Afastada qualidade de bem de família a imóvel oferecido em execução de hipoteca

Caso se enquadra nas hipóteses previstas em lei.

A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da 3ª Vara Cível da Comarca de Franca, proferida pelo juiz Humberto Rocha, que, ao julgar pedido de falência de empresa, afastou a qualidade de bem de família a imóvel de sócio e deferiu a venda antecipada sem necessidade de desconsideração da personalidade jurídica.
Consta nos autos que o sócio se retirou da empresa sem a recomposição do quadro societário no prazo legal de 180 dias, de modo que o remanescente passou a ser considerado empresário individual, respondendo ilimitadamente pelas obrigações, sem distinção entre seu patrimônio e o da sociedade.
Em seu voto, o relator do agravo de instrumento, desembargador Cesar Ciampolini, rejeitou a tese de que o imóvel seria um bem de família e explicou que o caso se enquadra nas hipóteses em que a impenhorabilidade não é oponível, uma vez que os donos deram o bem como garantia real a uma empresa de sua propriedade, para implantação de infraestrutura em um loteamento na cidade.
“A hipótese dos autos admite, como bem fundamentou o MM. Juízo a quo, exceção à impenhorabilidade. E isto porque, em primeiro lugar, a credora hipotecária, que, na hipótese, é a Municipalidade de Franca, não pode, ela própria, satisfazer-se mediante excussão da garantia, pois está sujeita a concurso material de credores. Em segundo lugar, porque a hipoteca em questão foi constituída em garantia a negócio jurídico cujas vantagens patrimoniais, tendo em vista as peculiaridades do caso (em síntese, abrangente confusão patrimonial), reverter-se-iam em favor do núcleo familiar.”
O recurso ficou assim ementado:
Falência. Decisão que deferiu a alienação de imóvel de sócio da falida, que alegava se tratar de bem de família. Agravo de instrumento. Responsabilidade do sócio agravante pelo passivo falimentar, uma vez que, após retirada de ex-sócio, o quadro societário não foi recomposto no prazo legalmente exigido à época dos fatos. Em razão do regime então existente (vedação de sociedade unipessoal), passou o agravante a ser ilimitadamente responsável pelo passivo social desde a não recomposição, pois a sociedade foi dissolvida de pleno direito. Inteligência do então vigente art. 1.033, IV, do Código Civil, hoje revogado, que previa o prazo de 180 dias para a reconstituição da pluralidade, sob pena de dissolução total da sociedade. Impossibilidade de reconhecer-se que, uma vez transcorrido o prazo, tenha a sociedade falida automaticamente se convertido em Eireli, tipo societário inexistente à época dos fatos. Imóvel em discussão que é objeto de hipoteca constituída pelo sócio agravante em favor da Municipalidade de Franca, em garantia a loteamento cujos benefícios econômicos, ao fim e ao cabo, reverter-se-iam em favor do núcleo familiar integrado pelo sócio agravante. Impenhorabilidade afastada. Exceção do art. 3º, V, da Lei 8.009/1990. Ainda que a excussão judicial tenha sido pleiteada pela massa falida, é ela representante dos interesses da Municipalidade credora falimentar (integrante, assim, da massa falida subjetiva), que, de sua parte, não poderia, ela própria, satisfazer-se com o produto da venda judicial do bem, ainda que o pudesse fazer em execução fiscal. “Ainda que a execução [fiscal] prossiga, (…) o credor fiscal não será satisfeito em detrimento dos demais credores que lhe sejam preferenciais. A satisfação do referido credor deverá ser realizada conforme a ordem de classes dos credores da falência. Na falência, o crédito fiscal será classificado nos termos do art. 83 da Lei n. 11.101/2005.” (MARCELO BARBOSA SACRAMONE). Confirmação da decisão recorrida, na forma do art. 252 do Regimento Interno deste TJSP. Agravo de instrumento a que se nega provimento
Participaram do julgamento, que teve votação unânime, os desembargadores Alexandre Lazzarini e Azuma Nishi.
Agravo de instrumento nº 2096368-37.2023.8.26.0000

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