Auxiliar de fábrica de pneus contratado por prazo determinado tem direito à estabilidade acidentária

A lei não faz distinção entre o tipo de contrato.

A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso da Pirelli Pneus Ltda., de Gravataí (RS), contra o reconhecimento do direito à estabilidade a um auxiliar de produção, contratado por prazo determinado, que sofreu acidente de trabalho. Conforme o colegiado, a lei, ao garantir estabilidade provisória à vítima de acidente de trabalho, não faz distinção entre contratos por prazo determinado e indeterminado.

Acidente

O auxiliar foi contratado pela Pirelli em julho de 2008 na condição de “gola vermelha”, espécie de contrato de experiência. Em setembro do mesmo ano, enquanto abastecia uma máquina com lona de pneu, teve o seu braço puxado  e fraturou o cotovelo. Com isso, ficou afastado pela Previdência Social até março de 2009. Quatro meses depois, no prazo previsto para o término do contrato, foi dispensado.

Na reclamação trabalhista, ele sustentou a nulidade da dispensa e pediu a reintegração ou o pagamento de indenização substitutiva, com o argumento de que teria direito à estabilidade acidentária de 12 meses após o fim do benefício previdenciário.

Garantia de emprego ao acidentado

O pedido foi julgado improcedente pelo juízo de primeiro grau, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) deferiu a indenização, com o entendimento que a Lei da Previdência Social (Lei 8.212/1991) não exclui o trabalhador contratado por prazo determinado da garantia de emprego. Ainda segundo o TRT, como consequência do acidente, há a manutenção do contrato pelo prazo de 12 meses após a alta previdenciária ou o pagamento das parcelas salariais devidas no período.

Sem restrição expressa

O relator do recurso de revista da Pirelli, ministro Caputo Bastos, assinalou que não há, na lei, restrição expressa quanto ao tipo de contrato de trabalho, “não cabendo ao julgador, portanto, aplicá-la”. Ainda conforme o relator, a decisão do TRT está de acordo com a Súmula 378 do TST, segundo a qual o empregado submetido a contrato de trabalho por tempo determinado goza da garantia provisória de emprego decorrente de acidente de trabalho.

O recurso ficou assim ementado:

I) AGRAVO DE INSTRUMENTO DO RECLAMANTE.

1. INTERVALO INTRAJORNADA. JORNADA DE TRABALHO LEGAL DE SEIS HORAS DIÁRIAS. PROVIMENTO.

Em vista de possível contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 307 da SBDI-1, convertida na Súmula nº 437, IV, o provimento do agravo de instrumento é medida que se impõe, para melhor exame do recurso de revista.

Agravo de instrumento a que se dá provimento.

II) RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE.

1. DANOS MORAIS E MATERIAIS. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. SÚMULA Nº 296. NÃO CONHECIMENTO.

Constata-se que os arestos trazidos a cotejo pelo recorrente para comprovar a alegada divergência jurisprudencial mostram-se inservíveis, porquanto são inespecíficos, nos termos da Súmula nº 296, uma vez que não tratam de situação fática semelhante a dos autos.

Recurso de revista de que não se conhece.

2. INTERVALO INTRAJORNADA. JORNADA DE TRABALHO LEGAL DE SEIS HORAS DIÁRIAS. SÚMULA Nº 422. NÃO CONHECIMENTO.

O Tribunal Regional concluiu que o reclamante fazia jus ao intervalo intrajornada de apenas 15 minutos, tendo em vista que sua jornada legal era de 6 horas diárias, por trabalhar no sistema de turnos ininterruptos de revezamento. Assim, entendeu que o tempo devido restou atendido pelos 30 minutos concedidos pela empregadora, excluindo, por conseguinte, a respectiva condenação.

Ocorre que o reclamante, nas razões do seu recurso de revista, não impugnou o fundamento do acórdão regional de que o intervalo intrajornada se relaciona com a jornada legal, sustentando, apenas, a tese de ser devido o pagamento integral do intervalo de uma hora, e não apenas dos minutos faltantes.

