Empresa de carros-fortes deve responder por disparo involuntário de arma que feriu segurança

A decisão leva em conta que a atividade de segurança armada é de risco

A Prosegur Brasil S.A – Transportadora de Valores e Segurança terá de responder por um acidente involuntário ocorrido com um segurança de Aracaju (SE), baleado na própria perna após sua arma ficar presa na porta do carro forte. A decisão é da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que aplicou ao caso a teoria da responsabilidade objetiva, baseada no risco da atividade.

Disparo

Na reclamação trabalhista, o segurança relatou que o acidente ocorreu quando o carro forte fazia uma coleta em um shopping da cidade. Ao descer do veículo para retirar o ticket e liberar a cancela, sua arma, que estava no coldre, ficou presa no trinco da porta e disparou. O tiro atingiu sua perna e, em razão do ferimento, teve de ficar afastado por mais de um ano.

Sem nexo causal

Para a Prosegur, o acidente não teve nenhuma ligação com o exercício da função de segurança. Segundo a empresa, o reconhecimento como acidente de trabalho pela legislação previdenciária não é suficiente para responsabilizá-la, pois o fato teria sido provocado pelo próprio empregado.

Culpa exclusiva

O juízo da 6ª Vara do Trabalho de Aracaju e o Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região (SE) consideraram que o trabalhador foi o único responsável pelo acidente e negaram o pedido de indenização. “A Prosegur não concorreu para a ocorrência do acidente, restando clara a culpa exclusiva do empregado”, diz a decisão.

Risco

O relator do recurso de revista do segurança, desembargador José Pedro de Camargo, lembrou que o que define o risco não é a atividade econômica desenvolvida pela empresa, mas a efetiva atividade executada pelo trabalhador. “Se o trabalho é perigoso – em função do seu intrínseco risco excepcional – não há por que se cogitar de culpa (exclusiva e concorrente) do trabalhador no disparo acidental da arma de fogo”, ressaltou.

Fortuito interno

De acordo com o relator, trata-se de caso fortuito interno, ligado à própria atividade de risco exacerbado. “O ato de disparo acidental ao movimentar-se dentro do carro forte é ínsito da atividade de vigilância armada em transporte de valores”, assinalou.

Jurisprudência

Segundo ele, a jurisprudência do TST vem se posicionando no sentido de que, diante da periculosidade da atividade exercida – e mesmo diante da conclusão de que o empregado tenha atuado com culpa -, a empresa deve ser responsabilizada concorrentemente.

O recurso ficou assim ementado:

I – AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017.

PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL.

Ante a possibilidade de decidir o mérito em favor da parte a quem aproveitaria a declaração de nulidade, deixa-se de pronunciá-la, com fundamento no art. 282, § 2º, do CPC/2015, em nome também do princípio da celeridade processual, que tem estofo constitucional .

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACIDENTE DE TRABALHO. DISPARO DE ARMA DE FOGO. FERIMENTO PRÓPRIO. TRANSPORTE DE VALORES. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA.

Diante da jurisprudência desta 6ª Turma e da C. SBDI-1 desta Corte, uma e outra no sentido de ser objetiva a responsabilidade da empregadora no caso de atividade de risco, como é o transporte de valores (carro forte), deve ser superada a negativa de seguimento recursal, prosseguindo-se com melhor exame do agravo de instrumento.

Agravo interno conhecido e provido.

II – AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACIDENTE DE TRABALHO. DISPARO DE ARMA DE FOGO. FERIMENTO PRÓPRIO. TRANSPORTE DE VALORES. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA.

TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA.

Constatada a viabilidade da alegação de afronta ao artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, impõe-se o reconhecimento da transcendência jurídica da causa, para mais acurado exame da matéria.

Agravo de instrumento conhecido e provido.

III – RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACIDENTE DE TRABALHO. DISPARO DE ARMA DE FOGO. FERIMENTO PRÓPRIO. TRANSPORTE DE VALORES. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA.

A controvérsia centra-se no reconhecimento de responsabilidade civil da empresa por acidente de trabalho sofrido pelo empregado, quando no desempenho da atividade de segurança armada , em transporte de valores, tendo o Regional aplicado a teoria da responsabilidade subjetiva e, no caso, atribuindo culpa exclusiva da vítima, pelo disparo da arma de fogo que portava, ao descer do carro forte, pois o coldre enroscou na maçaneta da porta do veículo . A jurisprudência pacífica desta Corte Superior reconhece que a responsabilidade patronal por dano moral ou material , advindos de acidente de trabalho, em regra, é subjetiva, baseada na teoria da culpa (inciso XXVIII do artigo 7º da Constituição Federal). Admite-se, porém, na linha de entendimento do E. STF, Tema 932 (RE 828.040), que essa responsabilidade independe de culpa do empregador se o infortúnio decorrer de atividade de risco (parágrafo único do artigo 927 do Código Civil), aplicando-se a teoria da responsabilidade objetiva. Não é a atividade econômica desenvolvida pela empresa que define se a atividade é de risco ou , não, mas , sim , a efetiva atividade executada pelo trabalhador. Precedentes. E, na espécie, conforme o quadro fático delineado no acórdão do regional, incontroversa a ocorrência de acidente de trabalho típico, no exercício de atividade de segurança armada , com risco exacerbado e notório, ao se transportarem valores, sendo que no momento em que ocorreu o disparo da arma de fogo, ao descer do carro forte, o projetil atingiu membro inferior do empregado, como acima explicitado. Ora, sendo essa atividade laboral perigosa, em função do seu intrínseco risco excepcional, assim classificada no anexo 3 da NR 16 (precedentes), não há por que se cogitar de culpa (exclusiva ou concorrente) do trabalhador no disparo acidental da arma de fogo, pois se trata de situação própria e inseparável da peculiar atividade de vigilância armada no transporte de valores, com óbvia situação de tensão, apreensão, alerta e prontidão. Por isso, o fato de ” No momento da descida do reclamante, a sua própria arma, que estava no coldre, prendeu na porta, e ocasionou um disparo em sua perna “, enquadra-se como caso fortuito interno, repita-se, intrinsecamente ligado à própria atividade de risco exacerbado, que não pode significar culpa exclusiva da vítima, ao contrário da conclusão do Regional. Ademais, o quadro fático descrito no acórdão recorrido repele, expressamente, qualquer caso fortuito externo como causa do acidente. Precedentes.

Recurso de revista conhecido e provido.

Com o reconhecimento da responsabilidade objetiva, o processo deverá voltar à Vara do Trabalho para novo julgamento.

Processo: RR-901-35.2021.5.20.0006

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