Para o reconhecimento do direito à nomeação, foram usadas informações do Tribunal de Contas da União (TCU)
A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou examinar recurso em que a Caixa Econômica Federal questionava decisão em que foi reconhecido o direito à contratação de um advogado, a partir de informações obtidas pelo juiz em pesquisa na internet. Para o colegiado, o magistrado pode utilizar todos os meios de prova que considerar necessários para formar sua convicção, e a pesquisa na internet é um meio válido.
Escritórios
Na ação trabalhista, o trabalhador, de Belo Horizonte (MG), buscava ver reconhecido seu direito à nomeação no cargo de advogado júnior. Ele havia sido aprovado em 35º lugar no concurso público da CEF de 2012 para cadastro reserva. Contudo, sua expectativa de contratação estava sendo frustrada porque a Caixa vinha contratando escritórios de advocacia.
Desvio de postos de trabalho
O pedido foi inicialmente indeferido pelo juízo de primeiro grau. Mas, para o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), a CEF não conseguiu demonstrar as diferenças entre as atividades desempenhadas pelos seus advogados concursados, por profissionais terceirizados e por escritórios credenciados. Para o TRT, ficou caracterizado o desvio de postos de trabalho que deveriam ser ocupados por advogados aprovados em concurso público.
TCU
Em sua fundamentação, o TRT utilizou informações disponíveis no sítio eletrônico do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre diversas decisões em que a corte de contas havia determinado à Caixa a elaboração de um plano de ação para adequar o quantitativo de servidores efetivos da carreira de advogado necessários para fazer frente às suas demandas judiciais.
Nessas decisões, a CEF fora alertada para a necessidade de fazer concurso público para evitar o excesso de contratação de serviços advocatícios, pois seu plano de cargos e salários inclui o cargo de “advogado júnior”. O TRT concluiu, então, que o trabalhador tinha direito à contratação imediata nesse cargo.
“Documentos estranhos aos autos”
No recurso de revista, a Caixa alegou que os documentos extraídos da internet eram estranhos aos autos, e a decisão do TRT teria violado os princípios do contraditório e da ampla defesa, ao não dar oportunidade de discussão sobre eles.
Validade da pesquisa
O relator, ministro Augusto César, assinalou que, conforme o artigo 131 do CPC de 1973 (vigente na data da decisão do TRT), o juiz deve apreciar livremente a prova, atendendo aos fatos e às circunstâncias do processo, ainda que não tenham sido alegados pelas partes. Há situações em que a lei restringe os meios de prova, mas esse não foi o caso do processo. Assim, o juiz pode usar todos os meios probatórios que considerar necessários para formar sua convicção.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO ANTES DA LEI 13.015/2014. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. CONTRADITA DE TESTEMUNHA. TERCEIRIZAÇÃO LÍCITA DE ATIVIDADE-MEIO. DECISÕES EXTRAÍDAS DA INTERNET. NÚMERO RELATIVO À TERCEIRIZAÇÃO DA ATIVIDADE JURÍDICA. DEMAIS APROVADOS NO CONCURSO. DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA. DA TUTELA DEFINITIVA. A autonomia na valoração da prova não afasta a necessidade de adequada motivação. Dessa forma, a partir da apreciação dos fatos e das provas consignadas no processo, o magistrado deve expor, de forma fundamentada, os motivos de sua decisão – o que efetivamente ocorreu no caso concreto. Como se observa da leitura dos acórdãos proferidos no julgamento do recurso ordinário e dos embargos de declaração apresentados pela parte, o Regional esboçou tese explícita sobre todas as questões ditas como omissas. Constata-se, portanto, que o acórdão atendeu aos comandos dos artigos 832 da CLT, 489 do CPC e 93, IX, da CF. Importante consignar que a adoção de tese contrária aos interesses da parte não implica nulidade por negativa de prestação jurisdicional. Recurso de revista não conhecido.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. TEMA 992 DE REPERCUSSÃO GERAL. MODULAÇÃO DE EFEITOS. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em 05/03/2020, no julgamento do RE 960.429/RN, em sede de repercussão geral (Tema 992), fixou a tese de que ” compete à Justiça Comum processar e julgar controvérsias relacionadas à fase pré-contratual de seleção e de admissão de pessoal e eventual nulidade do certame em face da Administração Pública, direta e indireta, nas hipóteses em que adotado o regime celetista de contratação de pessoas, salvo quando a sentença de mérito tiver sido proferida antes de 6 de junho de 2018, situação em que, até o trânsito em julgado e a sua execução, a competência continuará a ser da Justiça do Trabalho.” Estando o presente processo enquadrado na aludida modulação, porquanto a sentença fora proferida em 2013, reconhece-se a competência dessa Justiça Especializada para o deslinde da controvérsia, conforme bem decidiu o TRT. Recurso de revista não conhecido.
