A entidade comprovou situação deficitária e insuficiência econômica.
A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho concedeu à Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte (MG) os benefícios da gratuidade de justiça e a dispensou da exigência de depósito prévio para ajuizamento de ação rescisória. Com isso, a ação retornará ao Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), para regular processamento.
Trânsito em julgado
Na ação originária, a Santa Casa foi condenada ao pagamento de diversas parcelas a um vendedor de plano de saúde que pedia o reconhecimento da unicidade contratual. Após o esgotamento das possibilidades de recurso (trânsito em julgado), a instituição ajuizou a ação rescisória, para a qual o artigo 836 da CLT exige que seja efetuado depósito prévio de 20% do valor da causa.
Ao negar o benefício da gratuidade da justiça, o TRT extinguiu a ação pela ausência do recolhimento do valor. Segundo o Tribunal Regional, ainda que tivesse sido concedido, o benefício não abrangeria o depósito prévio, mas apenas as custas processuais, pois ele teria a mesma natureza do depósito recursal, que é a de garantia de juízo/execução.
Miserabilidade
A Santa Casa recorreu ao TST sustentando que o pedido da justiça gratuita não se baseou no fato de ser entidade beneficente de assistência social, mas na sua miserabilidade, comprovada pelo balanço contábil, que a impediria de arcar com o depósito prévio sem prejuízo da manutenção de sua atividade (prestação de serviço médico-hospitalar de caráter filantrópico).
Naturezas distintas
Segundo o relator do recurso ordinário, ministro Evandro Valadão, diferentemente do entendimento do TRT, as características do depósito recursal e do depósito prévio são distintas. O primeiro tem natureza jurídica de pressuposto recursal e visa assegurar o pagamento do crédito trabalhista na fase de execução. O depósito prévio, por sua vez, consiste em multa condicionada à improcedência da ação rescisória, buscando desestimular o ajuizamento de ações de forma temerária, “sem o devido cuidado que essas ações, capazes de desconstituir a coisa julgada material, impõem”.
Para o relator, além de ser possível a concessão do benefício da justiça gratuita às pessoas jurídicas que comprovarem insuficiência de recursos financeiros, a gratuidade abrange também o depósito prévio.
Justiça gratuita
Considerando evidente que, na época da propositura da ação rescisória, a Santa Casa não tinha condições financeiras de recolher o depósito prévio, o relator concedeu os benefícios da justiça gratuita, dispensando-a, inclusive, do depósito prévio, afastou a extinção do processo e determinou o retorno dos autos ao Tribunal Regional para regular processamento da ação rescisória. A decisão foi unânime.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ORDINÁRIO EM AGRAVO INTERNO EM AÇÃO RESCISÓRIA INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA. TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO RESCINDENDA OCORRIDO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. PESSOA JURÍDICA. DEMONSTRAÇÃO DA INSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. ISENÇÃO DO DEPÓSITO PRÉVIO PREVISTO NO ART. 836 DA CLT.
O Tribunal Superior do Trabalho, nos termos da Súmula n° 463, II, de sua jurisprudência, entende que pode haver a concessão dos benefícios da gratuidade de justiça à pessoa jurídica desde que seja comprovada sua fragilidade econômica. Quanto à abrangência da gratuidade da justiça, o art. 98, § 1°, VIII, do CPC de 2015, em consonância com o art. 5°, XXXV e LXXIV, da Constituição da República, estipula que a gratuidade da justiça compreende os depósitos previstos em lei para a propositura de ação.
O artigo 836 da CLT prevê, em suas exceções, que a parte que comprovar sua miserabilidade jurídica estará isenta do recolhimento do depósito prévio. Igualmente, o art. 6° da Instrução Normativa n° 31 do TST estabelece que o depósito prévio não será exigido daqueles que forem insuficientes economicamente.
III. A jurisprudência da SBDI-2 do TST perfilha o entendimento de que, além de ser possível a concessão dos benefícios da justiça gratuita às pessoas jurídicas que comprovarem de forma cabal sua insuficiência de recursos, a gratuidade da justiça abrange o depósito prévio a ser recolhido na propositura da ação rescisória.
No caso vertente, o TRT da 3ª Região extinguiu o processo, sem resolução de mérito, por ausência do pressuposto processual referente ao recolhimento do depósito prévio. O Tribunal de origem também entendeu que, mesmo que fossem concedidos os benefícios da gratuidade de justiça, estes não abrangeriam o depósito prévio, o qual seguiria a regra do depósito recursal diante do reconhecimento, pela Corte Regional, de que ambos teriam a mesma natureza jurídica, qual seja, a de garantia de Juízo e da execução.
Entretanto, enquanto o depósito recursal tem natureza jurídica de pressuposto recursal extrínseco, com finalidade de garantir o juízo, visando assegurar que, em fase de execução, o crédito trabalhista seja adimplido, o depósito prévio consiste em pressuposto processual de existência e validade regular do procedimento especial desconstitutivo, com a finalidade de, à guisa de multa, desestimular o ajuizamento de ações rescisórias de forma temerária.
Ademais, a parte autora demonstrou de forma cabal sua impossibilidade de arcar com as despesas do processo, tendo juntado aos autos documentos aptos a comprovar sua aludida miserabilidade financeira, dentre os quais relatório que atesta a existência de déficit financeiro em suas contas.
VII. Diante da comprovação da situação deficitária da parte autora e de sua insuficiência econômica, evidencia-se que, à época da propositura da presente ação rescisória, a empresa não possuía condições financeiras de recolher o depósito prévio.
VIII. Portanto, o deferimento dos benefícios da justiça gratuita à parte ora recorrente é medida que se impõe, sendo ela dispensada do recolhimento do depósito prévio.
Afasta-se, com isso, a extinção da ação rescisória, sem resolução de mérito, por ausência do pressuposto processual referente ao recolhimento do depósito prévio e determina-se o retorno dos autos à Corte de origem a fim de que a ação rescisória seja processada e julgada como se entender de direito.
Recurso ordinário de que se conhece e a que se dá provimento.
Processo: RO-10540-11.2017.5.03.0000