Isto significa que o reclamante não se insurgiu de forma direta e específica contra a fundamentação lançada na decisão recorrida. Tal conduta é, a meu ver, processualmente incorreta, uma vez que a parte, ao assim proceder, vem demonstrar seu inconformismo, sem se insurgir, fundamentadamente, nos termos do artigo 1.016, III, do CPC/15, contra a decisão que deveria impugnar. Tem-se, portanto, como desfundamentado o recurso de revista, incidindo na hipótese o entendimento perfilhado na Súmula nº 422, I.

Esclareça-se que, embora o agravo de instrumento do reclamante tenha sido provido, em razão da possibilidade de contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 307 da SBDI-1, convertida na Súmula nº 437, IV, o exame do recurso destrancado não fica vinculado ao resultado do agravo de instrumento.

Recurso de revista de que não se conhece.

3. ADICIONAL NOTURNO. PRORROGAÇÃO. JORNADA NOTURNA. DIFERENÇAS. NÃO CONHECIMENTO.

O egrégio Tribunal Regional dirimiu a controvérsia, mediante análise de prova, insuscetível de reexame nesta fase extraordinária, nos termos da Súmula nº 126.

No caso, concluiu a egrégia Corte a quo que a reclamada comprovou ter remunerado corretamente a hora noturna, não tendo o reclamante demonstrado diferenças devidas a seu favor.

Recurso de revista de que não se conhece.

I) RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA .

1. JULGAMENTO ULTRA PETITA . HORAS EXTRAORDINÁRIAS. NÃO CONHECIMENTO.

Os artigos 141 e 492 do CPC/15 (artigos 128 e 460 do CPC/73) exigem que o órgão julgado decida a lide nos limites em que foi proposta, sendo certo que tais contornos são fixados com base nos pedidos formulados na inicial e nos argumentos trazidos em contestação.

No caso , observa-se que na petição inicial, o reclamante postulou o pagamento de horas extraordinárias, consignando labor além de seis horas, intervalo intrajornada reduzido, e labor em jornada noturna, sem as respectivas contraprestações.

Ademais, a reclamada, em sua contestação, alegou como óbice à pretensão do reclamante a existência de acordo de compensação previsto em norma coletiva, para elastecimento do labor em turnos ininterruptos de revezamento, com jornada de 8 horas e intervalo intrajornada de 30 minutos.

Portanto, diversamente do alegado, não houve julgamento ultra ou extra petita , visto que a lide foi dirimida dentro dos limites em que foi proposta.

Recurso de revista de que não se conhece.

2. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRABALHO. REDUÇÃO PARCIAL E PERMANENTE DA CAPACIDADE LABORATIVA. CONFIGURAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO.

Segundo os artigos 186 e 927 do CC, o dever de compensar eventual dano passa, inevitavelmente, pela associação dos três elementos da responsabilidade aquiliana, quais sejam: conduta do agente, resultado lesivo ou dano e nexo de causalidade entre a conduta e o dano; e a presença, em face da regra da responsabilidade subjetiva, dos elementos subjetivos do tipo: dolo ou culpa do agente causador.

No presente caso, a partir da análise dos fatos e das provas, o egrégio Colegiado Regional consignou a premissa fática inconteste de que o reclamante sofreu acidente de trabalho, com fratura do cotovelo, que acarretou perda parcial e permanente de sua capacidade laboral. Registrou, ainda, que tal infortúnio decorreu da culpa da reclamada, visto que não adotou medidas eficazes de segurança e prevenção para proporcionar ao reclamante um ambiente de trabalho sadio e seguro.

Estão presentes, portanto, os elementos caracterizadores da responsabilidade civil, razão pela qual a reclamada foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais e materiais.

Recurso de revista de que não se conhece.

