Tribunal garante substituição de prisão preventiva por domiciliar a mãe de três filhos acusada de associação para o tráfico

O suposto risco de fuga, pelo fato de uma investigada residir em zona de fronteira, não é suficiente para negar a possibilidade de prisão domiciliar. Assim entendeu a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) ao conceder habeas corpus a uma mãe de três filhos acusada de associação para o tráfico e presa preventivamente após decisão da Justiça Federal em primeira instância.  
O Colegiado acompanhou, por unanimidade, o voto do relator, desembargador federal Wilson Alves de Souza. Ao votar pela concessão do habeas corpus, o magistrado destacou: o Código de Processo Penal, para o fim de implementação de política pública visando à proteção da criança e do adolescente, passou a prever a substituição da prisão preventiva pela domiciliar nos casos em que o agente seja mulher com filho de até doze anos de idade.  
“A prisão preventiva, por ser medida cautelar mais gravosa, somente deve ser decretada quando não houver outra medida menos onerosa adequada para o fim almejado”, salientou o desembargador. “A paciente apresentou documentação que comprova ser genitora de três filhos, sendo dois deles menores de idade”, ressaltou.  
Zona de fronteira – O relator considerou ainda que, no caso, se apurava suposto crime de associação criminosa para o tráfico sem a indicação de ter sido cometido com violência ou grave ameaça à pessoa e igualmente sem a demonstração de crime contra filho ou dependente da paciente – ambos os aspectos favoráveis à substituição da preventiva por domiciliar. 
Quanto à possibilidade de haver justificativa na medida mais severa em razão de a mulher residir em zona de fronteira, o desembargador federal Wilson Alves de Sousa reforçou que esse fato, por si só, não poderia ser considerado motivo suficiente. Isso porque adotar essa motivação como tal levaria ao risco de se entender que “todos os delitos cometidos em região fronteiriça ensejariam na decretação da custódia cautelar”, o que não encontra respaldo legal. 
O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 35 DA LEI Nº 11.343/2006. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. PACIENTE MÃE DE CRIANÇA DE ATÉ 12 (DOZE) ANOS DE IDADE. PRISÃO PREVENTIVA. SUBSTITUIÇÃO POR PRISÃO DOMICILIAR ALIADA A MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS. POSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA.

1.         A impetração da presente ação constitucional tem por finalidade a revogação da prisão preventiva decretada em desfavor da Paciente ou sua substituição por prisão domiciliar e medidas cautelares alternativas.

2.         Da análise da documentação acostada aos autos constata-se que a Paciente foi denunciada criminalmente por suposto envolvimento no crime do art. 35 da Lei nº. 11.343/2006 (associação para o tráfico de drogas).

3.         Vislumbra-se a possibilidade da substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar e medidas cautelares alternativas, uma vez que o Código de Processo Penal sofreu alteração para o fim de implementação de políticas públicas visando à proteção da criança e do adolescente, prevendo a substituição da prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for mulher com filho de até 12 (doze) anos  de idade incompletos (art. 318 do CPP).

4.         A prisão preventiva, por ser medida cautelar mais gravosa, somente deve ser decretada quando não houver outra medida menos onerosa adequada para o fim almejado. Desse modo, identifica-se a ocorrência de constrangimento ilegal em face da Paciente a ensejar a concessão da ordem de habeas corpus, uma vez que o CPP permite a substituição por prisão domiciliar, além do que, se vê dos autos, houve apresentação de documentação que comprova ser ela mãe de três filhos, sendo dois deles menores de idade, com 07 (sete) e 14 (quatorze) anos de idade (ID 254915023). Desse modo, dúvida não resta que é  o caso de substituição da prisão preventiva por domiciliar, uma vez que tem um filho de até 12 (doze) anos de idade, nos termos da legislação já referida.

5.         Ademais, a hipótese se cuida de apuração de suposto crime de associação criminosa para o tráfico, sem que se tenha notícia nos autos de que o modus operandi para perpetração do suposto crime pela Paciente tenha se dado com violência ou grave ameaça à pessoa. Além do mais, não houve demonstração nos autos de cometimento de crime contra o filho ou dependente da Paciente.

6.         Registra-se que a autoridade impetrada referiu-se nas informações apresentadas que: “No caso presente, temos uma pessoa contra a qual pesam acusações de pertencimento a organização criminosa, coordenação de cadeia de tráfico e mesmo negociação de compra e venda de fuzis.” Todavia, do exame apurado da peça acusatória constante dos autos nº. 0000569-16.2012.4.01.3201 se verifica que a imputação contra a Paciente na denúncia foi apenas com relação ao crime do art. 35 da Lei nº. 11.343/2011 (associação para o tráfico de drogas), muito menos consta da decisão que indeferiu o pedido de liberdade provisória a referência de que houve acusação formal contra a Paciente com relação aos demais crimes referidos nas informações. Nesse cenário, não há razão para a manutenção da segregação no cárcere por suposições ou conjecturas com relação aos demais crimes referidos pela autoridade impetrada, sem que conste da decisão a demonstração concreta da necessidade da prisão preventiva.

7.         O fundamento do risco de fuga, em razão da Paciente residir em zona de fronteira, não é motivo suficiente para a manutenção da prisão preventiva, sob pena de adotar-se o entendimento de que todos os delitos cometidos em região fronteiriça ensejariam na decretação da custódia cautelar, o que não encontra respaldo legal.

8.         Por fim, a autoridade impetrada alega não existir equipamento para o monitoramento eletrônico na região, entretanto, a falta de estrutura do poder público não é razão suficiente para a manutenção da Paciente segregada em cárcere.

9.         Ordem de habeas corpus concedida para substituir a prisão preventiva pela prisão domiciliar, aliada as seguintes medidas cautelares cumulativas, com fulcro no art. 319 do CPP: a) comparecimento periódico em Juízo, no prazo e nas condições por este fixadas, para informar e justificar atividades; b) proibição de manter contato com os demais Investigados; e, c) proibição de ausentar-se da localidade da Seção Judiciária, sem prévia autorização judicial.

Processo: 1029974-31.2022.4.01.0000

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