Empresário consegue liberação de passaporte suspenso em execução de dívida

Segundo a SDI-2 do TST, o documento é necessário para o empresário poder exercer suas atividades

Um empresário de Salvador (BA) cujo passaporte havia sido suspenso para garantir o pagamento de dívidas trabalhistas terá o documento liberado pela Justiça do Trabalho após apresentar habeas corpus ao Tribunal Superior do Trabalho. Segundo a Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2), é possível a adoção de medidas atípicas para forçar o cumprimento de decisão judicial. Porém, no caso concreto, a medida não recaiu sobre o patrimônio do empresário, mas sobre sua liberdade, uma vez que o documento é necessário a sua atividade profissional.

Medidas atípicas

O empresário tentava embarcar a trabalho para a Colômbia, em 7/11/2021, no Aeroporto Internacional Tom Jobim, no Rio de Janeiro, quando tomou conhecimento de que seu passaporte havia sido suspenso por determinação da 1ª Vara do Trabalho de Salvador (BA). Nos autos da reclamação trabalhista, o juízo explica que, como não havia tido êxito em obter o pagamento das dívidas trabalhistas da empresa do qual ele era sócio por outros meios, adotou a medida atípica de suspensão do passaporte.

Liberdade cerceada

Em mandado de segurança ao Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA), o empresário sustentou que sua liberdade fora cerceada para obrigá-lo, na condição de possível responsável subsidiário, a pagar a dívida reconhecida na ação judicial. Ele disse que viajava a trabalho para obter contratos no exterior, e a retenção do passaporte prejudicaria a capacidade das empresas de obterem recursos para pagar suas dívidas.

Retenção

O pedido, contudo, foi negado. Segundo o TRT, é possível determinar o bloqueio do passaporte do devedor inadimplente, com base no Código de Processo Civil (CPC, artigo 139, inciso IV) como medida restritiva de direito, “ampliando a possibilidade de alcançar a efetividade nas execuções”.

Subsistência

Já no TST, ao analisar o habeas corpus do empresário, o ministro Dezena da Silva não considerou razoável que uma medida adotada para forçar o cumprimento de uma decisão judicial possa impactar a vida do devedor, dificultando ou inviabilizando o seu trabalho e afetando a própria subsistência e de sua família.  Segundo ele, a narrativa baseada na “necessidade profissional” do passaporte faz toda a diferença e demanda um olhar diferenciado, por envolver a aplicação de princípios norteadores e determinantes à solução do conflito, como o de menor onerosidade, proporcionalidade e razoabilidade.

O ministro observou, ainda, que, embora seja correta a possibilidade de suspensão do passaporte do devedor inadimplente, com base no CPC, a primeira medida imposta ao empresário, ao ser incluído na execução, não recaiu sobre seu patrimônio, mas sobre a sua liberdade.

O recurso ficou assim ementado:

HABEAS CORPUS. MEDIDAS ATÍPICAS PARA FORÇAR O CUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. SUSPENSÃO DO PASSAPORTE. ATO IMPUGNADO POR MEIO DE HABEAS CORPUS PERANTE TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO. DENEGAÇÃO DA ORDEM. IMPETRAÇÃO DE NOVA AÇÃO. NECESSIDADE PROFISSIONAL DO DOCUMENTO. AUSÊNCIA DE OUTRAS MEDIDAS TENDENTES A FORÇAR O ADIMPLEMENTO DA EXECUÇÃO. ORDEM CONCEDIDA.

1. O Supremo Tribunal Federal julgou improcedente o pedido deduzido na ADI 5.941/DF, reconhecendo, assim, a constitucionalidade dos arts. 139, IV; 297, caput; 380, parágrafo único; 403, parágrafo único, 536, caput e § 1.º; e 773 do CPC, que autorizam a adoção de medidas atípicas para cumprimento de ordem judicial, mesmo que relativas à prestação pecuniária. Destacou-se, naquela assentada, a necessidade de reverenciar o acesso à Justiça e de assegurar a eficiência do sistema, valores que legitimam a atuação criativa dos magistrados, pautada pelos princípios ali enunciados, como o da menor onerosidade, proporcionalidade e adequação, a serem ponderados no exame de cada caso concreto. Essa é a compreensão que já vinha sendo externada nos julgados desta Subseção.

2. Na espécie, o ato originário consiste na apreensão do passaporte do ora paciente, após frustradas as tentativas de afetação do patrimônio da empresa, da qual era único sócio como pessoa física, e da realização do incidente de desconsideração da pessoa jurídica.

3. Impetrado Mandado de Segurança, o Tribunal Regional do Trabalho da 5.ª Região denegou a ordem, afirmando possível a adoção da medida atípica de suspensão do passaporte, à luz do que dispõe o art. 139, IV, do CPC, ainda que necessário à atividade profissional, um dos argumentos em que calcada a ação.

4. Impetrado Habeas Corpus originário nesta Corte, tal como admite a jurisprudência, impõe-se a correção do ato censurado, que ora se volta para o acórdão regional.

5. São as circunstâncias do caso concreto que conferem ao ato a sua legitimidade. Certo, portanto, que a narrativa calcada na “necessidade profissional” do passaporte demanda um olhar diferenciado, por envolver a aplicação de princípios norteadores e determinantes à solução do conflito, como o de menor onerosidade, proporcionalidade e razoabilidade.

6. Para além desse enfoque, há outros elementos nos autos que indicam inobservância desses princípios, uma vez que se extrai do ato primitivo o fato de que a primeira medida imposta ao ora paciente, uma vez integrado ao polo passivo da execução, não recaiu sobre seu patrimônio, mas sobre a sua liberdade.

7. O reconhecimento da validade do ato originalmente impugnado, com a denegação da ordem pelo TRT da 5.ª Região, prolongou, pois, o constrangimento ilegal do paciente.

Ordem concedida para, em última análise, liberar o passaporte do paciente.

Processo: HCCiv-1000316-05.2022.5.00.0000

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