Segundo magistrados, autora não se aproveitou do prestígio de renome da companhia de telefonia
A Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) manteve o direito de uma empresa que comercializa produtos de limpeza e higiene pessoal utilizar a marca Claro. O registro, obtido no ano 2000, havia sido cancelado pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) após a companhia de telecomunicações ter obtido o reconhecimento de alto renome.
Para os magistrados, ficou comprovado nos autos que a parte autora não tentou utilizar a marca de forma parasitária para aproveitar o renome da empresa de telefonia. Além disso, não foi demonstrado que a utilização do nome Claro no ramo de limpeza pode prejudicar ou ser associado ao segmento de telecomunicação
Conforme o processo, no ano de 2004, a empresa telefônica requereu o registro junto ao INPI para reconhecimento de alto renome. A solicitação foi deferida em 2017. De acordo com a Lei 9.279/1996, o alto renome garante à marca proteção especial em todos os ramos de atividade.
Por sua vez, a empresa do ramo de produtos de limpeza pediu judicialmente a anulação da decisão administrativa do INPI que havia cancelado registro de 2000 e negado registros posteriores.
O pedido foi indeferido pela 1ª Vara Federal de Guarulhos/SP, e a autora recorreu ao TRF3. Ao analisar o caso, a Primeira Turma seguiu entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do próprio TRF3 no sentido de que não cabe ao Poder Judiciário substituir a função administrativa do INPI e reformar atos que estão dentro da legalidade.
No entanto, o colegiado garantiu o direito de uso do nome à companhia, considerando a data em que o registro foi realizado. “Deve ser assegurada a proteção ao registro da marca que foi efetuada de boa-fé anteriormente ao registro do alto renome, o qual tem efeitos ‘ex nunc’ (que não retroagem), conforme pacificado na jurisprudência do C. STJ”, concluiu o relator do processo, desembargador federal Valdeci dos Santos.
O recurso ficou assim ementado:
APELAÇÃO. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. MARCA “CLARO”. EXISTÊNCIA DE ALTO RENOME. REGULARIDADE. EFEITOS “EX NUNC”. PROTEÇÃO AO REGISTRO DE MARCA DA PARTE AUTORA EM DATA ANTERIOR. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. RECURSO PROVIDO EM PARTE.
1. Nos termos do artigo 125 da Lei n. 9.279/1996, a marca de alto renome dispõe de proteção especial, em todos os ramos de atividade. E é inconteste que a marca CLARO remete ao consumidor o serviço de telecomunicações, conforme noticiado nos autos no documento ID 90452724, em que, através de pesquisa com 1200 entrevistados, 98% responderam que conhecem a marca CLARO associada ao serviço de telecomunicações, concluindo a Comissão de Alto Renome do INPI que a marca é de conhecimento do publico em geral e apresenta suficiente grau de qualidade, reputação e prestígio.
2. Ademais, não cabe ao Poder Judiciário substituir o INPI na sua função administrativa típica e reformar o mérito de suas decisões relativas ao reconhecimento de alto renome quando não se constata ilegalidade na medida. Portanto, é de rigor a manutenção da r. sentença, que manteve o registro de alto renome da marca CLARO à segunda ré. Precedentes do C. STJ e do E. TRF da 3ª Região.
3. Em relação aos registros no INPI efetuados pela parte autora, cabe a análise da singularidade do caso concreto. A parte autora, segundo as provas dos autos, efetuou o registro n. 827.259.379 da marca CLARO, em 2000, na classe 03 e, em 2013, os registros n. 906.128.412 e 906.136.377, nas classes 01 e 21. Já a segunda ré, conforme as provas dos autos, efetuou o pedido de alto renome em 2004.
4. Desta forma, observa-se que o registro n. 827.259.379 foi efetuado em data anterior ao pedido de alto renome pleiteado pela segunda ré (pedido de reconhecimento efetuado em 2004 e deferido em 2017), o que comprova a impossibilidade da parte autora ter tentado se beneficiar do alto renome da marca CLARO da segunda ré, eis que não havia como prever, em 2000, que a marca CLARO se tornaria marca bastante reconhecida pelos consumidores no setor de telecomunicações.
5. Conquanto deva ser assegurada a proteção especial às marcas de alto renome, deve, de igual maneira, ser assegurada a proteção ao registro da marca que foi efetuada de boa-fé anteriormente ao registro do alto renome, o qual tem efeitos “ex nunc”, conforme pacificado na jurisprudência do C. STJ. Precedentes.
6. Destarte, considerando-se que a parte autora fez o depósito do registro n. 827.259.379 da marca CLARO anteriormente ao pedido de reconhecimento do alto renome da marca CLARO pela segunda ré e em classe distinta do ramo de telecomunicações, não comprovada que a parte autora tentou utilizar a marca de forma parasitária para aproveitar o renome da marca da segunda ré e não demonstra que a utilização da marca CLARO no ramo de limpeza possa se relacionar, prejudicar ou ser associada com a marca CLARO no ramo das telecomunicações, é de rigor o reconhecimento da validade de seu registro.
7. Em relação aos registros n. 906.128.412 e 906.136.377, por serem datados de 2013, data posterior ao pedido de reconhecimento de alto renome da segunda ré, estão corretos os indeferimentos por parte do INPI, em razão da proteção especial prevista no artigo 125 da Lei n. 9.279/1996.
8. No tocante aos honorários advocatícios, observa-se que há sucumbência recíproca de ambos os polos da ação, razão pela qual, nos termos do artigo 86 do CPC, é de rigor a condenação de cada parte ao pagamento de honorários advocatícios, os quais arbitra-se em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, parágrafos 2º e 3º, do CPC.
9. Apelação parcialmente provida.
Apelação / Remessa Necessária 5002114-45.2018.4.03.6119