Aluna do curso de Medicina com dificuldade locomotora tem direito à transferência de campus

A garantia constitucional à dignidade da pessoa humana, à saúde e à educação se sobrepõe a requisitos legais ou burocráticos. Sob esse fundamento a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu que uma estudante com dificuldade de locomoção seja removida do campus de Pinheiros, onde cursa Medicina, para o mesmo curso no campus de São Luís, ambos da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Após sentença favorável à estudante, a instituição de ensino recorreu ao TRF1 sustentando que agiu dentro dos princípios da legalidade, da moralidade e da impessoalidade. Não há previsão legal para a transferência, argumentou, e seria necessário que a aluna participasse de processo seletivo para concorrer às vagas remanescentes no campus pretendido.

Na análise do processo, o relator, desembargador federal Souza Prudente, verificou que a sentença está em conformidade com a jurisprudência do TRF1 e que a questão exige interpretação além da legislação ordinária. “Há de se considerar que acima da lei ordinária temos a lei fundamental, que é a Constituição da República Federativa do Brasil, a qual não pode ser ignorada neste contexto”, prosseguiu.

A aluna não pediu a transferência para lazer pessoal, mas sim em virtude de acompanhamento médico-ortopédico por ter luxação completa da patela direita (osso do joelho), objetivando o regular desenvolvimento de seus estudos, “afinando-se, assim, o direito postulado com os fundamentos do estado democrático de direito e de justiça social, preservando-se, dessa forma, os direitos fundamentais relativos à vida, à saúde e à dignidade da pessoa humana”, completou o magistrado.

Sendo assim, mesmo sem previsão legal expressa, deve ser permitida a transferência da aluna em razão da enfermidade devidamente comprovada no processo, registrando-se que, como foi deferida a tutela de urgência para antecipar e garantir a transferência, a situação de fato já foi consolidada, sendo desaconselhável sua desconstituição, ou seja, o retorno ao campus de Pinheiros/MA após já ter sido transferida para São Luís, concluiu o relator.

O recurso ficou assim ementado:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO ORDINÁRIO. ENSINO SUPERIOR. REMOÇÃO DE ESTUDANTE PARA CAMPUS DIVERSO DENTRO DA UNIVERSIDADE. TRATAMENTO MÉDICO. DIFICULDADE LOCOMOTORA. POSSIBILIDADE. GARANTIA CONSTITUCIONAL À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, À SAÚDE e EDUCAÇÃO (ARTS. 1º, 3º, 196 E 205 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL).

I – As garantias constitucionais do direito à saúde, à educação e à dignidade da pessoa humana asseguram ao estudante de ensino superior, regularmente matriculado em instituição pública de ensino, o direito à transferência intercampi no âmbito da mesma entidade, notadamente em virtude dos problemas de ordem locomotora que acometem a autora, devidamente comprovado nos autos, como forma de proteção à dignidade da pessoa humana, à saúde e à educação, a sobrepor-se a qualquer requisito legal, administrativo e/ou burocrático, que possa inibir o seu regular exercício.

II – Ademais, que, em casos como o presente, a orientação jurisprudencial já consolidada de nossos tribunais é no sentido de que se deve preservar a situação de fato consolidada com o deferimento da tutela de urgência, em 03/05/2018, garantindo-se à autora a transferência pretendida, que há muito ocorreu, sendo, portanto, desaconselhável a desconstituição da referida situação fática, nesse contexto processual

III – Apelação desprovida. Sentença confirmada. A verba honorária, fixada na sentença recorrida em 10% (dez por cento) do valor atribuído à causa (R$ 600,00), resta majorada para R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), nos termos dos §§ 8º e 11 do art. 85 do CPC vigente.

Processo: 1000968-73.2018.4.01.3700

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