ADI que discute a questão tramita no Supremo Tribunal Federal, sob relatoria da ministra Cármen Lúcia
A fim de garantir segurança jurídica e respeito aos princípios da publicidade e da confiança dos cidadãos nos atos do Poder Público, o procurador-geral da República, Augusto Aras, entende que a divulgação das demonstrações financeiras das Sociedades Anônimas (S.A.) em jornais de grande circulação deve ser acompanhada do respectivo registro na Junta Comercial. A manifestação enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF) se dá em razão da nova legislação sobre o assunto – o artigo 1º da Lei 13.818/2019 –, que dispensa a publicação, na imprensa oficial, de determinadas informações relativas a tais sociedades e permite a divulgação em veículos de grande circulação, nas versões impressa, de modo reduzido, e online, na íntegra.
O caso está sob análise no Supremo, sob a relatoria da ministra Cármen Lúcia. Trata-se da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.011, apresentada pela Associação Brasileira de Imprensas Oficiais (Abio). A entidade alega que a norma, que produzirá efeitos a partir de 1º de janeiro de 2022, viola os artigos 5º, incisos IX, XIV e XXXVI, e 220, da Constituição Federal, pois descumprem os princípios do direito de acesso à informação, da segurança jurídica e da primazia do interesse público.
Ao se manifestar sobre o mérito da questão, o procurador-geral explica que a Lei das Sociedades Anônimas é regida pelo princípio da publicidade, o qual pressupõe a publicação dos atos societários em dois aspectos complementares. O primeiro deles é o aspecto oficial, pelo qual as publicações devem ser realizadas no Diário Oficial para conferir os atributos de oficialidade à publicação, a chamada presunção do conhecimento do ato e fé pública. O outro é o aspecto da publicidade efetiva, pelo qual as publicações devem ser realizadas em jornal de grande circulação, editado na cidade-sede da companhia, e que visa a efetivamente divulgar os atos societários.
Embora a exigência de publicação desses atos em veículos de mídia de grande circulação, na sua integralidade ou de modo resumido, atenda o aspecto da publicidade efetiva, alerta o PGR, a dispensa de publicação na imprensa oficial prejudica o aspecto da oficialidade, que, tradicionalmente, rege a Lei das Sociedades Anônimas. “A publicação da íntegra dos atos no Diário Oficial, conquanto mais onerosa para as sociedades anônimas, confere às informações divulgadas presunção de conhecimento e fé pública, além de conferir aos dados veiculados perenidade e maior credibilidade e segurança jurídica”, afirma o PGR no parecer.
Nesse sentido, a veiculação da íntegra dos atos na rede mundial de computadores e de apenas o resumo desses em jornal de grande circulação, se, por um lado, contribui para desburocratizar, modernizar e reduzir custos, por outro, torna a informação mais suscetível a manipulações e adulterações, a exemplo das fraudes cometidas por “hackers”.
Interpretação conforme – Para solucionar a controvérsia, e harmonizar o artigo 1º da Lei 13.818/2019 com o postulado da segurança jurídica, Aras recomenda que a divulgação dos atos societários deve ser precedida de procedimento já previsto no ordenamento jurídico destinado justamente a conferir autenticidade aos atos empresariais: o registro na respectiva Junta Comercial.
Ao final do documento enviado ao STF, o procurador-geral opina pela procedência parcial do pedido, tão somente para que seja atribuída interpretação conforme à Constituição ao artigo 289 da Lei 6.404/1976, na redação dada pela Lei 13.818/2019, a fim de determinar que a divulgação dos atos e das demonstrações financeiras das sociedades anônimas em jornais de grande circulação, na forma impressa e digital, seja acompanhada do respectivo registro na junta comercial.
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