Além de ser exposto ao risco, o empregado não estava qualificado para a função.
A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Embrast Indústria e Comércio de Embalagens Ltda., de Itajaí (SC), ao pagamento de indenização de R$ 30 mil a um ajudante de entregador que tinha de transportar dinheiro para a empresa. Na avaliação do colegiado, ele foi exposto a riscos indevidos e submetido a função para a qual não tinha qualificação.
Insegurança
Na reclamação trabalhista, o empregado disse que, durante todo o contrato de trabalho, costumava transportar entre R$ 5 mil e R$ 10 mil por dia, relativos à cobrança das mercadorias. Segundo ele, a situação lhe trazia insegurança e medo, em razão do risco de vir a ser furtado ou roubado, e, se houvesse diferenças, o prejuízo era suportado por ele e pelo motorista, responsável pela movimentação e pela guarda dos valores.
Embalagens plásticas
Por sua vez, a Embrast disse que a mercadoria transportada (embalagens plásticas e derivados) não era visada por assaltantes e que o transporte de dinheiro se dava somente quando algum cliente fazia o pagamento no ato da entrega, “o que não ocorria todos os dias. Sustentou, ainda, que o empregado não percorria nem permanecia em áreas de risco e nunca havia sofrido um assalto durante o contrato.
Ameaça hipotética
O juízo da Vara do Trabalho de Itajaí e o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC) negaram o pedido de indenização. Quanto ao risco a que o empregado poderia estar submetido, o TRT afirmou que a ameaça era apenas hipotética. “A situação real não enseja direito à indenização, pois o trabalhador não foi vítima de assalto e nem sequer sofreu ameaça concreta a sua vida ou a sua integridade física e moral”.
Função
Diante da decisão, o ajudante recorreu ao TST para reiterar que a exigência da empregadora quanto às atribuições de cobrança e transporte de valores eram alheias à sua função. Ele argumentou, ainda, que o fato de não ter sido vítima de nenhum dano concreto, como um assalto ou uma ação contra sua incolumidade física, não exime a empresa de responsabilidade.
Riscos indevidos
De acordo com a relatora do recurso, ministra Kátia Arruda, a jurisprudência reconhece que a atividade de transporte de valores só pode ser desempenhada por empregado de empresa especializada ou profissional devidamente treinado (artigo 3º da Lei 7.102/1983).
Ao decidir pela condenação, a ministra considerou a gravidade do dano – exposição do trabalhador a risco durante mais de quatro anos, em razão do transporte de cerca de R$ 4 mil diários, em atividades para a qual não fora contratado e sem qualificação. No seu entendimento, ainda que não tenha ocorrido dano efetivo, a conduta da empresa gerou o dever de indenizar.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. RECLAMANTE. LEI Nº 13.467/2017
TRANSCENDÊNCIA
AJUDANTE DE MOTORISTA ENTREGADOR. TRANSPORTE IRREGULAR DE VALORES. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESCISÃO CONTRATUAL POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017
1 – Há transcendência política quando se constata em exame preliminar o desrespeito da instância recorrida à jurisprudência majoritária, predominante ou prevalecente no TST.
2 – Aconselhável o processamento do recurso de revista, a fim de prevenir eventual violação do art. 5º, X, da Constituição Federal.
3 – Agravo de instrumento a que se dá provimento.
RECURSO DE REVISTA. RECLAMANTE. LEI Nº 13.467/2017
AJUDANTE DE MOTORISTA ENTREGADOR. TRANSPORTE IRREGULAR DE VALORES. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESCISÃO CONTRATUAL POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017
1 – No caso concreto, conforme se extrai do trecho do acórdão do TRT transcrito no recurso de revista, o reclamante atuou como ajudante de motorista na entrega de mercadorias, recolhendo diariamente R$ 4.000,00 (quatro mil reais), no mínimo. Todavia, não obstante reconhecer a existência “do risco majorado para a pessoa que transporta valores”, a Corte regional manteve a sentença que indeferiu o pedido de indenização por danos morais, considerando que “o trabalhador não foi vítima de assalto e nem sequer sofreu ameaça concreta a sua vida ou a sua integridade física e moral”.
2 – A jurisprudência desta Corte Superior pacificou-se no sentido de que a atividade de transporte de valores só pode ser desempenhada por empregado de empresa especializada ou profissional devidamente treinado (art. 3º da Lei nº 7.102/83), de modo que a exposição potencial do empregado a riscos indevidos decorrentes de atividades para as quais não foi especificamente contratado gera o dever de indenizar, por parte do empregador, ainda que não tenha ocorrido dano efetivo. Julgados.
3 – Recurso de revista a que se dá provimento.
Por unanimidade, a Turma fixou a condenação em R$ 30 mil.
Processo: RR-0000230-20.2020.5.12.0022