por ter ficado comprovado nos autos que o empregado não fora transferido definitivamente. Para o TRT, a precariedade da cessão não se altera pelo fato de ter perdurado por muitos anos, e não há como reconhecer o direito adquirido do engenheiro à manutenção da situação.

Cessão x transferência

O relator do recurso de revista do engenheiro, ministro Amaury Rodrigues, observou que a cessão tem caráter provisório e não se confunde com a transferência, disciplinada no artigo 469 da CLT, em que o empregado continua trabalhando para o empregador. Ele explicou que, na cessão, o empregado, sem a suspensão ou a interrupção do vínculo funcional com a origem, passa a atuar fora da unidade de lotação ou da empregadora. A medida é legalmente prevista entre empresas públicas e não gera vínculo de qualquer natureza com a cessionária, que, no caso, fazia parte da administração pública indireta.

Moralidade

Na avaliação do relator, a pretensão do empregado, na realidade, é consolidar o vínculo na Eletrobras, ainda usufruindo dos benefícios que ambas as empresas concediam. Ele explicou que, mesmo que tenha prestado serviços por diversos anos à Eletrobras, o engenheiro não tem direito a integrar seus quadros porque, para isso, teria de ter sido aprovado em concurso público. Nesse sentido, lembrou que, embora tenha sido admitido na Ceron em 1983, a cessão se deu depois da promulgação da Constituição Federal de 1988.

O recurso ficou assim ementado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/17. NULIDADE DO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. TEMA 339 DA REPERCUSSÃO GERAL DO STF. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA.

1. No Tema 339 de Repercussão Geral, o STF adotou a seguinte tese jurídica: ” O art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou prova s”.

2. No caso dos autos, a prestação jurisdicional foi entregue de forma plena, em extensão e profundidade, tendo a Corte Regional proferido decisão em sintonia com o citado precedente.

CESSÃO DE EMPREGADO A PESSOA JURÍDICA DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA. RECONHECIMENTO DE VÍNCULO COM A PRIMEIRA RÉ CESSIONÁRIA. AUSÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE. CESSÃO OCORRIDA EM 1996. POSTERIOR PRIVATIZAÇÃO.

1. In casu , a Corte Regional assentou que ” urge salientar que o Reclamante foi admitido na 2ª Ré em 5.1.1983, em Rondônia, sendo cedido para o Rio de Janeiro, em 2.1.1996, a fim de trabalhar na e para a 1ª Ré “.

2. A cessão pode ser compreendida como o ato autorizativo pelo qual empregado, sem suspensão ou interrupção do vínculo funcional com a origem, passa a ter exercício fora da unidade de lotação ou empregadora, endo legalmente prevista entre empresas públicas e não gera vínculo de qualquer natureza com a cessionária, que, no caso, fazia parte da Administração Pública Indireta.

3. Assim, ainda que tenha prestado serviços por diversos anos em favor da primeira demandada, não há disposição legal que lhe outorgue o direito de passar a integrar os quadros da cessionária o que, inclusive, esbarraria no óbice do art. 37, II, da Constituição Federal (prévia necessidade de aprovação em concurso público para a investidura em cargo ou emprego público).

4. Relevante destacar, inclusive, que, malgrado tenha sido admitido na segunda ré em 1983, a data da cessão do autor à primeira ré (considerada como marco inicial da prestação de serviços) se deu em momento posterior à promulgação da Magna Carta em 1988.

5. Logo, inviável acolher a pretensão do autor no tocante ao reconhecimento de vínculo com a primeira ré, seja pela legalidade do ato de cessão perpetrado, seja pela ausência de concurso público para ingresso no quadro funcional da primeira ré.

ADESÃO AO PLANO DE DESLIGAMENTO OFERTADO PELA PRIMEIRA RÉ. PLANO NÃO APROVADO PELOS ÓRGÃOS GOVERNAMENTAIS. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA N.º 126 DO TST.

1. No caso dos autos, o Tribunal a quo exarou que ” o PAI não foi aprovado pelos órgãos e entidades governamentais a que a primeira reclamada é subordinada administrativamente, fator que constitui condição essencial para sua validade, não havendo como subsistir o argumento de que a proposta vinculava a proponente “.

2. Delineada tal premissa fática, o entendimento quanto à validade e aprovação do plano de desligamento em comento demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório, nos termos da Súmula n.º 126 do TST.

Agravo de instrumento a que se nega provimento.

RECURSO DE REVISTA. NULIDADE DO JULGAMENTO. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. PRECLUSÃO.

