Foi mantida pela 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) a sentença que negou os pedidos de revisão contratual e de garantia secundária, com acionamento ao Fundo Garantidor da Habitação Popular (FGHAB), de apelantes que sofreram redução na renda e eram devedores em contrato de compra e venda de imóvel residencial. O entendimento foi o de que acontecimentos exclusivamente subjetivos não autorizam a revisão contratual pela aplicação da Teoria do Rompimento da Base Objetiva do Contrato.
O caso chegou ao TRF1 por meio de apelação na qual os devedores argumentaram ter tido redução brusca na renda, não conseguindo adimplir com as prestações e, por esse motivo, acreditavam ser possível a revisão contratual para garantir a manutenção da renda/prestação conforme o inicialmente acordado entre as partes e o equilíbrio econômico-financeiro da relação pactuada. Para os apelantes, o adimplemento se tornou impossível “por força da excessiva onerosidade imposta no contrato, decorrente de cláusulas abusivas”.
Ao julgar o caso, o relator, desembargador federal Carlos Augusto Pires Brandão, considerou que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) adota a Teoria do Rompimento da Base Objetiva do Negócio Jurídico, prevendo, em seu art. 6º, ser direito básico do consumidor “a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas”. No entanto, ele ressaltou: “[…] diversamente da Teoria da Imprevisão, que exige imprevisibilidade e extraordinariedade como requisitos para possibilitar a revisão do contrato, a Teoria do Rompimento da Base Objetiva do Contrato se prende à quebra da base objetiva da relação contratual em que formado o negócio jurídico, com o consequente desequilíbrio entre as prestações, à luz do princípio da boa-fé e da finalidade do contrato”. Nesse sentido, a diminuição da renda do devedor, por exemplo, não autoriza a revisão contratual pela aplicação da Teoria do Rompimento, como já decidido em precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ), pois não enseja a quebra da base objetiva.
O magistrado afirmou ainda não caber ao Judiciário compelir a Caixa Econômica Federal à revisão do contrato em razão da diminuição da renda dos apelantes, pois isso seria objeto de negociação exclusiva das partes, em observância ao princípio da autonomia da vontade. Além disso, ao contrário do alegado pelos autores do recurso no TRF1, o desembargador federal considerou que não eram abusivas as normas questionadas no contrato.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. APELAÇÃO. REVISÃO CONTRATUAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO. SFH. PERÍCIA CONTÁBIL. DESNECESSIDADE. REDUÇÃO DA RENDA DEPOIS DA ASSINATURA DO CONTRATO. TEORIA DA BASE OBJETIVA DO CONTRATO. INAPLICABILIDADE. SAC. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. SEGURO. ABUSIVIDADES NÃO DEMONSTRADAS.
1. Trata-se de apelação interposta em face da sentença que julgou improcedente os pedidos formulados na inicial, que objetivavam a revisão contratual.
2. A controvérsia dos autos se refere a legalidade das cláusulas contratuais para eventual direito à revisão do contrato, tornando-se desnecessária a realização de perícia contábil, não ocasionando cerceamento de defesa. Além do que, o magistrado não é obrigado a acatar pedido de produção de prova quando entender que este não é necessário e pertinente ao deslinde do feito.
3. O Código de Defesa do Consumidor adota a Teoria do Rompimento da Base Objetiva do Negócio Jurídico, prevendo, em seu art. 6º, ser direito básico do consumidor: “V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;”
4. Diversamente da Teoria da Imprevisão, que exige imprevisibilidade e extraordinariedade como requisitos para possibilitar a revisão do contrato, a Teoria do Rompimento da Base Objetiva do Contrato se prende à quebra da base objetiva da relação contratual em que formado o negócio jurídico, com o consequente desequilíbrio entre as prestações, à luz do princípio da boa-fé e da finalidade do contrato.
5. Assim, acontecimentos exclusivamente subjetivos não autorizam a revisão contratual pela aplicação da Teoria do Rompimento da Base Objetiva do Contrato, como o caso de diminuição da renda do devedor. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
6. Não cabe ao Poder Judiciário compelir a Caixa Econômica Federal a proceder com revisão do contrato em razão da diminuição da renda da Apelante, sendo tal pleito objeto de negociação exclusiva das partes, em observância ao princípio da autonomia da vontade, mormente quando não demonstrada qualquer violação ao referido ajuste de vontades
7. O sistema de amortização previsto no contrato e utilizado pela Instituição Financeira foi o SAC e não a Tabela Price, como alega o apelante. Além disso, a adoção do SAC não implica, necessariamente, capitalização de juros, exceto na hipótese de amortização negativa, o que não ocorreu no caso dos autos.
8. Esta Corte, seguindo orientação do STJ acerca do tema, já firmou o entendimento de que, nos contratos firmados por instituições financeiras, posteriormente à edição da MP 1.963-17/2000, de 31/3/2000, reeditada sob o nº 2.170-36, é legítima a estipulação de capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano, desde que expressamente pactuada. (STJ: REsp 697379/RS, Relator MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Terceira Turma, DJ de 21.05.2007; AgRg no REsp 832162/RS, Relator MINISTRO JORGE SCARTEZZINI, Quarta Turma, DJ de 07/08/2006 e TRF: AC n. 0031595-85.2010.4.01.3400/DF – Relator Desembargador Federal KASSIO NUNES MARQUES – SEXTA TURMA6ª Turma – e-DJF1 de 28.09.2015; AC 0039436-72.2012.4.01.3300 / BA, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO, SEXTA TURMA, e-DJF1 de 20/09/2016). No presente caso, muito embora não prevista contratualmente, os apelantes não demonstram a utilização pela Instituição Financeira.
9. A jurisprudência deste Tribunal entende que o seguro habitacional não tem seu percentual determinado pelas partes contratantes, mas pelas normas do BACEN. Nesse sentido: (AC 0013865-72.1998.4.01.3500 / GO, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA MOREIRA, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL MÁRCIO BARBOSA MAIA (CONV.), QUINTA TURMA, e-DJF1 p.177 de 09/10/2014; TRF1, AC 0013088-45.2007.4.01.3800/MG, Rel. Desembargador Federal Kassio Nunes Marques, 6T, e-DJF1 de 24/02/2017; AC 1003744-64.2018.4.01.3500, DESEMBARGADOR FEDERAL DANIELE MARANHAO COSTA, TRF1 – QUINTA TURMA, PJe 24/04/2020). Além disso, as partes não comprovam a ilegalidade ou abusividade do valor previsto contratualmente.
10. Assim, em matéria contratual, ante a inexistência de cláusulas abusivas, prevalecem as regras livremente pactuadas, em respeito ao princípio expresso no brocardo latino: pacta sunt servanda.
11. Honorários advocatícios nos termos do art. 85, § 11, do CPC, que ora se acrescem em 2% ao valor fixado na sentença para a verba de sucumbência, suspensa a exigibilidade por serem os apelantes beneficiários da assistência judiciária gratuita.
12. Apelação desprovida.
A decisão foi unânime.
Processo 1003929-32.2019.4.01.3803