Sociedade de Advocacia não precisa pagar anuidade à OAB

Somente advogados e estagiários têm a obrigação junto ao Conselho de Classe 

O desembargador federal Johonsom di Salvo, da Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), confirmou decisão que suspendeu a exigibilidade de cobrança de anuidade a uma sociedade de advocacia pela Ordem dos Advogados do Brasil/Seção São Paulo (OAB/SP). Os valores pagos, indevidamente, entre 2015 e 2019, devem ser restituídos com os acréscimos legais.

A OAB/SP apelou ao TRF3 alegando a legalidade da cobrança e a impossibilidade de ressarcimento. Sustentou ainda a ocorrência da prescrição trienal, nos termos do Código Civil.

Segundo o magistrado, conforme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do TRF3, apenas advogados e estagiários estão sujeitos à obrigação de recolher anuidade ao respectivo conselho de classe. A jurisprudência veda qualquer interpretação no sentido de estender a obrigação às sociedades de advogados, por ausência de previsão legal.

Johonsom di Salvo ressaltou que diante da não-obrigação do pagamento, os valores desembolsados devem ser ressarcidos. “Uma vez reconhecida a ilegalidade da cobrança de anuidade da sociedade de advogados, é de rigor a manutenção da determinação de restituição do numerário, contida na sentença”, destacou.

Por fim, o desembargador federal afastou a hipótese de prescrição, alegado pela OAB, para não devolução dos valores. O magistrado concluiu afirmando que o prazo prescricional para a restituição de anuidades é quinquenal, conforme o entendimento sedimentado pela Sexta Turma.

O recurso ficou assim decidido:

DECIDO:

A reiteração de decisões num mesmo sentido, proferidas pelas Cortes Superiores, pode ensejar o julgamento monocrático do recurso, já que, a nosso sentir o legislador, no NCPC, disse menos do que desejava, porquanto – no cenário apregoado de criação de meios de agilizar a Jurisdição – não tinha sentido reduzir a capacidade dos Tribunais de Apelação de resolver as demandas de conteúdo repetitivo e os recursos claramente improcedentes ou não, por meio de decisões unipessoais; ainda mais que, tanto agora como antes, essa decisão sujeita-se a recurso que deve necessariamente ser levado perante o órgão fracionário.

No âmbito do STJ rejeita-se a tese acerca da impossibilidade de julgamento monocrático do relator fundado em hipótese jurídica não amparada em súmula, recurso repetitivo, incidente de resolução de demanda repetitiva ou assunção de competência, louvando-se na existência de entendimento dominante sobre o tema. Até hoje, aplica-se, lá, a Súmula 568 de sua Corte Especial (DJe 17/03/2016). Confira-se: AgInt no AgRg no AREsp 607.489/BA, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 20/03/2018, DJe 26/03/2018 – AgInt nos EDcl no AREsp 876.175/RS, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 21/06/2018, DJe 29/06/2018 – AgInt no AgInt no REsp 1420787/RS, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 26/06/2018 – AgRg no AREsp 451.815/SC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 29/06/2018.

Ademais, cumpre lembrar o pleno cabimento de agravo interno contra o decisum, o que afasta qualquer alegação de violação ao princípio da colegialidade e de cerceamento de defesa, a despeito da impossibilidade de realização de sustentação oral, já que a matéria pode, desde que suscitada, ser remetida à  apreciação  da  Turma, onde a parte poderá acompanhar o julgamento colegiado, inclusive valendo-se de prévia distribuição de memoriais (AgRg no AREsp 381.524/CE, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 17/04/2018, DJe 25/04/2018 – AgInt no AREsp 936.062/SP, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/03/2018, DJe 27/03/2018 – AgRg no AREsp 109.790/PI, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 06/09/2016, DJe 16/09/2016). Deveras, “Eventual mácula na deliberação unipessoal fica superada, em razão da apreciação da matéria pelo órgão colegiado na seara do agravo interno“ (AgInt no AREsp 999.384/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/08/2017, DJe 30/08/2017 – REsp 1677737/RJ, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 29/06/2018).

No âmbito do STF tem-se que “A atuação monocrática, com observância das balizas estabelecidas nos arts. 21, § 1°, e 192, caput, do RISTF, não traduz violação ao Princípio da Colegialidade, especialmente na hipótese em que a decisão reproduz compreensão consolidada da Corte” (HC 144187 AgR, Relator(a):  Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 04/06/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-116 DIVULG 12-06-2018 PUBLIC 13-06-2018). Nesse mesmo sentido: ARE 1089444 AgR, Relator(a):  Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 25/05/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-111 DIVULG 05-06-2018 PUBLIC 06-06-2018.

Na verdade, o ponto crucial da questão é sempre o de assegurar à parte acesso ao colegiado. Por tal razão o STF já validou decisão unipessoal do CNJ, desde que aberta a via recursal administrativa. Verbis: “Ainda que se aceite como legítima a decisão monocrática do relator que indefere recurso manifestamente incabível, não se pode aceitar que haja uma perpetuidade de decisões monocráticas que impeça o acesso ao órgão colegiado” (MS 30113 AgR-segundo, Relator(a):  Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 25/05/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-121 DIVULG 18-06-2018 PUBLIC 19-06-2018).

