Contrato de troca ou permuta não se equipara a de compra e venda na esfera tributária

A 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1 Região (TRF1) decidiu anular o auto de infração da Fazenda Nacional que havia sido lavrado em desfavor do autor do recurso protocolado na Corte. De acordo com os autos, após incorporar a participação societária de diversas empresas para que ficassem concentradas em uma só, as participações de outros sócios foram também incorporadas a esta nova empresa, cabendo ao autor do processo, um dos sócios, um pequeno percentual destas participações em forma de ações.

Em sua declaração de Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), optou por manter o valor patrimonial que detinha anteriormente (valor original), mas a Fazenda Nacional (União) entendeu que deveria considerar o valor de mercado das ações e lavrou um auto de infração no valor de R$ 22.681.591,27. Ao julgar o processo, o juízo negou o pedido do autor de anular o auto de infração e o autor, inconformado, recorreu ao TRF1.

O relator do processo na 8ª Turma do TRF1, desembargador federal Marcos Augusto de Sousa, explicou que, segundo o art. 23 da Lei 9.249/1995 (que trata do imposto de renda das pessoas jurídicas), quando a pessoa física incorpora bens ou direitos do capital de pessoa jurídica, pode optar por reconhecer em seu imposto de renda a participação societária pelo valor original ou de mercado.

Sem ganho de capital – No caso concreto, o apelante decidiu pelo valor original das ações que recebeu, sem ganho patrimonial. Isso porque, prosseguiu o relator, a incorporação das ações por ele não implicou em recebimento de valores em dinheiro, não havendo ganho de capital até mesmo porque havia uma cláusula expressa que impedia a venda das referidas ações naquele momento.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem orientação no mesmo sentido, de que “o contrato de troca ou permuta não deverá ser equiparado na esfera tributária ao contrato de compra e venda, pois não haverá, na maioria das vezes, auferimento de receita, faturamento ou lucro na troca”, citou o magistrado.

Ademais, observou que a Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) emitiu orientação no sentido de que “o fato gerador do IRPF somente será apurado a partir do momento em que ocorrer a disponibilidade financeira do rendimento, sob pena de se tributar mera presunção de ganho, violando o princípio da capacidade contributiva”, ou seja, somente poderia ser cobrado o imposto quando fosse possível vender as ações.

O recurso ficou assim ementado:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RITO ORDINÁRIO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. INCORPORAÇÃO DE AÇÕES DE EMPRESAS. ART. 3º, § 3º, DA LEI 7.713/88 E ART. 23 DA LEI 9.249/95. GANHO DE CAPITAL. INEXISTÊNCIA. FATO GERADOR DO TRIBUTO. INOCORRÊNCIA. ART. 116 DO CTN. PRECEDENTES DO STJ E DO TRF DA 4ª REGIÃO. ORIENTAÇÃO DO CARF. APELAÇÃO PROVIDA.

1. “(…) (b) a avaliação das ações da empresa para a obtenção do valor de mercado é decorrência de uma imposição legal (art. 252, § 1º, da Lei 6.404/76); (c) o contribuinte pessoa física autuado manteve em sua declaração de ajuste o valor que dela já constava, não considerando a mais valia decorrente da avaliação que, frise-se, decorre de imposição legal; (d) a incorporação de ações, no caso, mesmo que se considere uma alienação, não implicou em recebimento de valores em dinheiro, tendo ocorrido, segundo a doutrina que aderiu a maioria do colegiado, mera substituição de ações, sendo o aumento de capital daí decorrente apenas meio e não fim; (e) a substituição de ações, portanto, não gera ganho de capital tributável pelo IRPF, por se constituir em mera troca de ações. Não se aplica, por conseguinte, na espécie, a regra constante no artigo 3º, § 3º, da Lei n. 7.713/88, nem tampouco a inserta no artigo 23 da Lei nº 9.249/95, esta última um dos fundamentos básicos do ato fiscal; (f) a tributação pelo imposto de renda pessoa física, na hipótese, representaria tributação sobre renda virtual, transformando-se em tributação sobre o patrimônio e não sobre renda efetivamente auferida, ofendendo, ainda, o princípio da capacidade contributiva e o regime de caixa, regra geral de tributação do imposto de renda da pessoa física” (APELREEX 5052793-42.2011.4.04.7000, TRF-4ª Região, Segunda Turma, Rel. p/ acórdão Des. Fed. Otávio Roberto Pamplona, D.E. 12/10/2015).

2. Inteligência da orientação formada pelo STJ no REsp 1733560/SC, no sentido de que ” (…) o contrato de troca ou permuta não deverá ser equiparado na esfera tributária ao contrato de compra e venda, pois não haverá, na maioria das vezes, auferimento de receita, faturamento ou lucro na troca. Nesse sentido a lição do professor Roque Antônio Carrazza, em seu livro Imposto sobre a Renda, ed. Malheiros, 2ª edição, pag.45, para quem ‘renda e proventos de qualquer natureza são os acréscimos patrimoniais líquidos ocorridos entre duas datas legalmente predeterminadas'” (Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 21/11/2015).

3. O art. 116, I, do CTN dispõe que “salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos: tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios”. Não se pode olvidar da existência, à época da lavratura do auto de infração em comento, regendo a negociação levada a efeito, de expressa cláusula suspensiva que impedia a alienação das ações, o que também afasta a caracterização da hipótese de incidência do imposto de renda na espécie, valendo ressaltar que a possibilidade de ganho como resultado da incorporação apenas passou a existir no ano de 2012, quando a referida cláusula suspensiva já permitia a venda de vinte por cento (20%) das ações, e assim sucessivamente, a partir de quando, efetivadas as operações, o tributo foi regularmente recolhido pelo apelante, fato incontroverso nos autos.

4. No âmbito do próprio CARF, há orientação no sentido de que “a operação de incorporação de ações pode representar um ganho patrimonial ao contribuinte, entretanto, observadas as normas que regem a matéria o fato gerador do IRPF somente será apurado a partir do momento em que ocorrer a disponibilidade financeira do rendimento, sob pena de se tributar mera presunção de ganho, violando o princípio da capacidade contributiva” (Acórdão 9202-009.948 CSRF/2ª Turma, Sessão de 24/09/2021).

5. Apelação provida.

O colegiado, por unanimidade, decidiu anular o auto de infração, nos termos do voto do relator.

Processo: 1003145-62.2017.4.01.3500

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