TST mantém suspensão de penhora de aposentadoria de casal que recebe salário mínimo

A penhora de 30% dos proventos comprometeria sua subsistência

A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho manteve decisão que suspendera a penhora de 30% das aposentadorias de um casal para o pagamento de valores devidos a uma ex-funcionária do bar de sua propriedade. A decisão levou em conta que os valores das aposentadorias estavam no patamar mínimo, e a manutenção da penhora retiraria as condições mínimas de sobrevivência do casal.

Dívida

A penhora foi determinada pelo juízo da 14ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte (MG), em razão do descumprimento de acordo para execução de dívida trabalhista de cerca de R$ 11 mil  a uma empregada do Bar Narcisio e Fernandes Ltda. Contra a medida, o casal impetrou mandado de segurança, argumentando que passava por situação financeira delicada e que os bloqueios recaíam sobre sua única fonte de renda, comprometendo a sua subsistência.

Impenhorável

Ao conceder a segurança, o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) observou que, de acordo com  Código de Processo Civil (CPC, artigo 833, inciso IV), os proventos de aposentadoria são impenhoráveis, mesmo que em percentual limitado.

Natureza alimentar

A relatora do recurso ordinário da empregada, ministra Morgana Richa, explicou que o parágrafo 2º do artigo 833 do CPC admite a penhora de subsídios e proventos de aposentadoria quando a execução tiver por finalidade o pagamento de prestação alimentícia, qualquer que seja a origem. Como a aposentadoria também é verba de natureza alimentar, a penhora deve se limitar a 50% dos ganhos, a fim de garantir e proteger os direitos do credor sem retirar do devedor as condições mínimas de viver de forma digna.

Garantia fundamental

Entretanto, a seu ver, o caso demanda outra perspectiva, em razão de sua peculiaridade: o casal recebe proventos de aposentadoria de R$ 1.100 mil e R$ 1.291. “O bloqueio no percentual de 30% os obrigaria à subsistência com menos de um salário mínimo, em evidente afronta à proteção da dignidade da pessoa humana”, ressaltou.

A ministra lembrou que o salário mínimo tem proteção constitucional e é garantia fundamental à condição social do trabalhador, a fim de salvaguardar questões básicas e necessárias à sobrevivência digna, como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA DE 30% SOBRE OS PROVENTOS DE APOSENTADORIA . SALÁRIO MÍNIMO. IMPOSSIBILIDADE.

1. Trata-se de mandado de segurança impetrado em face de decisão por meio da qual foi determinada a penhora no percentual de 30% dos proventos de aposentadoria dos executados.

2. Sobre o tema, o inciso IV do art. 833 do CPC define que são impenhoráveis \”os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal\”.

3. Por sua vez, o § 2º do art. 833 do CPC excepciona a referida regra, ao permitir a penhora de salários, subsídios e proventos de aposentadoria quando a execução tiver por finalidade o pagamento de prestação alimentícia, qualquer que seja a origem, bem como nos casos em que as importâncias excedam a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais.

4. A constrição autorizada pelo art. 833, § 2º, do CPC deve, ainda, tratando-se de verba de natureza alimentar, como evidentemente é o crédito trabalhista, limitar-se a 50% (cinquenta por cento) dos ganhos líquidos do executado, nos termos do § 3º do art. 529 do CPC.

5. Das inovações advindas do CPC de 2015 e aqui delineadas, observa-se que o intuito do legislador foi o de garantir e proteger os direitos e interesses do credor sem retirar do devedor as condições de viver de forma digna, enquanto responde pela quitação da dívida.

6. No mais, importa ressaltar que a compreensão contida na OJ 153 da SBDI-2/TST somente é aplicável a atos pretéritos à vigência da Lei nº 13.105/2015 (Resolução nº 220, de 18 de setembro de 2017), não sendo a hipótese dos autos.

7. Diante dessas premissas, é possível deduzir pela inexistência de ilegalidade na decisão por meio da qual, na vigência do CPC de 2015, determina a penhora de até 50% (cinquenta por cento) sobre salários ou proventos da parte executada na reclamação trabalhista.

8. Todavia, a hipótese vertente demanda outra perspectiva, em virtude de sua peculiaridade. Conforme consignado pelo Tribunal Regional, no acórdão recorrido, e evidenciado por meio da prova pré-constituída acostada aos autos, os impetrantes recebem proventos de aposentadoria nos valores de R$1.100,00 e R$1.291,00. Inquestionável que tais importâncias se revelam módicas, de forma que eventual constrição no percentual de 30% infligiria aos executados a subsistência com menos de um salário mínimo, em evidente afronta à proteção da dignidade da pessoa humana, consagrada no art. 1º, III, da Constituição Federal.

9. Não sem razão, o salário mínimo encontra proteção constitucional, revestindo-se de garantia fundamental à condição social do trabalhador. O instituto está intrinsicamente relacionado à salvaguarda de questões básicas e necessárias à sobrevivência digna do trabalhador e de sua família, como \”moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social\”. E não é pouco sabido que os valores atribuídos ao salário mínimo, aqui tratados e vigentes neste País, estão efetivamente dissociados das necessidades essenciais dos brasileiros, passando ao largo dos objetivos visados pelo inciso IV do art. 7º da Carta Magna .

10. Assim, diante do conflito que o caso revela, entre a garantia do crédito trabalhista da exequente e a subsistência digna dos executados, é insofismável que relegá-los a situação de miserabilidade, a fim de que arquem a qualquer custo com a dívida, constitui, nesse caso, ofensa aos princípios e direitos protegidos pela Carta Magna, sobretudo à norma que assegura a dignidade da pessoa humana.

11. Partindo-se dessas balizas, revela-se, portanto, adequada a manutenção da segurança concedida. Precedentes.

Recurso ordinário conhecido e desprovido

A decisão foi unânime.

Processo: ROT-10632-47.2021.5.03.0000

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