Por unanimidade, a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF5 determinou que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deve concluir, em até 30 dias úteis – sob pena de multa diária de R$ 100 –, a apreciação do requerimento de concessão de benefício assistencial à pessoa com deficiência feito por uma cidadã, em 5 de março de 2021, no Recife/PE. A decisão reitera sentença da 7ª Vara da Justiça Federal em Pernambuco, em mandado de segurança impetrado pela requerente, quando já aguardava há mais de quatro meses por uma definição da autarquia previdenciária.
Ao recorrer da decisão de primeira instância, o INSS declarou que vem passando por uma série de dificuldades administrativas, sobretudo pela diminuição de seu quadro de pessoal – a perícia médica federal está completamente desvinculada dos quadros da autarquia, pertencendo atualmente ao quadro de pessoal do Ministério da Economia. A autarquia questionou a imposição de prazo para análise dos requerimentos administrativos pelo Poder Judiciário, sob a alegação de que ofende o princípio da separação dos Poderes e os princípios da isonomia e da impessoalidade.
A Primeira Turma do TRF5 apontou que a diminuição no quadro de servidores ativos do INSS ou o aumento no número de pedidos de aposentadoria, como decorrência da reforma previdenciária, não pode ser considerada motivo de força maior para justificar a demora na análise do pleito administrativo da autora da ação. Além disso, ressaltou que o artigo 49 da Lei nº 9.784/99 estabelece o prazo de até 30 dias para que a Administração Pública emita decisão nos processos administrativos, cabendo ao Judiciário assegurar a apreciação dos pedidos em tempo razoável.
Em seu voto, o desembargador federal Roberto Wanderley Nogueira, relator do processo, destacou que também não cabe falar em ofensa à isonomia e à impessoalidade, como se a autora da ação estivesse “furando a fila”. Para ele, as pessoas que se acharem prejudicadas pelo atraso na apreciação de sua demanda não são obrigadas a esperar que todos os que protocolaram requerimentos administrativos anteriormente se insurjam contra a demora da autarquia previdenciária.
O recurso ficou assim ementado:
CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO. REMESSA NECESSÁRIA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. MOROSIDADE NA ANÁLISE DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. REJEIÇÃO DA PRELIMINAR SUSCITADA PELOS INSS. NO MÉRITO APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA IMPROVIDAS.
1. Trata-se de remessa necessária e de apelação, com pedido de efeito suspensivo, interposta pelo INSS contra sentença, proferida pelo Juízo da 7ª Vara Federal da Seção Judiciária de Pernambuco, que ratificou a liminar e concedeu a segurança para determinar à autoridade impetrada que proceda à conclusão do processo administrativo de concessão de benefício assistencial à pessoa com deficiência, protocolado sob o nº 246602518, na data de 05/03/2021, no prazo máximo de 30 (trinta) dias úteis, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais).
2. Inconformado com a sentença, o INSS interpôs apelação, aduzindo: 1) Preliminarmente: a) Necessidade de inclusão do Coordenador de Perícia Médica Federal em Pernambuco, como litisconsorte passivo; 2) No mérito: a) Impossibilidade de fixação de prazo por ausência de fundamento legal: violação aos princípios da separação dos Poderes, da reserva do possível, da isonomia e da impessoalidade; b) Inaplicabilidade dos prazos definidos no art. 49, da Lei nº 9.784/99 e no art. 41-A da Lei nº 8.213/91; c) Ausência de inércia do INSS na solução da problemática apontada. Requereu, subsidiariamente, a aplicação do parâmetro temporal de 90 dias adotado pelo STF no Recurso Extraordinário n. 631.240/MG. Por fim, requereu a dilação de prazo para cumprimento da decisão judicial e a revogação da multa fixada.
3. A competência do INSS para analisar os requerimentos de benefícios previdenciários e assistenciais não foi alterada, apesar da mudança do cargo de Perito Médico Federal ao quadro de pessoal do Ministério da Economia (Lei nº 13.846/2019). Incabível a inclusão do Coordenador de Perícia Médica Federal em Pernambuco, como litisconsorte passivo.
4. No caso dos autos, o controle de legalidade dos atos administrativos pelo Poder Judiciário não caracteriza violação ao princípio da separação de Poderes. A alegação de inobservância à reserva do possível exige comprovação, que, no caso dos autos, não foi produzida. Da mesma forma, não cabe falar em ofensa à isonomia e à impessoalidade, porque o administrado que se achar prejudicado não é obrigado a esperar que todos os que protocolaram requerimentos administrativos antes dele se insurjam contra a demora da autarquia previdenciária.