A possibilidade de maior amplitude do julgamento monocrático – o que pode ser controlado por meio do agravo – está consoante os princípios que se espraiam sobre todo o cenário processual, tais como o da eficiência (art. 37, CF; art. 8º do NCPC) e da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CF; art. 4º do NCPC).

Quanto ao recurso manifestamente improcedente (referido outrora no art. 557 do CPC/73), é verdade que o CPC/15 não repete essa locução. Porém, justifica-se que um recurso que, ictu oculi, não reúne a menor condição de alterar o julgado recorrido, possa ser apreciado pelo relator in limine e fulminado. A justificativa encontra-se nos mesmos princípios já enunciados e também na possibilidade de reversão em sede de agravo interno.

Aliás, há muito tempo o e. STJ já decidiu que, mesmo que fosse vedado o julgamento monocrático, à míngua de expressa autorização legal, “tal regra deve ser mitigada em casos nos quais falta à ação qualquer dos pressupostos básicos de existência e desenvolvimento válido do processo”, porquanto, nesses casos, “despiciendo exigir do relator que leve a questão ao exame do órgão colegiado do Tribunal, sendo-lhe facultado, em atendimento aos princípios da economia e da celeridade processuais, extinguir monocraticamente as demandas inteiramente inviáveis” (REsp 753.194/SC, Rel. Ministro José Delgado, 1ª Turma, j. 04/08/2005, DJ 05/12/2005).

Além disso, é o art. 6º do NCPC que aumenta consideravelmente o espaço hermenêutico do magistrado no novo cenário processual.

Essa exegese não é absurda, na medida em que a imperfeição natural e esperável de toda a ordem jurídico-positiva pode ser superada pela “…atuação inteligente e ativa do juiz…”, a quem é lícito “ousar sem o açodamento de quem quer afrontar, inovar sem desprezar os grandes pilares do sistema” (DINAMARCO, Nova era do processo civil, págs. 29-31, Malheiros, 4ª edição).

Destarte, o caso presente permite solução monocrática.

Passo ao exame do recurso.

A r. sentença recorrida deve ser mantida, tendo em vista que está em conformidade com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Federal, no sentido de que apenas advogados e estagiários estão sujeitos à obrigação de recolher anuidade ao respectivo conselho de classe, sendo vedada qualquer interpretação no sentido de estender tal obrigação às sociedades de advogados, por ausência de previsão legal. A Lei nº 8.906/94 diferencia o registro (das sociedades de advogados) da inscrição (de advogados e estagiários), sendo certo que apenas com relação aos últimos há previsão de cobrança de anuidade, o que torna ilegal a exigência da contribuição da impetrante. E uma vez reconhecida a ilegalidade da cobrança de anuidade da sociedade de advogados, é de rigor a manutenção da determinação de restituição do numerário, contida na r. sentença.

Nesse sentido: TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, ApelRemNec – APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA – 5000502-61.2017.4.03.6134, Rel. Desembargador Federal ANDRE NABARRETE NETO, julgado em 21/07/2020, e – DJF3 Judicial 1 DATA: 24/07/2020; TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA,  RemNecCiv – REMESSA NECESSÁRIA CíVEL – 5014284-09.2018.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal DENISE APARECIDA AVELAR, julgado em 03/07/2020, Intimação via sistema DATA: 08/07/2020; TRF 3ª Região, SEXTA TURMA,  ApCiv – APELAÇÃO CÍVEL – 5001553-45.2018.4.03.6111, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 04/04/2020, e – DJF3 Judicial 1 DATA: 14/04/2020.

No Superior Tribunal de Justiça: REsp 651.953/SC, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/10/2008, DJe 03/11/2008; REsp 879.339/SC, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/03/2008, DJe 31/03/2008; REsp 882.830/SC, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/03/2007, DJ 30/03/2007; REsp 831.618/SC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/03/2007, DJ 13/02/2008.

Com relação ao prazo prescricional, constitui entendimento desta Egrégia Corte: “No que tange à prescrição, o entendimento do STJ está consolidado no sentido de que: o título executivo objeto do writ (anuidade exigida pela OAB) seria espécie de instrumento particular, submetendo-se ao prazo prescricional quinquenal previsto no art. 206, § 5º, I, do CC (REsp 1675074/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, julgado em 15/08/2017, DJe 12/09/2017). No caso, foi requerida a cobrança das competências dos últimos cinco anos, de modo que inaplicável o prazo prescricional de três anos na espécie” (TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, ApelRemNec – APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA – 5000502-61.2017.4.03.6134, Rel. Desembargador Federal ANDRE NABARRETE NETO, julgado em 21/07/2020, e – DJF3 Judicial 1 DATA: 24/07/2020); “O prazo prescricional para a restituição de anuidades é quinquenal” (TRF 3ª Região, 6ª Turma,  ApCiv – APELAÇÃO CÍVEL – 5001085-45.2017.4.03.6102, Rel. Desembargador Federal FABIO PRIETO DE SOUZA, julgado em 05/06/2020, e – DJF3 Judicial 1 DATA: 09/06/2020).

A título de honorários sequenciais, incidirão 2% sobre a honorária enunciada na r. sentença.

Face ao exposto, nego provimento à apelação.

Havendo trânsito, à baixa.

Intime-se.

Apelação Cível 5017261-37.2019.4.03.6100

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