Autor não teve acesso às notas do Enem que o permitiria ter tratamento especial
A Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) manteve a condenação do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e da União ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 10 mil, a um portador de dislexia que teve negada a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), e, consequentemente, o direito de participar do Sistema de Seleção Unificada (SISU).
Os magistrados destacaram o fato da instituição pública e da União terem descumprido decisão judicial, o que impossibilitou o autor de se inscrever em uma das instituições de ensino público participantes do SISU.
Conforme o processo, o autor é portador de dislexia – um distúrbio de aprendizagem de caráter genético. Ele apresentou laudo emitido pela Associação Brasileira de Dislexia (ABD) com o objetivo de comprovar a condição especial para realizar a prova do Enem, em 2015. Contudo, o documento foi considerado inválido sob a alegação de descumprir item do edital.
Em primeiro grau, a 6ª Vara Federal Cível de São Paulo/SP havia deferido a liminar e determinado expressamente que o Inep e a União garantissem o direito do autor no SISU. O período para inscrição no processo seletivo do SISU foi entre os dias 11 e 14/1/2016. Todavia, as notas só foram disponibilizadas em 22/1/2016, o que inviabilizou a participação do estudante.
No mérito, a juíza federal considerou que houve arbitrariedade e julgou o Inep e a União responsáveis pelos danos morais suportados pelo autor, com o dever de indenizá-lo. As rés recorreram ao TRF3 e alegaram que o estudante não comprovou a situação para atendimento diferenciado e que não há responsabilidade civil do Estado.
Ao analisar o caso no TRF3, o desembargador federal Nery Junior afirmou que o documento apresentado pelo estudante era legal. “Não parece razoável que a Administração não considere válido o parecer emitido pela Associação Brasileira de Dislexia, sendo esse suficiente para comprovar a condição especial do mesmo, vez que tal documento foi elaborado mediante perícia, exames complementares e testes variados, tratando-se de um laudo bastante completo acerca das aptidões do avaliado”.
O magistrado acrescentou que é direito do candidato ser informado acerca dos requisitos do exame e dos documentos que deve apresentar antes de realizar a inscrição. “Admitir que exigências possam ser veiculadas fora do edital e após a publicação deste fere os princípios da moralidade, razoabilidade e eficiência previstos no artigo 37 da Constituição Federal”, salientou.
Assim, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento aos recursos do Inep e da União e manteve a indenização de R$ 10 mil ao estudante, com incidência de juros e correção monetária.
O recurso ficou assim ementado:
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. ENSINO SUPERIOR. INEP. ENEM. DISLEXIA. EDITAL. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1-O autor apresentou o laudo emitido pela ABD – Associação Brasileira de Dislexia, com o objetivo de comprovar sua condição especial, em atendimento ao edital. Contudo, o documento não foi considerado válido para a comprovação de atendimento especializado, “restando descumprido o item 2.2.5 do edital.”, segundo o INEP e a União Federal.
2-Entretanto, verifico que que a exigência constante do Edital era a de que o candidato possuísse documentos comprobatórios de sua condição, não constando deste item nenhuma menção restritiva ou específica acerca de quais documentos deveriam ser providenciados pelo candidato, tratando-se, portanto, de uma disposição ampla e genérica, que permitiu ao autor retirar da norma sua própria interpretação e conclusão.
3-Ademais, não parece razoável que a Administração não considere válido o parecer emitido pela Associação Brasileira de Dislexia, sendo esse suficiente para comprovar a condição especial do mesmo, vez que tal documento foi elaborado mediante perícia, exames complementares e testes variados, tratando-se de um laudo bastante completo acerca das aptidões do avaliado.
4-se era necessário que o candidato apresentasse ESPECIFICAMENTE laudo médico para realizar a prova, tal disposição deveria constar expressamente do Edital que, como já ressaltado, é a lei que rege o exame. É direito do candidato ser informado acerca das exigências do exame e dos documentos que deve apresentar antes de realizar a inscrição. Admitir que exigências possam ser veiculadas fora do Edital e após a publicação deste fere os princípios da moralidade, razoabilidade e eficiência previstos no art. 37 da Constituição Federal, pois permitiria que candidatos inaptos se inscrevessem para determinados processos seletivos.
5-Apelação do INEP e apelação da União não providas.
Apelação Cível 0001040-69.2016.4.03.6100