Reclamação trabalhista é admitida para cumprimento de acordo extrajudicial

Com a decisão da 8ª Turma, indústria de autopeças terá de pagar multa por descumprimento

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho considerou válida a proposição de reclamação trabalhista para pleitear o cumprimento de acordo coletivo de parcelamento de verbas rescisórias firmado entre um operador de máquina e uma indústria de autopeças de Guarulhos (SP). Com isso, o colegiado condenou a empresa ao pagamento da multa de 50% prevista na cláusula penal por descumprimento do acordo.

Verbas rescisórias

O operador trabalhou por dez anos para a Zito Pereira Indústria e Comércio de Peças e Acessórios Ltda. e foi dispensado em janeiro de 2017. A empresa, sob a alegação de estar passando por dificuldades, acertou o pagamento das verbas rescisórias, num total de cerca de R$ 12 mil de forma parcelada, mas não pagou nenhuma das parcelas.

Diante disso o trabalhador ingressou com a reclamação trabalhista, em que pedia o pagamento do valor total, acrescido de multa de 50% por descumprimento do acordo. Segundo ele, o documento foi assinado com a participação do sindicato de classe, e a empresa teria descumprido o mesmo acordo com outros 50 trabalhadores.

O juízo da 7ª Vara do Trabalho de Guarulhos condenou a empresa ao pagamento das verbas rescisórias, mas negou a aplicação da multa. A sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), que entendeu que o acordo não constitui título extrajudicial passível de execução, ou seja, mesmo tendo sido ajustado com a assistência do sindicato, não poderia ser executado diretamente na Justiça do Trabalho.

Título executivo

Ao julgar o pedido, o relator, ministro Agra Belmonte, observou que não havia controvérsia acerca da existência do débito. Segundo ele, não se trata de uma ação executiva, mas de conhecimento, com pedido de execução de acordo extrajudicial por descumprimento de obrigações decorrentes da relação de trabalho e, portanto, inserido na competência da Justiça do Trabalho.

O ministro explicou que o termo assinado entre as partes previa que os valores tinham natureza de título executivo extrajudicial e autorizava o empregado a executá-lo diretamente no todo ou em parte no caso de mora ou inadimplemento por meio de ação para essa finalidade ou de ação monitória. “Conclui-se que se o trabalhador pode o mais, que é executar diretamente o termo, também pode o menos, que é ajuizar ação de cobrança, em fase de conhecimento, a fim de modificar a natureza jurídica do título executivo para judicial, fazendo incidir todas as penalidades acordadas”, assinalou.

Informalidade e simplicidade

Outro ponto realçado pelo relator é que o processo do trabalho é regido por vários princípios, entre eles o da informalidade e o da simplicidade. “Ainda que se considerasse que a reclamação trabalhista não fosse o instrumento adequado para a demanda, mas a ação monitória ou de execução, o magistrado poderia ter determinado emenda à inicial ou mesmo convertido o feito a fim de adequá-lo ao que melhor atende à demanda em litígio”, afirmou. “Não poderia, entretanto, ter deixado de aplicar a multa prevista em cláusula penal em termo extrajudicial sob o fundamento de que o título não encontra guarida na CLT ou mesmo que o tipo de ação não era o adequado”.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017. TERMO DE ACORDO PARA PARCELAMENTO DE VERBAS RESCISÓRIAS FIRMADO COM ASSISTÊNCIA DO SINDICATO PROFISSIONAL. MULTA POR DESCUMPRIMENTO. ARTIGO 876 DA CLT. AÇÃO DE CONHECIMENTO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. A controvérsia comporta transcendência jurídica, nos termos do artigo 896-A, § 1º, IV, da CLT.

2. Trata-se de reclamação trabalhista ajuizada pelo empregado, em que postula o pagamento da avença firmada no termo de “acordo coletivo de trabalho para parcelamento de verbas rescisórias ” com a assistência do sindicato profissional. De início, esclareça-se que em pese ao fato da partes terem denominado o ajuste como “acordo coletivo de trabalho para parcelamento de verbas rescisórias”, constata-se que em verdade se trata de acordo individual firmado entre o trabalhador e a empresa empregadora, com a assistência do sindicato profissional. Portanto, dado ao possível equívoco na denominação do termo pelas partes e a fim de evitar discussões inócuas quanto ao aspecto, doravante será utilizado apenas o termo “acordo”.

