Plano de saúde terá de ressarcir consumidor por cirurgia feita fora da rede credenciada após negativa de cobertura

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, decidiu que uma operadora de plano de saúde terá de ressarcir um cliente das despesas com cirurgia para colocação de marca-passo, realizada fora da rede credenciada depois que a cobertura pelo plano foi indevidamente negada. O colegiado, porém, limitou o ressarcimento aos valores da tabela de preços do plano de saúde contratado.

A decisão reformou parcialmente o acórdão do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) que havia condenado a operadora a indenizar integralmente os custos da operação, bem como os gastos como hospedagem e alimentação. No entanto, foi mantida a indenização de R$ 10 mil por danos morais.

Após o plano negar a realização do procedimento, o consumidor, que mora em Vitória, se submeteu à cirurgia em um hospital renomado de São Paulo. A seguir, pediu em juízo o ressarcimento integral dos valores gastos (danos materiais), inclusive com acompanhante, e indenização por danos morais – o que foi julgado procedente em primeira e segunda instâncias.

Enfermidade causava risco de morte

Inicialmente, o relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, em decisão monocrática, deu provimento ao recurso da operadora para julgar improcedentes os pedidos indenizatórios, sob o fundamento de que o consumidor pretendeu impor unilateralmente o pagamento de hospital de altíssimo custo, localizado em outra capital, em vez de ajuizar ação para obrigar o plano a cobrir o tratamento.

Contra essa decisão, o segurado interpôs agravo interno para a turma, que foi acolhido nos termos do voto do ministro Marco Buzzi. De acordo com o magistrado, depreende-se da sentença e do acórdão recorrido que a negativa de cobertura foi indevida, a colocação de marca-passo era imprescindível e havia urgência, pois o quadro de arritmias causava risco de morte.

Na avaliação do ministro, as alegações do plano de saúde – de que o tratamento não estaria coberto pelo contrato e de que a cirurgia foi realizada fora da rede credenciada e da área de abrangência – não podem ser analisadas, pois não foram debatidas nas instâncias ordinárias e porque seria necessário o revolvimento de provas, o que é vedado pela Súmula 7 do STJ.

Limitação ao preço de tabela afasta enriquecimento indevido

Marco Buzzi lembrou que, conforme o entendimento da corte, o reembolso das despesas médico-hospitalares efetuadas pelo beneficiário de plano de saúde fora da rede credenciada somente é admitido em hipóteses excepcionais, observadas as obrigações contratuais e excluídos os valores que excederem a tabela de preços praticada no respectivo produto (REsp 1.575.764).

No caso dos autos, afirmou, em razão de a operadora ter recusado indevidamente o tratamento, é cabível o reembolso pleiteado, no limite da tabela de preços do plano, excluídas as despesas que fogem à cobertura contratual, como hospedagem, transporte e alimentação.

“A limitação de reembolso ao valor de tabela afasta qualquer possibilidade de enriquecimento indevido do usuário ao se utilizar de profissional ou hospital de referência que, muitas vezes, demandam altas somas pelo trabalho desempenhado”, apontou.

O ministro também observou que o dano moral fixado em R$ 10 mil, em razão da negativa de cobertura do tratamento cirúrgico, “é absolutamente razoável frente ao abalo sofrido pelo autor e encontra-se nos limites da razoabilidade e da proporcionalidade”.

O recurso ficou assim ementado:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL – AÇÃO CONDENATÓRIA – PLANO DE SAÚDE – NEGATIVA INDEVIDA DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO DE COLOCAÇÃO DE MARCA-PASSO – TRATAMENTO DE URGÊNCIA – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PROVIMENTO AO RECLAMO DA OPERADORA PARA JULGAR IMPROCEDENTES OS PEDIDOS NA INICIAL – INSURGÊNCIA DO AUTOR – AGRAVO INTERNO PROVIDO.
1. Depreende-se dos autos que: a) o procedimento cirúrgico de colocação de marcapasso era considerado imprescindível para o tratamento da enfermidade acometida pelo autor; b) a cirurgia era de ser realizada com urgência, pois a manutenção do quadro decorrente das arritmias acarretava risco à vida do paciente; e, c) a negativa de cobertura foi considerada indevida.
2. As alegações da parte ré, nas razões do recurso especial, segundo as quais o tratamento, supostamente sem conformidade técnica, teria sido realizado em rede não credenciada e fora da área de abrangência, bem ainda que o procedimento de colocação do marcapasso não estaria coberto diante de cláusula contratual expressa, refogem aos limites da moldura fática delineada pelas instâncias ordinárias, constituindo indevida inovação recursal.
2.1 Tais teses desbordam do objeto da análise a ser realizada por esta Corte Superior, pois, para tanto, seria necessário se imiscuir no quadro fático ensejador do conflito entre as partes, e, também, averiguar o conteúdo de cláusulas contratuais, mecanismos que a um só tempo ensejam inegável supressão de instância e violam os ditames das Súmulas 5 e 7/STJ.
3. Consoante entendimento sedimentado no STJ, o reembolso das despesas médico-hospitalares efetuadas pelo beneficiário fora da rede credenciada somente pode ser admitido em hipóteses excepcionais, que compreendam a inexistência ou insuficiência de serviço credenciado no local – por falta de oferta ou em razão de recusa indevida de cobertura do tratamento -, bem como urgência ou emergência do procedimento, observadas as obrigações contratuais e excluídos os valores que excederem a tabela de preços praticados no respectivo produto.
3.1 No caso concreto, além de se presumir que a enfermidade estava coberta pelo plano de saúde, pois a matéria sequer fora debatida na origem, o procedimento cirúrgico em questão se revestia de urgência/emergência, tendo a operadora negado o tratamento da enfermidade (recusa indevida), razão pela qual é cabível o reembolso pleiteado, no limite da tabela de preços do plano, excluídas as despesas que refogem à cobertura contratual, tais como referentes a hospedagem, transporte e alimentação.
4. O dano moral inicialmente fixado em R$ 100.000,00 (cem mil reais) foi reduzido pela Corte local para R$ 10.000,00 (dez mil reais), ante a recusa sistemática e indevida do plano de saúde no custeio e liberação do tratamento cirúrgico necessário à manutenção da vida do paciente, portanto, com caráter de urgência/emergência. Tal montante é condizente com o abalo sofrido pelo autor e encontra-se nos limites da razoabilidade e proporcionalidade.
4.1 Para modificar as conclusões consignadas no acórdão impugnado e concluir estar exagerado o quantum indenizatório como quer a operadora do plano de saúde, seria necessária a incursão no conjunto fático-probatório das provas e nos elementos de convicção dos autos, o que é vedado em sede de recurso especial (Súmula nº 7 do STJ).
5. Agravo interno provido para conhecer em parte do recurso especial da operadora do plano de saúde e, nessa extensão, dar-lhe parcial provimento, mantendo a determinação das instâncias ordinárias quanto ao dever de reembolsar as despesas médico-hospitalares realizadas pelo autor, excluídos os valores que excederem os preços de tabela do plano, bem como os custos com hospedagem, transporte e alimentação, conforme contrato estabelecido entre as partes.

Leia o acórdão no REsp 1.933.552.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1933552

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