5. A conclusão de processo administrativo em prazo razoável é corolário dos princípios da eficiência, da moralidade e da razoabilidade (Superior Tribunal de Justiça, REsp 1138206/RS, min. Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 09 de agosto de 2010, DJe de 01 de setembro de 2010, julgado sob o rito dos repetitivos. Temas 269e 270). Nessas circunstâncias, o controle jurisdicional não configura violação ao princípio da separação de Poderes, também não cabendo falar em mácula à isonomia e à impessoalidade, não estando o interessado obrigado a aguardar que os requerentes mais antigos tomem a iniciativa de recorrer ao Judiciário, nem havendo óbice a que esses o façam (TRF5. 4ª Turma. Processo nº 0805961-04.2021.4.05.8300 – Apel Cível. Relator: Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho. DJ 23/08/2021).
6. A diminuição no quadro de servidores ativos do INSS, ou o aumento no número de pedidos de aposentadoria, como decorrência da reforma previdenciária, não podem ser enquadrados como motivos de força maior, aptos a justificar a demora na análise do pleito administrativo objeto deste feito.
7. Inexistência de ofensa aos princípios mencionados. Cabe ao Poder Judiciário tutelar o direito do jurisdicionado a fim de que seu pedido seja apreciado em tempo razoável.
8. É vedado ao Poder Judiciário se imiscuir na questão de fundo da postulação direcionada ao INSS, cabendo-lhe, porém, tutelar o direito do jurisdicionado a fim de que seu pedido seja apreciado em tempo razoável. Precedentes deste TRF5: AG/PE nº 0801433-63.2019.4.05.0000. Rel. Des. Fed. Elio Wanderley de Siqueira Filho, Primeira Turma, Julgamento: 10/06/2019; AC/PE nº 0803647-56.2019.4.05.8300. Rel. Des. Fed. Edilson Pereira Nobre Junior, Quarta Turma, Julgamento: 11/06/2019
9. A inércia administrativa, na hipótese vertente, afronta inequivocamente os princípios constitucionais da eficiência, da duração razoável do processo e, diante da natureza alimentar do benefício previdenciário requerido, da dignidade humana (arts. 1º, III, 5º, LXXVIII, e 37, todos da CF/1988).
10. Inaplicabilidade ao caso dos autos do RE 631.240/MG.
11. Incabível a alteração do prazo fixado pelo juiz a quo, de 30 (trinta) dias úteis, haja vista ter sido fixado com observância do princípio da razoabilidade, não podendo ser nem demasiadamente curto, tendo em vista a carga de trabalho a que se encontra submetido os servidores do INSS, nem longo, devido à natureza alimentar do benefício pleiteado.
12. A aplicação de multa diária (astreintes) é medida eficiente para impulsionar o ente público a cumprir a obrigação que lhe for imposta por força de decisão judicial. Esta Corte Regional, acompanhando entendimento firmado no STJ, decidiu ser legítima a sua imposição contra a Fazenda Pública, pelo descumprimento de obrigação de fazer, não-fazer ou de entregar coisa (art. 536 e 537 do CPC). Precedentes: STJ, AgInt no REsp nº 1.409.022/SP, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 11/09/2017; STJ, AgRg no AREsp nº 646126/PE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 05/04/2017; TRF5, AC522334/RN, Rel. Des. Fed. Rogério Fialho Moreira, Terceira Turma, DJE de 17/10/2017; TRF5, APELREEX nº 34751/SE, Rel. Des. Fed. Élio Wanderley de Siqueira Filho, Primeira Turma, DJE de 11/10/2017.
13. Neste ponto, com fulcro no art. 537, §1º, do CPC e em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o arbitramento de multa diária em R$ 100,00 (cem reais) não se mostra excessivo, sendo pertinente sua cominação, devendo aquela incidir a partir da não observância do prazo judicialmente fixado.
14. Precedentes desta Corte Regional: 08032224720194058100 – APELREEX (Relator: Desembargador Federal Fernando Braga), 08014095820194058302 – APELREEX (Relator: Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto) e 08082521620194050000 – AG (Relator: Desembargador Federal Leonardo Carvalho.
15. Remessa necessária e apelação à que se negam provimento
Processo nº 0815130-15.2021.4.05.8300