LITISCONSÓRIO PASSIVO NECESSÁRIO. No caso, o Regional entendeu não haver litisconsórcio passivo necessário entre a CEF e os candidatos precedentes ao reclamante no concurso e tampouco em relação aos escritórios de advocacia credenciados. Asseverou não se fazer presente a hipótese descrita no art. 47 do CPC de 1973 no sentido de haver disposição de lei obrigando o Juiz a decidir a lide de modo uniforme para todas as partes. Salientou que a natureza da relação jurídica não impõe decisão uniforme abrangendo a CEF, os demais candidatos aprovados no concurso e os escritórios contratados, dada a diversidade de interesses em jogo. Destacou, ainda, que o interesse econômico dos escritórios de advocacia é diametralmente oposto ao interesse dos demais candidatos aprovados no concurso. Logo, não se vislumbra a violação direta e literal ao art. 47 do CPC de 1973 (vigente na data da publicação do acórdão recorrido). O único aresto colacionado é inservível ao confronto de teses, pois, oriundo do STJ, não encontra previsão na alínea “a” do art. 896 da CLT. Recurso de revista não conhecido.
NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA. CONTRADITA DA TESTEMUNHA. JULGAMENTO EXTRA PETITA. No caso, o Regional consignou que, não obstante a contradita com fundamento de interesse na causa por ser advogado da CEF ter sido indeferida pela magistrada, é incontroverso que o advogado, indicado como testemunha pela ré, também foi indicado para atuar como procurador da reclamada na presente demanda, inclusive com procuração nos autos. Assim, entendeu que a testemunha esteve habilitada a intervir no feito, devendo ser acolhida a contradita. Destacou, também, que o depoimento tem validade como informações prestadas ao juízo. Logo, não se vislumbra a violação dos arts. 795, caput, da CLT e 405 e 460 do CPC de 1973 (vigente na data da publicação do acórdão recorrido). Ademais, verifica-se que o Regional considerou o depoimento da referida testemunha, mas não acolheu a tese patronal. Consignou que, muito embora haja prova nos autos demonstrando a contratação de alguns candidatos aprovados no concurso, entendeu que houve abuso de direto praticado pela reclamada ao contratar reiteradamente escritórios de advocacia, enquanto havia o cargo de advogado em seu PCS. Nesse contexto, não foi demonstrada a existência de prejuízo da reclamada com relação à contradita da testemunha da reclamada, não se justificando a nulidade processual, pois, nos termos do art. 794 da CLT, no processo trabalhista só haverá nulidade quando o ato inquinado resultar manifesto prejuízo às partes litigantes. Recurso de revista não conhecido.
CONCURSO PÚBLICO. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. CONTRATAÇÃO DE TERCEIRIZADOS. PRETERIÇÃO. A decisão regional está em sintonia com o entendimento pacífico desta Corte Superior no sentido de que, embora a aprovação de candidato em concurso público realizado para preenchimento de cadastro de reserva não gere, por si só, direito subjetivo à nomeação, mas apenas expectativa de direito, a contratação precária de pessoal, seja por comissão, terceirização ou contratação temporária, para o exercício das mesmas atribuições do cargo para o qual fora realizado o certame, no prazo de validade do concurso público, configura preterição de candidatos aprovados, evidenciando desvio de finalidade, em afronta ao art. 37, II, da Constituição Federal. Há precedentes. Óbice da Súmula 333 do TST. Recurso de revista não conhecido.
DOCUMENTOS EXTRAÍDOS DA INTERNET. Nos termos do art. 131 do CPC de 1973 (vigente na data da publicação do acórdão recorrido), o juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes nos autos, ainda que não alegados pelas partes, devendo, no entanto, indicar na decisão os motivos que lhe formaram o convencimento. Quando a lei dispõe que somente por determinado meio se prova um fato, é que há limite na apreciação da prova, não sendo essa a situação dos autos. No caso, conforme esclarecido na decisão recorrida, o magistrado pode valer-se de todos os meios probatórios que considerar necessários para formar sua convicção, sendo a pesquisa na internet um meio válido. Nesse contexto, não se vislumbra a violação dos arts. 130 do CPC de 1973 (vigente na data da publicação do acórdão recorrido) e 5º, LV, da Constituição Federal. Recurso de revista não conhecido.
ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REQUISITOS. O Regional consignou a existência não apenas da verossimilhança da alegação, mas do próprio direito do reclamante à nomeação, tanto que foi conferido provimento ao seu recurso. Destacou, ainda, não sobrevir nenhum dano à reclamada em caso de reversão desta decisão, pois a Caixa terá feito uso da mão de obra do autor, ocorrendo apenas a contraprestação pecuniária pela prestação dos serviços de advocacia. Nesse contexto, não se vislumbra a violação do art. 273 do CPC de 1973 (vigente na data da publicação do acórdão recorrido). Recurso de revista não conhecido.
MULTA DIÁRIA. ASTREINTE . Os incisos XXV e LV do art. 5º da Constituição Federal não tratam de multa diária (astreinte), não estando demonstrada, portanto, a violação direta e literal às referidas normas constitucionais. Recurso de revista não conhecido.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-2416-91.2012.5.03.0007