TRF3 assegura pensão por morte a indígena que apresentou registro de nascimento emitido pela Funai

Ao negar o benefício, INSS alegou que documentos expedidos pela Fundação não valem para a concessão de pensão por morte

A Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) determinou que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) conceda pensão por morte a um indígena, filho de segurada do Regime Geral de Previdência Social (RGPS).

Segundo os magistrados, documentos anexados aos autos confirmaram o direito ao benefício.

O autor acionou o Judiciário após ter o pedido administrativo negado. A Justiça Estadual de Mundo Novo/MS, em competência delegada, julgou a solicitação procedente. Com isso, a autarquia recorreu ao TRF3.

O INSS sustentou que os documentos expedidos pela Fundação Nacional do Índio (Funai) não valem para a concessão de pensão por morte. Subsidiariamente, solicitou a alteração do termo inicial.

Ao analisar o caso, o desembargador federal Carlos Delgado, relator do processo, ressaltou que a certidão de óbito confirmou o falecimento, em 16/1/2014. “Igualmente incontroversa a qualidade de segurada, eis que ela usufruía do benefício de aposentadoria por idade”, pontuou.

Segundo ele, a condição de dependência ficou demonstrada pelo registro administrativo de nascimento de índio expedido pela Funai. “O documento constitui prova válida da filiação, sendo desnecessária a apresentação do registro civil para tal fim, em virtude do disposto nos artigos 12 e 13 da Lei nº 6.001/73”.

O magistrado ainda citou entendimento do TRF3 no sentido de que as certidões emitidas pela Funai possuem fé pública e presunção de veracidade. “A falsidade documental deve ser comprovada, não se podendo presumi-la. Contudo, o INSS não comprovou fato impeditivo ao acolhimento da pretensão deduzida pelo autor”, frisou.

Por fim, acrescentou que foi juntada cópia do registro civil, de 16/12/2011, em que consta a falecida como mãe do autor.

Assim, a Sétima Turma confirmou o direito à pensão por morte. A decisão atendeu parcialmente o pedido do INSS e alterou o termo inicial para 22/2/2017, data do requerimento administrativo.

O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. INDÍGENA. CONDIÇÃO DE DEPENDENTE. REGISTRO DE NASCIMENTO EMITIDO PELA FUNAI. VALIDADE NÃO INFIRMADA PELO INSS. REQUISITOS PREENCHIDOS. DIB. RELATIVAMENTE INCAPAZ. ESCOAMENTO DO TRINTÍDIO LEGAL APÓS OS 16 ANOS COMPLETOS. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CUSTAS PROCESSUAIS. PROCESSO COM TRAMITAÇÃO EM MATO GROSSO DO SUL. EXIGIBILIDADE MANTIDA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA RETIFICADOS DE OFÍCIO.

1 – A pensão por morte é regida pela legislação vigente à época do óbito do segurado, por força do princípio tempus regit actum, encontrando-se regulamentada nos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/91. Trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado falecido, aposentado ou não.

2 – O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência do evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a manutenção da qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter preenchido em vida os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das aposentadorias previstas no Regime Geral de Previdência Social – RGPS.

3 – O evento morte da Sra. Ramona Romero, ocorrido em 16/01/2014, restou comprovado pela certidão de óbito (ID 142892134 – p. 23).

4 – Igualmente incontroversa a qualidade de segurada da instituidora, eis que ela usufruía do benefício de aposentadoria por idade na época do passamento (NB 107.924.020-6) (ID 142892134 – p. 34).

5 – A celeuma diz respeito à condição de dependente do autor, como filho da falecida.

6 – A fim de comprovar a satisfação do referido requisito, o demandante anexou aos autos registro administrativo de nascimento de índio – original e segunda via -, expedidos pela FUNAI (ID 142892134 – p. 46 e ID 142892134 – p. 47). Em que pesem as alegações da Autarquia Previdenciário, o referido documento constitui prova válida da filiação do autor em relação à instituidora, sendo desnecessária a apresentação do respectivo registro civil para tal fim, em virtude do disposto nos artigos 12 e 13 da Lei n. 6.001/73.

7 – Ademais, o referido documento ostenta presunção de veracidade em relação ao seu conteúdo – uma vez que foi expedido por órgão governamental que possui fé pública -, a qual não foi ilidida pela Autarquia Previdenciária no curso do processo. Precedentes.

8 – Como se não bastasse, o demandante também anexou cópia do registro civil, lavrado em 16/12/2011, no qual consta a falecida como sua genitora (ID 142892134 – p. 26).

9 – Ora, a falsidade documental em relação a registros públicos deve ser comprovada, não se podendo presumi-la. No caso vertente, contudo, o INSS não comprovou fato impeditivo ao acolhimento da pretensão deduzida pelo autor.

10 – Em decorrência, preenchidos os requisitos, o deferimento do benefício de pensão por morte é medida que se impõe.

11 – Acerca do termo inicial, à época do passamento vigia a Lei nº 8.213/91, com redação incluída pela Lei nº 9.528/97, a qual, no art. 74, previa como dies a quo do benefício a data do evento morte somente quando requerida até trinta dias depois deste e a data do requerimento quando requerida após o prazo previsto anteriormente.

12 – Por outro lado, na medida em que o escoamento do prazo previsto no art. 74 da LBPS para requerimento da pensão implica a inviabilidade da pretensão às prestações vencidas a partir do óbito, tem-se evidente sua natureza prescricional. Precedente.

13 – De outro lado, o Código Civil veda a fluência de prazo prescricional contra menores absolutamente incapazes, situação esta expressamente respeitada pela LBPS.

14 – Desta forma, à época do óbito incidia regra impeditiva de fluência de prazo prescricional, razão pela qual, ainda que não requerido no prazo previsto no artigo 74, I, da Lei n.º 8.213/91, o benefício seria devido desde a data do óbito. Contudo, após atingidos os dezesseis anos de idade passaram a fluir os prazos prescricionais, razão pela qual, nascido em 06/09/2000 (ID 142892134 – p. 26), cumpria ao autor observar, a partir de 06/09/2016, o prazo estabelecido no mencionado dispositivo legal, formalizando seu requerimento até o dia 06/10/2016, a fim de obter a pensão desde a data do óbito.

15 – Não requerido o benefício no prazo previsto no artigo 74, I, da Lei n.º 8.213/91, é devida a fixação da data de início naquela em que a autarquia tomou ciência da pretensão. Assim, o termo inicial do benefício deve ser modificado para a data do requerimento administrativo, em 22/02/2017 (ID 142892134 – p. 44). Precedentes.

16 – Desta forma, não há que se falar em retroação da DIB para a data do óbito.

17 – No que tange às custas processuais, em se tratando de processo com tramitação perante a Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul, deve ser observado o disposto na Lei Estadual n.º 3.779, de 11/11/2009, que em seu artigo 24, §1º, dispõe que a isenção do recolhimento da taxa judiciária não se aplica ao INSS.

18 – A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.

19 – Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.

20 – A partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, para fins de atualização monetária e compensação da mora, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.

21 – Apelação do INSS parcialmente provida. Correção monetária e juros de mora retificados de ofício.

Apelação Cível 5006364-53.2020.4.03.9999

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