O 2º Juizado Especial da Fazenda Pública do DF julgou procedente pedido de um sargento aposentado para que o Distrito Federal custeie exames pré-operatórios e procedimento cirúrgico do autor em hospital credenciado à Polícia Militar do Distrito Federal – PMDF.
O autor informa que foi diagnosticado, em 2016, com hérnia inguinal, um problema de saúde que consiste num escape de uma alça do intestino por meio de um orifício que se forma na parede abdominal na região da virilha. Em fevereiro do ano passado, a orientação médica foi para cirurgia. O procedimento foi agendado e os exames pré-operatórios foram feitos. A cirurgia, porém, foi negada e, desde então, ele aguarda para que o procedimento seja realizado.
Em sua defesa, o Distrito Federal alega que a intervenção pretendida pelo autor é eletiva e sua marcação observa critérios de urgência, havendo uma fila de espera, na qual casos graves ocupam as primeiras colocações. Consta nos autos que o DF, em outra oportunidade, no entanto, informou que providenciaria o agendamento da referida cirurgia. O autor, em contrapartida, destacou que segue aguardando a providência.
A juíza explicou que o procedimento pretendido pelo servidor aposentado é do tipo eletivo, cuja realização depende da disponibilidade de médicos na rede hospitalar de saúde da ré, assim como disse o ente público, e que, por essa razão há uma fila classificada de acordo com a urgência, avaliada por médico da equipe do DF.
“Contudo, neste caso, o que se observa é que, atentando-se à urgência do quadro de saúde apresentado pelo autor, sua cirurgia já foi autorizada, como restou comprovado por documentos juntados aos autos pelo próprio réu, dos quais se extrai que, no dia 22/05/2019, a PMDF autorizou a cirurgia com todo material solicitado, podendo ser agendada pelo médico assistente, na data que definir”, explicou a magistrada.
Desta forma, definiu que o autor faz jus à cirurgia pretendida e aos exames pré-operatórios, preferencialmente na rede hospitalar onde realiza o acompanhamento médico da enfermidade. Pelo tempo de espera na fila e todo o desgaste sofrido, o sargento aposentado solicitou, ainda, R$ 40 mil em danos morais, que foi negado pela juíza, uma vez que foi constatado que não houve prática ilícita por parte do Estado que justifique a indenização.
Cabe recurso da sentença, recurso que ocorreu e o mesmo ficou assim ementado:
FAZENDA PÚBLICA. DIREITO À SAÚDE. PMDF. INJUSTIFICADA DEMORA À AUTORIZAÇÃO DE CIRURGIA DE HÉRNIA INGUINAL. DESCASO. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIAMENTE PROVIDO.
- Ação ajuizada pelo ora recorrente, em 06.05.2019, com vistas à condenação do DISTRITO FEDERAL na obrigação de realização de cirurgia de hérnia inguinal, em hospital conveniado da PMDF, bem como à reparação dos danos morais. Sentença de parcial procedência dos pedidos (determinada a realização do procedimento cirúrgico). Interesse recursal na condenação do Ente Federativo por danos extrapatrimoniais, estimados em R$ 40.000,00.
- II. De detida análise da moldura fático-processual, conclui-se pela configuração do dano moral, em razão da conduta omissiva e do descaso do DISTRITO FEDERAL (corresponsável pelos atos do sistema de saúde da Corporação: PMDF – TJDFT, 3ª TR, Acórdão 1159738). Para tanto, destaca-se que: (i) o paciente foi encaminhado ao ambulatório de cirurgia geral, em 02.2018 (ID 11690556); (ii) realizou os exames pré-operatórios, em 22.03.2018, inclusive a avaliação pré-anestésica, na qual constou “paciente orientado a levar os exames laboratoriais no dia do procedimento; jejum de 8 horas para alimentos sólidos e de 4 horas para água” (ID 11690560); (iii) no entanto, até a data do ajuizamento da demanda (maio/2019), não fora agendada a cirurgia.
III. Não se desconsidera a existência de critérios administrativos de prioridade ao atendimento na área de saúde. No entanto, no caso concreto, o acervo probatório não respalda a alegação de que o procedimento (classificado como “eletivo”) não teria sido realizado em razão da existência de outros pacientes na fila de prioridade. Com efeito, não se presta aos fins colimados (demonstração de atendimento à ordem de solicitação e aos riscos de “urgencialização”) a genérica e isolada conjectura de que “acredita-se que o caso do requerente, por não ser de extrema urgência foi preterido por outros de maior gravidade” (ID 11690578, p. 26), notadamente porque os documentos colacionados pelo DF evidenciam que o recorrente somente foi incluído no sistema de auditoria médica da PMDF, em 22.08.2018. Ademais, somente após o ajuizamento da demanda, o DISTRITO FEDERAL, ao requerer a suspensão do curso processual (em 25.05.2019), informou que procederia à reapreciação do pedido do servidor (cirurgia autorizada em 22.05.2019, com todo o material solicitado – ID 11690578, p. 10).
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IV. Nesse contexto probatório, revestem-se de verossimilhança as alegações recursais de que: (i) “em momento algum o recorrente desejou atendimento prioritário, passar a frente de outras pessoas que também aguardam seu direito, se não houvesse um pedido liminar, não seria possível precisar quando o procedimento cirúrgico seria realizado, porém, serviu para balançar as estruturas e desengavetar o pedido administrativo”; (ii) “o recorrente jamais foi informado que estava aguardando em fila e sim que sua cirurgia já tinha sido marcada inclusive com equipe médica, técnicos em enfermagem e anestesistas no Hospital Maria Auxiliadora no dia 22/08/2018, esperando apenas a autorização da PMDF ou autorização para uso de material cirúrgico, o que foi negado sem qualquer justificativa. Portanto, se evidencia conduta desidiosa da ré, pois a não realização da cirurgia foi única e exclusivamente por falta de autorização da PMDF e não em razão da fila de espera que aguarda atendimento cirúrgico eletivo, pois este tipo de cirurgia segue o critério de autorização, como ordem de solicitação e riscos, ademais; a PMDF possui convênio com diversos hospitais particulares diferentemente do SUS”.
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V. A injustificada demora à autorização do procedimento (mais de uno após o pedido médico e cerca de 10 meses após a inclusão no sistema de perícia da PMDF) subsidia, portanto, a reparação por danos morais, ora fixados em R$ 3.000,00 (três mil reais). Não se adota a estimativa da inicial (R$ 40.000,00), à míngua de demonstração de situação de urgência/emergência, ou de agravamento do quadro de saúde do recorrente, de sorte que o valor ora fixado se mostra suficiente a compensar os incontestes dissabores experimentados, sem proporcionar enriquecimento indevido.
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Recurso conhecido e parcialmente provido, para condenar o DISTRITO FEDERAL a pagar a WILMAR DIVINO DE MELO, a título de danos morais, a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais), corrigida monetariamente a partir do arbitramento, e acrescida de juros legais a partir da citação. No mais, sentença confirmada por seus fundamentos. Sem custas processuais nem honorários advocatícios, á míngua de recorrente integralmente vencido.