3. O Juízo de primeiro grau deferiu o pedido de pagamento das verbas rescisórias e de regularização do FGTS, mas indeferiu o pedido de pagamento da multa por descumprimento prevista no acordo, sob o fundamento de que o reclamante deveria, antes, converter o acordo em título executivo extrajudicial para posterior liquidação.

4. O Tribunal Regional manteve a sentença que afastou a aplicação da multa em comento, entendendo que o acordo extrajudicial assinado pelas partes não é exequível diretamente na Justiça do Trabalho, registrando que o artigo 876 da CLT apresenta rol taxativo e não exemplificativo dos títulos executivos extrajudiciais passíveis de serem processados na justiça Especializada.

5. Assim, conforme se depreende dos autos, houve má aplicação do artigo 876 da CLT na hipótese, tendo em vista que da leitura deste dispositivo não se extrai a conclusão a que chegou a Corte Regional, no sentido de que “o acordo previsto no artigo 876 da CLT é aquele firmado no âmbito das ações judiciais e homologados pela Justiça do Trabalho e não o acordo extrajudicial nos moldes noticiados pelo laborista” , pois não há essa especificidade no artigo mencionado, que apenas preconiza que os acordos, quando não cumpridos, serão executados pela forma estabelecida na CLT.

6. Trata-se, portanto, de ação de cobrança de valores oriundos do descumprimento de obrigações decorrentes da relação de trabalho, inserindo-se na hipótese do artigo 114, I, da Constituição Federal.

7. Por outro lado, vale salientar que não se está diante de uma ação executiva e sim de uma ação de conhecimento (reclamação trabalhista), em que o reclamante postula o cumprimento do acordo firmado com a ré extrajudicialmente. Logo, o art. 876 da CLT que trata da execução de títulos executivos judiciais e extrajudiciais sequer deveria ser aplicado ao caso dos autos, em que houve o reconhecimento da dívida pela empregadora de forma extrajudicial, todavia o reclamante se valeu de uma ação de conhecimento para ver cumprido o quantum acordado.

8. Nestes termos, tendo sido firmado no termo de “acordo coletivo de trabalho para parcelamento de verbas rescisórias” que os valores ali consignados ” possuem natureza de titulo executivo extrajudicial, podendo a critério do EMPREGADO ser executado no todo ou em parte, na ocorrência de mora ou inadimplemento, via Ação de Execução de Título Extrajudicial e/ ou Ação Monitoria” , extrai-se que se o trabalhador pode o mais, que é executar diretamente o termo, também pode o menos, que é ajuizar ação de cobrança em fase de conhecimento, a fim de modificar a natureza jurídica do título executivo para judicial, e assim fazendo incidir, todas as penalidades acordadas no referido termo.

9. Além disso, o Processo do Trabalho é regido por vários princípios, dentre eles, o princípio da informalidade e o da simplicidade, tanto que nas demandas trabalhistas é admitido o jus postulandi, em que a reclamação pode ser interposta pelo próprio empregado, de forma escrita ou verbal, conforme o disposto no artigo 840, § 1º,da CLT. Diante disso, há que se permitir, inclusive, a aplicação do princípio da fungibilidade das ações trabalhistas, quando não constatado erro grosseiro da parte. Desta feita, ainda que se considerasse ser o caso de ação monitória ou mesmo diretamente da ação de execução, poderia o magistrado ter determinado emenda à inicial ou mesmo convertido o feito a fim de adequá-lo ao que melhor atende à demanda em litígio.

10. Não poderia, entretanto, como fizeram as instâncias ordinárias, se furtarem de aplicar uma multa prevista em cláusula penal devidamente firmada pelas partes em termo extrajudicial, sob o fundamento de que o título não encontra guarida na CLT ou mesmo que o tipo de ação não era o adequado. Ao assim decidir, o Tribunal Regional incorreu em má aplicação do artigo 876 da CLT. Recurso de Revista conhecido por má aplicação do artigo 876 da CLT e provido.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-1000047-04.2017.5.02.0317

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