“Não se pode reconhecer o vínculo de emprego diretamente com a pessoa física, quando há uma sociedade empresária que assume os riscos da atividade econômica, admite, remunera e dirige a prestação de serviços” Com esse entendimento, a 5ª Turma do TRT mineiro rejeitou o recurso de um trabalhador que pretendia ter reconhecido o vínculo de emprego com duas pessoas que apontou como sócios do depósito de gás no qual, por cerca de dois anos, ele teria trabalhado como entregador. Acolhendo o voto do relator, desembargador Luiz Ronan Neves Koury, num dos últimos processos julgados antes da sua aposentadoria, a Turma manteve a sentença que concluiu que os réus não tinham legitimidade para compor o polo passivo da ação.
O trabalhador insistia no reconhecimento do vínculo de emprego com os dois réus, pessoas físicas, e na condenação deles ao pagamento dos direitos trabalhistas decorrentes. Afirmava que trabalhou no depósito de gás que pertencia aos réus, sem anotação da CTPS. Sustentou que os sócios podem estar na ação trabalhista desde o início (e não apenas na fase de execução), sendo, portanto, partes legítimas para figurar no polo passivo, mesmo porque foram eles que exploraram sua força de trabalho. Argumentou ser possível a desconstituição da personalidade jurídica da empresa, o que leva à responsabilidade direta dos sócios pelos direitos trabalhistas descumpridos.
Mas, ao consultar o sistema da Jucemg, a juíza de primeiro grau constatou que os réus, na verdade, eram sócios de empresas distintas, ambas do ramo de comércio de gás, sendo que um deles, inclusive, já havia deixado de fazer parte do quadro societário da empresa que lhe pertencia. Outro detalhe observado pela juíza foi que as empresas foram constituídas antes mesmo do início do contrato informado pelo trabalhador, o que, em tese, afasta a existência de sociedade de fato entre os envolvidos para a atuação no ramo comercial. Nesse quadro, a julgadora de primeira instância concluiu que o trabalhador deveria ter ajuizado a ação contra as empresas, que, supostamente, teriam sido o verdadeiro empregador, e não contra a pessoa física de seus sócios, já que a pessoa jurídica possui personalidade distinta de seus sócios. Assim, ela considerou que os réus não tinham legitimidade para compor o polo passivo da ação trabalhista, que foi extinta, sem resolução de mérito, na forma do art. 485 do CPC. Todo esse cenário foi constatado pelo relator do recurso, que manteve a decisão de primeiro grau.
Contribuiu para o entendimento do relator, seguido pela Turma, o fato de o trabalhador não ter, nem mesmo, informado o endereço da empresa na qual teria prestado seus serviços, além de não ter sido demonstrado que as empresas dos réus funcionavam no mesmo endereço comercial, o que, segundo o desembargador, afasta a hipótese de sociedade de fato para exploração da atividade econômica. “Não há nada que demonstre a condição de empregador dos réus, já que ambos possuíam sociedades empresárias distintas, regularmente constituídas e que exploravam o ramo de atividade de comércio de gás”, ponderou o desembargador. Ele frisou que não se pode reconhecer o vínculo diretamente com a pessoa física quando há uma sociedade empresária que assume os riscos da atividade econômica e admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço, de acordo com o artigo 2º da CLT. “Não houve sequer indícios de que os réus atuassem irregularmente no mercado ou que eles, como pessoas físicas, tivessem efetuado a contratação do trabalhador, o qual sequer informou o endereço do depósito ou depósitos de gás em que teria exercido suas atividades” – ponderou.
Em relação à desconsideração da personalidade jurídica, o desembargador destacou que ela deve ocorrer apenas para efeitos patrimoniais, ou seja, para garantir o pagamento do crédito trabalhista na fase execução, não autorizando que sócios de empresas distintas figurem como empregadores em substituição à própria pessoa jurídica para a qual se deu a prestação de serviços.
O recurso ficou assim ementado:
LEGITIMIDADE PASSIVA. VÍNCULO DE EMPREGO. SÓCIOS X SOCIEDADE EMPRESÁRIA.Não há nos autos elementos que demonstrem a legitimidade passiva dos reclamados, vez que possuíam empresas regularmente constituídas e exploravam o ramo de atividade de comércio de gás. Não se pode reconhecer o vínculo diretamente com a pessoa física quando há uma sociedade empresária que assume os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal dos serviços, na forma prevista no art. 2º da CLT.
Processo PJe: 0011165-55.2017.5.03.0029