A 6ª Turma do TRF da 1ª Região, por unanimidade, negou provimento à apelação interposta pela União contra a sentença, da 9ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, que, em mandado de segurança, concedeu a ordem para assegurar ao apelado a sua matrícula no curso de reciclagem de formação de vigilante, a despeito da existência, em seu desfavor, de ação em trâmite na 3ª Vara Criminal da Comarca de Divinópolis/MG, por crime de furto qualificado.
Em suas razões, a União alegou que entre os vários requisitos para o exercício da profissão de vigilante, estão o de não apresentar antecedentes criminais, o qual não teria sido preenchido pelo impetrante.
Ao analisar o caso, o relator, desembargador federal Kassio Marques, esclareceu que ao se estabelecer normas para constituição e funcionamento das empresas particulares que exploram serviços de vigilância e de transporte de valores, a Lei nº 7.102/83, estabeleceu a inexistência de antecedentes criminais registrados como um dos requisitos a serem preenchidos pelo vigilante para o exercício de sua profissão. Asseverou que tal dispositivo está em harmonia com a previsão constitucional que condiciona o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão ao atendimento das “qualificações profissionais que a lei estabelecer”. (inciso XIII do art. 5º).
O magistrado destacou que, de certo modo, o Estatuto do Desarmamento condicionou o porte de arma dos empregados das empresas de segurança privada e de transporte de valores à apresentação de certidão negativa de antecedentes criminais. Porém, o art. 38 do Decreto 5.123/2004 estipula que a autorização para o uso de arma de fogo, expedida em nome daquelas empresas pela Polícia Federal, deve ser precedida do atendimento de vários requisitos, entre os quais está justamente a comprovação de ausência de antecedentes criminais dos respectivos prepostos.
O desembargador concluiu, entretanto, que em uma pesquisa realizada na internet, não constatou a prolação de sentença de condenação na ação proposta em desfavor do autor perante a Comarca de Divinópolis; que na mesma pesquisa, não encontrou a indicação da existência de outras ações contra o autor; que as duas pesquisas, no site do TRF1, bem como das Seções Judiciária do Distrito Federal e do Estado de Minas Gerais, é possível emitir certidões de que nada consta referente ao CPF do impetrante.
Desse modo, “caracterizada a natureza episódica e isolada do evento criminoso no qual supostamente envolvido o impetrante, reputo condizente a sua vida pregressa com a necessária idoneidade moral exigida para fins da pretendida certificação profissional”, finalizou.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE VIGILANTE. ANTECEDENTES CRIMINAIS. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E NORMAS LEGAIS. PONDERAÇÃO. 1. O aparato estatal foi induvidosamente dotado, tanto pelo legislador constitucional como infraconstitucional, da prerrogativa de impor limites objetivos ao exercício de atividades profissionais. E, nesse âmbito, se insere a prática do ato de habilitação ao exercício da atividade de vigilante, o qual tangencia a própria incolumidade pública. 2. A despeito do arcabouço legal e constitucional que visa a preservar o bem jurídico imaterial da paz pública (inciso VI do art. 16 da Lei 7.102/83 c/c o inciso XIII do art. 5°), este Regional Federal vem seguindo o entendimento jurisprudencial, consolidado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AREsp-948.181/SP, Ministro Og Fernandes, DJ de 27.10.2016) e do Supremo Tribunal Federal (AgRg no RE-892.938, Ministro Celso de Mello, DJ de 14.8.2015), de que a presunção de inocência, assegurada no inciso LVII do art. 5° da Constituição Federal, não é compatível com a criação de embaraços à realização ou à certificação de cursos de reciclagem de vigilantes em razão da mera pendência de inquérito ou ação criminal. 3. Hipótese em que não há qualquer notícia da prolação de sentença na única ação criminal proposta contra o impetrante; e em que os demais elementos dos autos sinalizam que sua vida pregressa é condizente com a necessária idoneidade moral exigida para fins da pretendia certificação profissional. 4. Apelação e remessa oficial de que se conhece e a que se nega provimento.
Diante do exposto, o Colegiado acompanhando o voto do relator, negou provimento à apelação.
Processo nº: 0004887-26.2010.4.01.3811