3. DANO MORAL E MATERIAL. ACIDENTE DE TRABALHO. REDUÇÃO PARCIAL E PERMANENTE DA CAPACIDADE LABORATIVA. QUANTUM ARBITRADO. NÃO CONHECIMENTO.

A fixação do quantum debeatur deve orientar-se pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, considerando-se, também, outros parâmetros, como o ambiente cultural dos envolvidos, as exatas circunstâncias do caso concreto, o grau de culpa do ofensor, a situação econômica deste e da vítima, a gravidade e a extensão do dano.

No caso , o reclamante, em razão das funções que desempenhava para a reclamada, sofreu acidente de trabalho que acarretou redução parcial e permanente de sua capacidade laborativa, da ordem de 7,5%. Tal infortúnio decorreu da culpa da reclamada, visto que não proporcionou ao reclamante um ambiente de trabalho seguro para desempenhar suas funções, deixando de implementar medidas eficazes de prevenção e segurança, capazes de evitar que as lesões acontecessem.

Desta forma, o egrégio Tribunal Regional fixou o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), a título de compensação por dano moral.

Embora entenda que não se possa estabelecer critério subjetivo para a fixação do valor do dano moral, em razão de tal quantum compensatório decorrer de critérios objetivos, consoante exegese do artigo 944 do CC, no caso concreto, é possível inferir que o montante arbitrado observa o princípio da razoabilidade e proporcionalidade. No que se refere aos danos materiais, a decisão regional manteve a sentença que condenou a reclamada ao pagamento de pensão mensal e vitalícia, desde a data do acidente, no percentual de 7,5% de 1,66 (um vírgula sessenta e seis) salários mínimo, em parcelas vencidas e vincendas, em razão da ocorrência de lesão física (fratura de cotovelo, com déficit de 15 graus, com perda da capacidade laboral estimada em 7,5%) e o nexo de causalidade entre esta e o trabalho prestado como auxiliar de produção.

O artigo 950 do CC determina que a pensão a ser paga ao ofendido que tem sua capacidade laboral diminuída deve ser proporcional a esta diminuição.

Assim, considerando a premissa fática consignada no v. acórdão regional de que, in casu , a incapacidade do reclamante é parcial e permanente, da ordem de 7,5%, segundo a tabela DPVAT, deve ser mantido o valor da pensão proporcional ao dano.

Considerando, pois, que o arbitramento dos valores baseou-se nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, não há falar em afronta aos artigos 884, 944 e 945 do CC, porquanto compatíveis com a extensão do dano.

Recurso de revista de que não se conhece.

4. PENSÃO MENSAL. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. ARTIGO 533 DO CPC (475-Q DO CPC/73). NÃO CONHECIMENTO.

O artigo 950 do Código Civil contempla a hipótese de pensão vitalícia por lesão que incapacite total ou parcialmente o lesado para o trabalho, admitindo, em seu parágrafo único, a opção do lesado por receber uma indenização única, a ser arbitrada pelo juiz.

Por outro lado, o artigo 533 do CPC (antigo artigo 475-Q do CPC/73), aplicável subsidiariamente ao processo do trabalho, nos termos do permissivo do artigo 769 da CLT, autoriza a formação de capital para cumprimento de obrigação decorrente de ato ilícito, de natureza alimentícia – hipótese ora reconhecida -, de forma a assegurar o pagamento mensal da pensão. Assim, a determinação de formação de capital decorre de faculdade conferida ao magistrado pelo referido preceito de lei, inserindo-se no âmbito do convencimento motivado do julgador 371 do CPC (antigo artigo 131 do CPC/73). Precedentes.

Recurso de revista de que não se conhece.

5. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. NÃO CONHECIMENTO.

