Empresa não apresentou documentos sobre estimativas.
A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, em ação de rescisão contratual, reconheceu a culpa concorrente de franqueadora por dados irreais de projeções de faturamento. O colegiado determinou a não incidência de multas rescisórias, bem como a restituição da taxa de franquia referente ao período não efetivado do contrato firmado. Foram julgados improcedentes os pedidos do franqueado de condenação da franqueadora à devolução de royalties, do capital investido no negócio e de valores da rescisão de aluguel.
Para o relator do recurso, desembargador Cesar Ciampolini, as partes foram reciprocamente culpadas pelo sucedido. No caso da discrepância entre as projeções e a realidade de faturamento, ele destacou que “várias circunstâncias, diversas delas alheias à franqueadora, podem interferir na lucratividade do negócio”. No entanto, a requerida não apresentou documentos contábeis de outras unidades para comprovar a razoabilidade da rentabilidade indicada. “Muito embora não se possa exigir grande precisão no valor indicado pela franqueadora como de provável faturamento, tratando-se de estimativa, no caso, a discrepância foi muito grande entre o faturamento real, de R$ 16 mil, e aquele que consta do plano de negócio, da ordem de R$ 95 mil.”
Por outro lado, segundo o magistrado, são indevidas a devolução de royalties e a indenização pelo capital investido pelo franqueado, “posto que dos pagamentos, em parte, se beneficiou, obtendo lucros, ainda que não os esperados. Além do que, poderá livremente dispor dos bens comprados para funcionamento da loja”.
O recurso ficou assim ementado:
Ação de rescisão de contrato de franquia, cumulada com cobrança de multa contratual, ajuizada por franqueadora contra franqueado. Reconvenção em busca da anulação do contrato, por quebra do dever de informação por parte da autora. Sentença de procedência da ação e de improcedência da reconvenção. Apelação do réu-reconvinte. Alegações de atraso na entrega da circular de oferta de franquia e de não apresentação de balanços e demonstrações financeiras não comprovadas. Inexistência, de todo modo, de prejuízo que, em razão disso, tenha conduzido ao insucesso do negócio. Culpa da franqueadora, todavia, quanto à informação prestada sobre a rentabilidade da unidade franqueada, muito inferior à prevista no plano de negócios. Apesar de existirem inúmeras variáveis que interferem na lucratividade da franquia, muitas delas fora do controle da franqueadora, não se podendo exigir grande precisão na estimativa de provável faturamento, no caso em julgamento a discrepância foi muito grande entre o faturamento real e aquele que se indicou no plano de negócio. Franqueadora que, após intimada a apresentar documentos contábeis de outras unidades franqueadas para comprovar a razoabilidade da rentabilidade por ela indicada, permaneceu inerte. \”Às partes confere-se oportunidade de participar da formação da decisão do juiz, suportando as consequências desfavoráveis do próprio comportamento inerte e negligente\” (LEONARDO CARNEIRO DA CUNHA). Dever de cooperação, ou de colaboração, de quem, por qualquer modo, participa do processo. A parte não pode criar obstáculos, nem deixar de dar atendimento a providências que lhe sejam determinadas (arts. 378 e 379 do CPC/2015; arts. 339 e 340 do Código Buzaid). Franqueadora que, por agir de forma não colaborativa no curso do processo, deve suportar as consequências decorrentes de seu comportamento. Culpa do franqueado, por outro lado, pelo inadimplemento de obrigações junto a fornecedores, o que comprovadamente causou embaraços à franqueadora, prejudicando suas relações com outros franqueados. Verificada culpa concorrente, resta proceder-se ao reequilíbrio patrimonial da situação entre as partes, buscando colocá-las numa \”situação de reequilíbrio patrimonial\”, como assentou esta Câmara, com esteio no art. 475 do Código Civil, no julgamento da Ap. 0102963-63.2012.8.26.0100, relator o Desembargador FORTES BARBOSA. À luz das peculiaridades do caso concreto, tanto franqueado quanto franqueadora são isentados do pagamento de multa contratual. Indevida a devolução de \”royalties\” e a indenização pelo capital investido pelo franqueado, posto que de tudo de algum modo se beneficiou, obtendo lucros, ainda que não os esperados. Possibilidade, ademais, de dispor livremente dos bens comprados para funcionamento da loja. Indevido ressarcimento de quantias pagas quando da rescisão de contrato de locação de imóvel onde estava localizado o ponto comercial, que, em sua maior parte refere-se a aluguéis e taxas de condomínio vencidas quando loja franqueada funcionava. Caberia, em tese, apenas a devolução do pago a título de fundo de promoção e propaganda relativamente a período posterior ao encerramento do negócio; não havendo prova disso, entretanto, inviabilizada a condenação da franqueadora. Condenação da franqueadora a devolver a taxa de franquia, com redução proporcional ao período remanescente do contrato. Sentença parcialmente reformada, julgando-se parcialmente procedente a ação e parcialmente procedente a reconvenção. Apelação parcialmente provida.
Os desembargadores Alexandre Lazzarini e Azuma Nishi completaram a turma julgadora. A decisão foi unânime.
Apelação nº 1008026-65.2018.8.26.0704