1. O recorrente sustenta a nulidade do julgamento por cerceamento do direito de defesa, sob os seguintes fundamentos: a) impedimento de produzir sustentação oral após o pedido de adiamento, por razões médicas e com a concordância da parte contrária; b) desrespeito ao pedido de vista da Des. Graça Paranhos, ausente à sessão que concluiu o julgamento e com a presença de outros eminentes magistrados que não assistiram a sustentação oral do Recorrente; c) composição turmária diversa daquela que deveria concluir o julgamento.

2. O recurso de revista não alcança conhecimento, pois o recorrente apresentou embargos de declaração, apenas registrando “protestos” em razão de “prejuízos nulificantes”.

3. Além de não ter arguido a nulidade, também não explicitou os motivos pelos quais haveria nulidade, impedindo que a Corte regional se pronunciasse e prestasse esclarecimentos (ou mesmo acolhesse a nulidade apontada).

4. A falta de arguição da nulidade ao interpor embargos declaratórios gerou preclusão, conforme expressa previsão do art. 795 da CLT e incidência da Súmula 297 do TST, pois em razão da ausência da devida provocação na primeira vez em que o prejudicado se manifestou nos autos (interposição dos embargos declaratórios), o Tribunal de origem não emitiu tese a respeito.

Recurso de revista não conhecido.

CESSÃO DE EMPREGADO. “TRANSFERÊNCIA” PARA OUTRA EMPRESA HÁ MAIS DE 26 ANOS, AO LONGO DO CONTRATO DE TRABALHO. DEFINITIVIDADE NÃO CARACTERIZADA. CARÁTER PRECÁRIO. ENCERRAMENTO A QUALQUER TEMPO POR ATO UNILATERAL DA EMPRESA CEDENTE. LEGALIDADE.

1. Trata-se de hipótese na qual o autor cedido por mais de 20 anos, com mudança de domicilio de Rondônia para o Rio de Janeiro, insurge-se contra o encerramento da cessão com a determinação de seu retorno ao local de trabalho de origem, requerendo a manutenção de seu local de trabalho, bem como a incorporação em definitivo ao salário do adicional de transferência de 50%.

2. O conceito do instituto da cessão encontra-se bem definido no art. 3º do Decreto nº 10.835/2021, que assim estabelece, verbis : ” A cessão é o ato pelo qual o agente público, sem suspensão ou interrupção do vínculo funcional com o órgão ou a entidade de origem, passa a ter exercício em outro órgão ou outra entidade “. Por sua vez, os art. 7º e 8º do referido dispositivo preconizam que a cessão será concedida por prazo indeterminado e poderá ser encerrada, a qualquer momento, por ato unilateral do cedente, do cessionário ou do agente público cedido.

3. Note-se que a cessão de empregado tem caráter provisório e não se confunde com a transferência provisória ou definitiva disciplinada no art. 469 da CLT. Nesta o empregado continua exercendo suas atividades para o empregador. Naquela a atividade é exercida na cessionária, entidade distinta do empregador.

4. No presente caso, a Corte Regional confirmou a sentença, quanto à validade do término da cessão, com retorno ao empregador de origem, sob o fundamento de que ficou ” [c]omprovado nos autos que o empregado não foi definitivamente transferido, mas apenas provisória e reiteradamente cedido, cuja precariedade não se altera pelo fato dessa cessão haver perdurado por muitos anos, não há como ser reconhecido o direito adquirido do autor à manutenção da situação, não sendo ilícito o cancelamento justificado por parte da empresa cessionária” .

5. Não merece reparos o acórdão regional. A pretensão do empregado, na realidade, é consolidar o vínculo na empresa do Rio de Janeiro, ainda usufruindo das benesses ou benefícios que ambas as “empresas” concediam aos seus funcionários, o que carece de total plausibilidade jurídica, além de atentar contra os princípios da legalidade e moralidade administrativas, que também norteiam os órgãos da Administração Púbica Indireta.

Recurso de revista não conhecido.

INDENIZAÇÃO POR DANO EXTRAPATRIMONIAL. TRANSFERÊNCIA AO LOCAL DE PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS DE ORIGEM. TRANSTORNOS PSICOLÓGICOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DANO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA.

1. A responsabilidade civil tem como pressuposto basilar a antijuridicidade da conduta que, nos casos de danos extrapatrimoniais, cause lesões aos atributos da personalidade.

2. No caso presente, como visto, não se reconheceu a antijuridicidade da conduta empresarial em razão do direito potestativo de cancelar a cedência do autor a outro órgão.

3. Não havendo conduta ilícita, não há que se falar em reparação civil.

Recurso de revista não conhecido.

A decisão foi unânime.

Processo: RRAg-101155-64.2017.5.01.0077

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