O artigo 118 da Lei nº 8.213/91, ao garantir estabilidade provisória ao segurado que sofre acidente de trabalho, não faz distinção entre contrato de trabalho por prazo determinado e contrato de trabalho por prazo indeterminado. Assim, mesmo quando se trata de contrato por tempo determinado, faz jus o reclamante à garantia provisória de emprego decorrente de doença profissional ou acidente de trabalho ocorrido durante a vigência do contrato de trabalho por prazo determinado. Inteligência da Súmula nº 378, III. Precedentes. Incidência da Súmula nº 333 e do artigo 896, § 7º, da CLT.

Recurso de revista de que não se conhece.

6. LABOR EM TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. NORMA COLETIVA AUTORIZANDO A PRORROGAÇÃO DA JORNADA DIÁRIA ATÉ 8 HORAS DIÁRIAS E 44 HORAS SEMANAIS. VALIDADE. SÚMULA Nº 423. PROVIMENTO.

Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, para os empregados submetidos a turnos ininterruptos de revezamento, é válida a fixação de jornada superior a seis horas, respeitado o limite de oito horas diárias, desde que autorizada por negociação coletiva e não configurada a prestação de horas extras habituais. Nesse caso, não há falar no pagamento das 7ª e 8ª horas como extraordinárias (Súmula nº 423).

Na hipótese , o egrégio Tribunal Regional condenou a reclamada ao pagamento das horas extraordinárias excedentes da 36ª semanal, ao fundamento de que a norma coletiva apenas poderia alterar o limite diário da jornada de 6 para 8 horas, não sendo possível, contudo, a alteração do limite semanal de 36 para 44 horas.

Resta incontroverso, no caso, que o autor laborava em jornada de 8 horas diárias, no regime de turno ininterrupto de revezamento, autorizado por norma coletiva, não havendo reconhecimento de labor excedente de 8 horas e 44 horas semanais, tendo o próprio reclamante informado que sua jornada era das 6h às 14h, das 14h às 22h e das 22h às 06h.

Assim, se a norma coletiva em questão respeitou os limites constitucionais e legais da jornada de trabalho diária e semanal, deve ser reconhecida a sua validade.

Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.

7. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. INFLAMÁVEIS. NÃO CONHECIMENTO.

Consoante o entendimento pacífico deste Tribunal, em interpretação às disposições do artigo 193 da CLT, faz jus ao adicional de periculosidade não só o empregado exposto permanentemente, mas também aquele que, de forma intermitente, sujeita-se a condições de risco em contato com inflamáveis e/ou explosivos, sendo indevido apenas quando o contato se dá de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou o que, sendo habitual, ocorre em tempo extremamente reduzido.

No caso , a egrégia Corte Regional, com base no exame dos fatos e das provas do processo, registrou que havia no ambiente de trabalho do reclamante quantidade superior a 200 litros de inflamáveis armazenados, sendo que tal armazenamento, dentro do pavilhão da empresa, caracterizava todo o recinto como área de risco, na forma do item 3, “m” e “s”, da NR 16, em seu Anexo 2, enquadrando-se as atividades do reclamante como periculosas, o que torna devido o adicional de periculosidade. Premissas fáticas incontestes à luz da Súmula nº 126. Inteligência da Súmula nº 364.

Recurso de revista de que não se conhece.

8. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. JUSTIÇA DO TRABALHO. REQUISITOS. SÚMULA Nº 219, I. AÇÃO AJUIZADA ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. PROVIMENTO.

É pacífico o entendimento, no âmbito deste Tribunal Superior, no sentido de que mesmo após o advento da Constituição Federal de 1988, na Justiça do Trabalho, os honorários advocatícios não decorrem exclusivamente da sucumbência, devendo a parte comprovar, concomitantemente, estar assistida por sindicato da categoria profissional e a percepção de salário inferior ao dobro do mínimo legal, ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família.

Na hipótese, restou incontroverso que o reclamante não está assistido por sindicato de classe, não fazendo jus a percepção dos honorários advocatícios. Inteligência da Súmula nº 219, I.

Recurso de revista de conhecido e provido.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-130100-81.2009.5.04.0231

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